
Cena dos ensaios da ópera "Matraga", que será mostrada no Palácio das Artes (Guto Muniz/Divulgação)
Inspirada na obra de Guimarães Rosa, a montagem de “Matraga” terá quatro récitas no Grande Teatro do Palácio das Artes
Patrícia Cassese | Editora Assistente *
Depois de uma apresentação especial, para convidados, na Gruta de Maquiné, em Cordisburgo, a ópera inédita “Matraga”, produção da Fundação Clóvis Salgado, estreia agora para o público geral, ocupando o Grande Teatro Cemig Palácio das Artes. A primeira das quatro récitas acontece nesta quarta-feira, dia 25 de outubro. Em três atos, “Matraga” é inspirada no conto “A Hora e a Vez de Augusto Matraga”, de João Guimarães Rosa. A encenação chega com libreto e música de Rufo Herrera, artista que, neste ano, completou 90 anos.
“Matraga” conta com a participação dos corpos artísticos da Fundação Clóvis Salgado. Assim, entram em cena a Orquestra Sinfônica de Minas Gerais (OSMG), o Coral Lírico de Minas Gerais (CLMG) e a Cia. de Dança Palácio das Artes (CDPA). A montagem abarca, ainda, um elenco de solistas e a narração do ator Gilson de Barros, conhecido pela atuação inspirada no universo rosiano.
Produção
Na Temporada 2023, a ópera será apresentada nos dias 25, 27 e 28, às 20h30, e dia 29 de outubro, às 19h. A direção musical é de Ligia Amadio, com regência da maestra nos dias 25, 27 e 29, e de André Brant, no dia 28. “Matraga” tem concepção e direção cênica de Rita Clemente. A cenografia é de Miriam Menezes. Os figurinos são assinados por Sayonara Lopes. Direção geral de Cláudia Malta. O ator Leonardo Fernandes (atualmente em cartaz nos cinemas, com “Pérola”, de Murilo Benício) interpreta Augusto Matraca. (abaixo, o ator em foto de Guto Muniz)

“Posso me arriscar a dizer tranquilamente que quem sair de casa para assistir a ‘Matraga’ vai viver um momento muito especial. Especial e específico, não tem em outro lugar. Nós temos Guimarães Rosa, nós temos Rufo Herrera e nós temos uma imensa equipe de grandes profissionais, atores da maior qualidade, cantores da maior qualidade, a regência é excepcional”, diz Rita Clemente. Ela acrescenta que a concepção se norteou pelo respeito à inteligência e ao sentido estético do espectador.
O conto
A Hora e a Vez de Augusto Matraga é o último e o mais emblemático conto de livro “Sagarana” (1946), estreia de João Guimarães Rosa na literatura. Para o crítico literário Antonio Candido (1918-2017), é a obra-prima de “Sagarana”. Candido escreveu que, nele, “o autor entra em região quase épica de humanidade”. Assim, cria um dos grandes tipos de nossa literatura, “dentro do conto que será, daqui por diante, contado entre os dez ou 12 mais perfeitos da língua”.
A história
Augusto Matraga é um fazendeiro poderoso e violento, rude como as terras remotas de Minas. Por temperamento, desprezo e ganância, perde tudo. Traído pela mulher, Dionóra, ao tentar recuperá-la e vingar sua honra, é emboscado e espancado por seus inimigos, os capangas do Major Consilva. Atirado de um despenhadeiro, é dado como morto. Salvo pela bondade de um casal humilde, apega-se à religiosidade. Mas é então que conhece o jagunço Joãozinho Bem-Bem, que desperta os mais primitivos instintos dele. Abaixo, na foto, o violeiro Chico Lobo, Gilson de Barros e o tenor Geilson Santos.

