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Cabaré Coragem: a arte do Grupo Galpão como resistência e reflexão

Cabaré Coragem. Foto: Bruna Brandão

Cabaré Coragem. Foto: Bruna Brandão

Cabaré Coragem, a nova peça do Grupo Galpão, junta alegria e pensamentos rebeldes em um espetáculo desafia as desigualdades contemporâneas. Peça fica em cartaz em BH até 18 de junho.

por Carol Braga

Coragem é uma palavra que, de fato, tem muito a ver com o Grupo Galpão. Primeiro porque é preciso muita coragem para manter a constante – e relevante – produção no Brasil por mais de 40 anos. Depois por sempre, de alguma maneira, buscar experimentar e explorar outras possibilidades para a cena, muitas vezes se distanciando de uma suposta zona de conforto. É admirável. 

São reflexões como essa que surgem à medida em que o público se acomoda para ver Cabaré Coragem, a montagem em cartaz até o dia 18 de junho no Galpão Cine Horto. O espetáculo tem direção de Júlio Maciel e é um encontro do Grupo Galpão com ideias e práticas de Bertolt Brecht. Afinal, foi ele que, no período entre guerras, explorou a linguagem do cabaré, um espetáculo cênico musical marcado por, sobretudo, críticas à sociedade capitalista. 

A nova montagem do Grupo Galpão também é assim. Ornados com plumas e purpurinas, os atores divertem, ao mesmo tempo em que convidam a plateia a refletir sobre abusos no trabalho, as desigualdades e outros temas que, assim como na época de Brecht, também são caras ao nosso tempo. 

Confira a invasão do ensaio de Cabaré Coragem

Alegria como resistência

“A gente escolheu o Brecht como um estímulo por causa de um paralelo do momento. Ele viveu entre guerras, no momento político social econômico muito maluco. Então pensamos que seria uma boa hora para trazer um Brecht. Mas não um Brecht para emburacar, mas o cabaré. Trazer esse esse lugar da crítica, da reflexão que o Brecht propõe mas com alegria e um pouco de anarquia também”, conta Lydia Del Picchia. 

Em Cabaré Coragem, Teuda Bara vive uma personagem em homenagem à Mãe Coragem, que é dona do Cabaré e explora os artistas que ali trabalham. Apesar da alegria sempre presente, a dramaturgia assinada por Eduardo Moreira mantém, a todo momento, o tom de protesto. 

Como Lydia Del Picchia salienta, Cabaré Coragem materializa a reflexão de Gilles Deleuze sobre corpos tristes e alegres. “Ele diz que corpos tristes são fáceis de serem dominados. A alegria é resistência. É um tipo de energia muito legal pra gente trazer neste momento”, completa. 

Coragens em cena

Para além da homenagem a Mãe Coragem, peça escrita em 1941, o espetáculo do Galpão leva para a cena o sentido literal de coragem. O elenco do Grupo Galpão nunca mede esforços para entregar o máximo para o público. Isso fica bem nítido em Cabaré Coragem e chega a ser emocionante ver atores tão experientes se expondo do modo como fazem. Como troca, recebem a cumplicidade do público, a empatia. É uma relação muito bonita.

O cenário criado por Márcio Medina, reproduz o Cabaré, mas também oferece uma visão privilegiada ao público. A plateia consegue ver os trabalhadores (os atores, no caso) em pequenos quartos/camarins, o que reforça a ideia da precariedade, do abuso. Na música, Luiz Rocha (que também está no elenco) aposta, por exemplo, em arranjos bem diferenciados para clássicos da música brasileira que carregam na letra o tom de protesto da montagem. E, assim como na linguagem do Cabaré, são textos fortes que acabaram “escondidos” ou “disfarçados” por sonoridades festivas. 

É o caso de Xibom Bombom, hit do trio baiano As Meninas, que fez o maior sucesso no auge do Axé e traz na letra a seguinte frase: “Analisando essa cadeia hereditária / Quero me livrar dessa situação precária/ Onde o rico (cada vez fica mais rico)/ E o pobre (cada vez fica mais pobre)”. 

Responsável pelo texto de Cabaré Coragem, Eduardo Moreira diz que foi uma batalha encontrar um caminho para a dramaturgia. No processo criativo da montagem, cada ator trouxe propostas que foram, de algum modo, incorporadas na peça. “É uma história também que fala muito de nós mesmos. Acho que cada ator foi procurar um tema, uma coisa que queria dizer nesse momento”, ressalta. 

Interação com o público

Embora de alguma maneira os espetáculos do Galpão sempre estabeleçam uma relação próxima com a plateia, em Cabaré Coragem isso se potencializa. Para Simone Ordones e Inês Peixoto essa dinâmica do cabaré é uma das novidades. “Cada espetáculo. É uma emoção diferente”, afirma Inês. “Acho que o desafio desse espetáculo é esse contato corpo a corpo”, acrescenta Simone.

Um dos fundadores do Grupo Galpão, Antônio Edson também não relativiza os percalços do processo. Mas, assim como o papel que a alegria desempenha na linguagem do cabaré, Toninho acredita ter encontrado um caminho interessante. “É entrar em um terreno que você achava que você já era dominado, conhecido e enfrentar tantas dificuldades. Mas acho que, ao final, estamos chegando. Vamos sobreviver”, diz. E que nunca falte coragem ao Grupo Galpão.

Cabaré Coragem. Foto: Bruna Brandão
Cabaré Coragem. Foto: Bruna Brandão
Serviço

Cabaré Coragem – Grupo Glapão

Até 18 Jun 20:00

Galpão Cine Horto, Belo Horizonte, Brasil

A partir de R$30 (meia-entrada).

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