Por mais que não existam dúvidas do quanto uma sociedade com cultura forma cidadãos mais sensíveis, muitas vezes o valor da arte no cotidiano é intangível. Quem dá aula de dança para comunidades, por exemplo, dificilmente saberá o impacto real que causa na vida de cada aluno, embora tenha certeza do benefício.
É por isso que o espetáculo Somos feitos de sonhos, promovido pelo Instituto Unimed-BH dentro do Festival Somos Comunidade se tornou tão revelador. Por mais que o show de Toquinho tenha sido anunciado como a grande atração da noite, é provável que quem esteve na Praça Duque de Caxias na noite do sábado, 13 de outubro, tenha se surpreendido mais com a atração da abertura.
Não foi simplesmente uma mostra de trabalhos dos alunos dos projetos do Instituto, como se esperava. Ao olhar para o rosto – e os sorrisos – de cada artista que subiu ao palco era possível ver, concretamente, o valor que a arte tem.
Impacto
Como o tema era sonho, ao longo dos 75 minutos de apresentação, o telão exibiu vários depoimentos dos participantes e da comunidade sobre o assunto, além de frases de autores conhecidos. Uma das falas mais emocionantes foi a da mãe da Gabriela. Ela contou que a filha é especial e, mesmo em uma cadeira de rodas, escolheu fazer aulas de percussão.
A mãe ressaltou o quanto a experiência fez bem para o desenvolvimento motor e intelectual da Gabriela. Em seguida, a garota subiu ao palco acompanhada dos colegas com um sorriso que não deixou dúvidas. E o melhor: a expressão da Gabriela não foi a única a nos mostrar isso.
O espetáculo
Somos feitos de sonhos teve direção musical de Gilvan de Oliveira, direção de cena de Inês Amaral e direção geral de Lilian Nunes. Os cantores Adrianna Moreira, Marcelo Veronez, Maurício Tizumba e Pedro Morais interpretaram canções brasileiras acompanhados da banda formada por Cleber Alves (sax), Gustavo Figueiredo (teclado), Gilvan de Oliveira (violão, voz e arranjos), Ivan Correa (baixo) e Serginho Silva (percussão).
O espetáculo começou com as apresentações das turmas de balé de alunos iniciantes. Em seguida, a cada música, a noção amplificada da importância do acesso à cultura. Vimos a satisfação de crianças de cinco anos a idosos, de todas as raças, identidades, gêneros.
Cores
É preciso ressaltar o esmero técnico. Cada número teve figurino próprio assinado por Priscila Gouthier. As cores da montagem seguiram o arco-íris da bandeira da igualdade. Especialmente nas coreografias, foi possível observar também a disciplina dos participantes. A vontade do acerto cativa.
O repertório passou por Lenine, O Rappa, Emicida, Roberto Carlos, entre outros. A alegria era o denominador comum e, assim, pouco a pouco a plateia foi sendo conquistada. No final, a vibração era coletiva. Em resumo: uma energia tão intensa que talvez muita gente nem se lembrava mais que ainda teríamos Toquinho no mundo da criança.
Toquinho
Mesmo para um artista experiente como ele (afinal, são 50 anos de carreira), deve ser difícil assumir uma plateia já muito vibrante. Toquinho foi muito simpático em uma apresentação que pareceu breve demais, não durou nem uma hora. Ao perceber a proporção de adultos e crianças, mesclou o repertório da carreira. Ele, no violão, estava acompanhado de baixo e bateria.
O show começou com A casa, clássico do repertório composto em parceria com Vinícius de Moraes. Toquinho logo emendou com Tarde em Itapoã. Passou por Que maravilha!, parceria com Jorge Ben Jor, canção que teria feito para um amor que não vingou e outras do cancioneiro infantil como O pato. O violão do Toquinho parece extensão do corpo dele.
Bossa Nova
Em diversos momentos, prestou as devidas homenagens à Bossa Nova. Foi aí que apareceu mais uma surpresa na noite: a cantora Camilla Faustino. Revelada no programa do Raul Gil, tem acompanhado Toquinho nas turnês pelo Brasil e exterior.
Ela nasceu em Goiânia, tem 29 anos, vive em São Paulo. Tem sido elogiada pelas performances em clássicos da MPB. A menina arrasa, viu!!
Por aqui, cantou Chega de Saudade e O pato, clássicos do repertório de João Gilberto, A tonga da mironga do kabuletê, de Toquinho e Vinícius, um momento mais político do show. Camilla também dividiu os vocais em uma das canções mais esperadas da noite, Aquarela. Segundo o compositor, este clássico não foi exatamente composto para os pequenos, embora tenha sido adotado por eles. O desejo de Toquinho, com a canção de encerramento, é que cada um cuide para não deixar escapar a criança interior.
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