Abordagem
A abordagem de Rufo Herrera traz João Guimarães Rosa para dentro da obra, como narrador. Não é uma ópera convencional, é música que tem elementos incidentais. Herrera lembra que vem da música folclórica, popular, tendo ido para a erudita. “Assim, minha opção pelo conto devo-a, em primeiro lugar, à minha vivenciada identificação com o universo da literatura rosiana”. Logo, com a força poética do escritor, que o inspira. Tal qual, com sua filosófica revelação do ser humano em profundidade. “O homem lá, onde João Guimarães Rosa o foi buscar – O Sertão das Gerais – oscila permanentemente entre o bem e o mal. Ora se apruma, ora cai ao nível da fera, ora paira acima de Deus e do diabo”.
Rufo Herrera lembra que teve “Grande Sertão: Veredas” como livro de cabeceira por cerca de 10 anos. “’Sagarana’ vinha logo depois. Sua literatura é realista, mas realista fantástica. Tem coisas e personagens que de fato acontecem no sertão. Quando a Fundação Clóvis Salgado me chamou para criar a ópera, já tinha o texto na ponta da língua. E dois objetivos: promover a literatura de Rosa e trazer a obra para um estilo de composição do século XX. Vivi esses personagens, quando morei na Bahia. Essa intimidade me levou a tratar dos temas que ele aborda. Uma das forças da natureza da ópera é a violência de Matraga”.
Rita Clemente
A diretora Rita Clemente pondera: “Bom, primeiro que há uma simplicidade que é um desafio. A obra de Guimarães Rosa, na sua sofisticada simplicidade, quer contar uma história. Esse é o primeiro desafio e é a partir dele que a criação da ópera ‘Matraga’ se apoia. E é, evidentemente, bastante instigante ter a obra do Rufo Herrera como instrumento para se contar essa história de Guimarães Rosa”. Abaixo, outra foto de Guto Muniz, da encenação.

Para Rita Clemente, o trabalho de Rufo transcende – musicalmente, cenicamente, o libreto, a música. “Assim, propõe, para a gente, uma relação com a ópera, com a linguagem operística muito atual, muito viva. Então, o nosso sertão, a nossa cena sertaneja (a de “Matraga”) tenta alcançar o status da obra de Herrera e, tal qual, trazer a história fantástica de Guimarães Rosa”.
Exposição
Além da produção operística “Matraga”, o Grande Teatro Cemig Palácio das Artes receberá uma exposição, no Foyer, com itens da Região Central de Minas, além de livros de Guimarães Rosa. Trata-se de uma parceria com duas Instâncias de Governança Regional (IGR): o Circuito Turístico das Grutas e o Lago de Três Marias. Assim, da primeira, estarão expostas xícaras feitas pelo coletivo Ceramistas Maria Quem Dera, de Pedro Leopoldo. Da segunda, trabalhos da Associação de Bordadeiras do Município de Andrequicé.
No caso das obras de Guimarães Rosa, estarão reunidas edições raras e comemorativas, como primeiras edições das Coleções Especiais da Biblioteca Pública Estadual de MG, em especial a Mineiriana.
Elenco de “Matraga”
Leonardo Fernandes (Ator): Augusto Matraga
Gilson de Barros (Ator): Narrador
Edineia Oliveira (Mezzosoprano): Mãe Quitéria
Edna d’ Oliveira (Soprano): Dionóra
Geilson Santos (Tenor): Quim (recadeiro de Matraga) e Cantador
Flávio Leite (Tenor): Joãozinho Bem-Bem (Chefe dos Jagunços)
Cristiano Rocha (Baixo): Ovídio (amante de Dionóra)
Guilherme Théo (Ator): Tião da Tereza (Boiadeiro)
Ivan Sodré (Bailarino): Major Consilva
Luciano Luppi (Ator): Padre e Ancião
Chico Lobo: Violeiro
Bailarinas Eliatrice Gischewski e Isadora Brandão: Mimita
Bailarina Isadora Brandão: Sariema
Serviço
“Matraga”, ópera em três atos
Datas e horários: 25 (quarta-feira), 27 (sexta-feira) e 28 de outubro (sábado), às 20h30; 29 de outubro (domingo), às 19h
Local: Grande Teatro Cemig Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1537, Centro)
Ingressos: R$60 (inteira – Plateias I e II) e R$50 (inteira – Plateia Superior)
Classificação Indicativa: 14 anos
*com material enviado pela FCS.