
Cena do espetáculo "Misery", que chega a BH neste final de semana (Leekyung Kim/ Divulgac?a?o)
Ao lado de Marcello Airoldi, “Misery” será apresentada neste sábado e domingo, no palco do Cine Theatro Brasil Vallourec
Patrícia Cassese | Editora Assistente
Publicado originalmente em junho de 1987, o suspense “Misery”, acabou se tornando um outro clássico na trajetória do escritor estadunidense Stephen King, que, vale dizer, ocupa a seleta lista dos dez autores mais traduzidos no mundo. Hoje aos 75 anos, King já teve obras publicadas em mais de 40 países. Juntas, essas traduções responderiam por mais de 400 milhões de cópias vendidas, um número que causa espécie. Assim, previsivelmente, muito de seus títulos acabaram sendo adaptados para o cinema, caso de “O Iluminado”, de Stanley Kubrick. Do mesmo modo, também para o teatro – com exibições na Broadway inclusas.
Para os fãs de teatro de um modo geral e, em particular, para os aficionados pelo autor – e, ainda mais especificamente, pelo livro “Misery” -, a boa notícia é que a capital mineira recebe, neste final de semana, uma adaptação da obra que, em suas passagens por São Paulo e pelo Rio de Janeiro, colheu comentários elogiosos da crítica e, não bastasse, esgotou sessões.
Com direção de Eric Lenate e elenco encabeçado por Mel Lisboa e Marcello Airoldi, com a presença também do ator Alexandre Galindo, “Misery” terá sessões no Cine Theatro Brasil Vallourec neste sábado e domingo, dias 5 e 6 de agosto. A passagem pela capital mineira, vale dizer, acontece pelo festival Teatro em Movimento.
Estreia aclamada
A nova montagem brasileira de “Misery” estreou no início deste ano, em São Paulo, cumprindo temporada de dois meses. Depois, ficou o mesmo período em cartaz no Rio de Janeiro e, de lá, retornou para a capital paulista. Na nova oportunidade, permaneceu por três meses em cena. “E com um teatro de quase 700 lugares sempre lotado, nas três sessões por semana”, conta Mel Lisboa, em entrevista ao Culturadoria.

Mel Lisboa lembra que, até receber o convite de Eric Lenate para integrar o projeto, ainda não havia lido o livro de Stephen King, mas, sim, já havia visto a icônica adaptação para as telas feita pelo diretor Rob Reiner, e que estreou mundialmente em 1992. O longa “Misery – Louca Obsessão”, aliás, foi consagrado nas principais premiações devotadas à sétima arte, como o Oscar e o Globo de Ouro. Em ambos os casos, rendeu à estupenda Kathy Bates a mais que merecida estatueta de Melhor Atriz. “Foi um filme que me marcou, aliás, que marcou a minha geração”, conta a bela Mel.
“Louca Obsessão”
“Louca Obsessão”, na verdade, foi responsável por popularizar ainda mais a história do fictício escritor Paul Sheldon que, após sofrer um grave acidente de carro, acorda na cama de uma residência localizada em uma área isolada. A casa pertence a uma fã inveterada de seus livros – em particular, da personagem que dá nome à obra em foco, Misery Chastain. A mulher em questão é Annie Wilkes, uma ex-enfermeira que, ao ser informada dos rumos que sua personagem preferida terá, na cabeça do autor, trata de mantê-lo encarcerado, a fim de que ele mude de ideia. No filme, Paul Sheldon foi interpretado por James Caan, falecido ano passado, aos 82 anos.
O próprio material de divulgação da peça lembra que “Misery” teve duas outras montagens nacionais para o teatro: a primeira, de 1994, chamava-se “Obsessão”. Foi dirigida por Eric Nielsen e trazia Débora Duarte e Edwin Luisi no elenco. Já em 2005 foi a vez de Marisa Orth e Luís Gustavo subirem ao palco a bordo deste texto, sob direção do espanhol Ricard Reguant.
No entanto, a montagem de Lenate responde, em solo brasileiro, pela primeira adaptação direta do texto de William Goldman. Uma curiosidade: na Broadway, uma montagem de “Misery” teve Bruce Willis na pele de Paul Sheldon.
Desafio
Mel Lisboa conta que entrou para o projeto a convite do diretor. “A gente se conheceu em uma peça que fizemos juntos, no caso, ele também como ator”, relembra. “E, quando decidiu montar ‘Misery’, pensou em mim, me convidou. Na época, eu estava até escalada para a novela (“Cara e Coragem”), mas, por uma coincidência, a Claudia Souto, autora, foi quem fez a tradução da peça. Então, a gente acabou fazendo uma dobradinha”, comenta.
E o que levou Mel Lisboa a aceitar o convite para viver a instável Annie Wilkes? “É uma personagem icônica, difícil, e eu adoro esses desafios. Achei o convite irrecusável”, pontua. Perguntada sobre qual a grande sacada do texto, Mel faz uma reflexão. “Na verdade, costumo sempre ficar refletindo a respeito do sucesso de uma obra. O que faz (uma iniciativa) ter sucesso. Porque a maioria das coisas faz um sucesso mediano, ou nem faz. Tendo a pensar que é uma conjunção de fatores, de coisas que dão certo juntas”, aventa.

