Quando seu melhor amigo comete suicídio, cabe à narradora a guarda de Apolo, um cão resgatado por ele. Mas Apolo não é qualquer cachorro: é um dogue alemão enorme para um pequeno apartamento alugado em Manhattan, motivo de sobra para uma possível e provável ordem de despejo. Vencedor do National Book Award, O Amigo é o primeiro romance da americana Sigrid Nunez publicado no Brasil pela Editora Instante.
O processo de luto é passado ao lado do cão, que também está imerso em sua própria experiência de dor e falta pela perda do antigo tutor. A confiança de ambos é conquistada ao longo das páginas, quando tentam seguir em frente, apesar da ausência.
“Mas deixe-me dizer o seguinte: quando você está deitado na cama com a mente cheia de pensamentos, como por que seu amigo teve que morrer e quanto tempo vai levar até que você perca o teto sobre sua cabeça, ter um enorme corpo aquecido pressionando a extensão da sua coluna é um conforto maravilhoso” (p. 126).
Como se o amigo estivesse ali, a narradora tece uma longa conversa com ele ao longo do livro, passando pela história dos dois – ela uma ex-aluna que se tornou sua melhor amiga, a ponto de causar a fúria em uma de suas ex-esposas -, o dia-a-dia com o cão – os passeios, a reordenação da casa e o medo do despejo – e, principalmente, o fazer literário – ela escritora e professora, assim como o amigo morto.
Conversa
Na escrita firme de Sigrid Nunez, sem cair em momento algum em um discurso melodramático ou sentimentalista. A narradora, mais do que buscar respostas pelo ato definitivo praticado pelo melhor amigo, constrói neste diálogo com o morto uma maneira de mantê-lo presente.
Uma série de autores perpassam a fala da narradora. Entre eles, por exemplo, Rilke, Virginia Woolf, Milan Kundera, Flannery O’Connor. Por meio deles, ela reflete profundamente sobre a cena literária na qual está inserida. Sendo assim, fala sobre a relação com leitores, as expectativas e a postura de seus alunos de escrita criativa, seus colegas literatos. Há um incômodo com o rumo das coisas: “Se a leitura realmente aumenta a empatia, como nos dizem com frequência, parece que o ato de escrever leva um pouco dela embora” (p. 14).
O Amigo é uma bela e pungente reflexão sobre amizade, luto e o fazer literário.
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Gabriel Pinheiro é jornalista e produtor cultural, sempre gasta metade do seu horário de almoço lendo um livro.