“Pelo menos aqui, em São Paulo. Bem, agora (que a produção vai percorrer quatro cidades), a gente vai entender como é o público no Brasil. Mas eu não acho que seja assim, tão diferente, (São Paulo) é um termômetro muito bom”, elabora.
Tensão e distensão
A atriz entende que “Misery” é uma empreitada que conta com uma dramaturgia muito amarrada. “Muito bem escrita. Uma direção corajosa, que trabalha sempre uma tensão, uma distensão. Assim, consegue criar, na plateia, esse sentimento do suspense. Porque, no cinema, você tem recursos de câmera, de um monte de coisas. Teatro, não. É um grande plano aberto. Então, como você faz isso? É por meio do cenário, da trilha, da sonoplastia, de outros elementos”, lista.
E, ainda, de tempos esgarçados. “Que, assim, vão criando uma tensão. É corajoso, porque todo mundo quer aquela coisa: ‘Vamos rápido, vamos rápido’. E quando você esgarça o tempo para criar uma tensão… Então, acho que é uma série de fatores. E acaba que o público adora”, festeja. Mel se refere inclusive ao público que nem conhece Stephen King ou, em particular, “Misery”. “E o público dele… Porque tem muita gente, né? Os fãs, adoram. Acho que é porque mostra uma pluralidade, o quanto um texto pode dar margem a milhões de interpretações e como você pode contar uma mesma história de formas diferentes. Assim, curtem ver aquela obra da qual tanto gostam de uma forma diferente”.
Em busca da coerência
No que tange à construção de sua personagem, Mel Lisboa comenta: “Acho que o maior desafio (que a equipe teve) era conseguir fazer com que, mesmo com todas as oscilações de humor, a personagem tivesse uma coerência. Que fosse a mesma personagem naqueles dois humores completamente distintos. Porque num momento ela está desesperada, gritando, com ódio. No outro, volta (a atriz modula sua voz de modo suave)… Mas é a mesma personagem. Então, manter essa coerência”, advoga.
A este rol, ela acrescenta outro fato. “Também existe uma coisa que a gente (equipe) construiu junto a partir desse encontro, desses profissionais. Essa Annie que foi sendo construída pela gente. E havia o desafio que era como gerar uma certa empatia por ela. Para ela (Annie) não ser aquela vilã tradicional, neste sentido do estereótipo da mulher louca, psicopata. E (tal qual), ele (o escritor) um próprio coitado que está ali, como vítima dessa mulher. Mas de que maneira conseguir uma certa empatia? Então, tem pitadas de humor. A Annie tem uma coisa divertida”, revela.
Assim, nesta versão de “Misery”, Annie chega a ser solar em alguns momentos, como aponta Mel Lisboa. “A gente tenta fazer com que o espectador entenda um pouco a solidão da própria personagem. Por mais que você condene o que ela faça, no fundo, no fundo, tem um motivo ali. Claro, ela poderia não ter feito, né? Mas não é absolutamente de graça, só porque ela é louca. A gente tenta fugir desses estereótipos”.
Outros projetos
Além de “Misery”, Mel Lisboa conta que acabou de gravar a série “Luz”, para a Netflix. “Deve ir ao ar ano que vem. É a primeira série infantojuvenil brasileira da plataforma”. Com produção da Floresta, produtora da Sony Pictures Television no Brasil, e baseada numa ideia original de Guillermo Pendino, a série tem realização de Thiago Teitelroit. Já o argumento é de André Rodrigues.

A iniciativa tem, como protagonista, Marianna Santos. no papel de Luz. Além dela e de Mel Lisboa, o elenco conta ainda com Daniel Rocha, Gabriela Moreyra, Dandara Albuquerque, Claudia Di Moura, Mauricio Destri, Celso Frateschi, Marcos Pasquim e Miá Mello, entre outros. “Agora, vou fazer também um filme”, diz Mel Lisboa.
Audiobooks
Não bastasse, ela acaba de concluir o audiolivro da segunda autobiografia de Rita Lee, falecida em maio último. A atriz já havia feito o audiolivro da primeira autobiografia (“Rita Lee: Uma Autobiografia”, de 2016), tarefa que, vale dizer, obedeceu a um desejo da própria artista, que, à época deste projeto, já estava em tratamento. O audiobook de “Rita Lee: Outra Autobiografia” também foi um pedido particular da cantora à atriz.

Há nove anos, como se sabe, Mel Lisboa subiu aos palcos para encenar o musical “Rita Lee Mora ao Lado”, adaptação do livro “Rita Lee mora ao lado: uma biografia alucinada da rainha do rock”, de Henrique Bartsch. Quando encerrar (ao menos por este ano) a turnê de “Misery”, a atriz vai se enfronhar no projeto de voltar com a produção aos palcos, mas de um modo nada convencional.
Com o aval de Rita Lee
“Foi também um pedido dela (Rita Lee) voltar com a peça. Mas a gente montou ‘Rita Lee Mora ao Lado’ em 2014, ou seja, quando ela não tinha escrito ainda a autobiografia, o que aconteceu em 2016. Aí, ano passado, enquanto eu estava fazendo a gravação do audiolivro, e a gente estava programando de voltar com a peça, vieram essas ideias… De que não fazia sentido voltar com a peça como era, ignorando o fato de que a própria Rita Lee escreveu a sua história. A gente viu que tinha que usar este livro. E, por sorte, ela ainda estava aqui quando tivemos essas ideias, e adorou. Na verdade, adorou tudo, deu ideias. Estava com a gente. Aliás, está com a gente, porque absolutamente tudo o que pediu, e deixou (referindo-se a orientações), a gente, evidentemente, está colocando como fundamental”.

Assim, não será uma montagem totalmente desvinculada do musical de 2014. “Tem cenas de ‘Rita Lee Mora ao Lado’ que vão ficar. É a mesma equipe de criação, de produção. Tem uma coisa interessante. Posso estar sendo pretenciosa, mas acho que é até inédito, que é como se fosse a mesma peça, mas diferente, quase como um spin-off da primeira, mas que não é totalmente desvinculada”.
Neste sentido, Mel Lisboa entende que quem assistiu a “Rita Lee Mora ao Lado”, no curso da nova peça, certamente vai falar: “Ah, essa cena tinha”, “ah, essa também”, “ah, olha, isso não sei o que”. Ou seja, vai reconhecer. “Mas acho que isso é interessante, seja para quem não assistiu à peça, seja para quem a viu. Porque, neste último caso, será uma peça nova, mas com momentos que já estiveram no palco. Eu acho bem interessante essa ideia. Mas é focar mais na narrativa dela, na história que ela mesma contou dela”.
Em BH
Antes de encerrar a entrevista no prazo pedido pela produção, para que Mel Lisboa pudesse buscar a filha, Clarice, a pergunta de praxe: “Quer acrescentar algo que não foi perguntado?”. “Sim. Que eu gosto muito de BH. De Minas, de modo geral. E estou superfeliz de levar ‘Misery’ aí, de mostrar a peça para mais gente. E este teatro – o Cine Theatro Brasil Vallourec – é lindo. Fiz ‘Rita Lee Mora ao Lado’ por duas vezes neste teatro. Fui uma vez, foi um sucesso, e, daí, acabamos voltando”, brinda.
Serviço
Teatro em Movimento apresenta “Misery”, a partir do romance de Stephen King
Quando. 5 e 6 de agosto – sábado, às 20h e domingo, às 18h
Onde. Cine Theatro Brasil Vallourec (Av. Amazonas, 315, Centro)
Ingressos: Plateia 1- R$100 (inteira) e R$50 (meia)/ Plateia 2 – R$50 (inteira) e R$25 (meia). Meia entrada válida conforme a lei.
Venda pelo link: Eventim
Informações: (31) 3270-8100
Classificação: 14 anos
Duração: 120 minutos