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Cinema

Babygirl (2024) e os jogos de poder que nos rodeiam

No filme, Nicole Kidman encarna CEO em um intenso e controverso romance com o estagiário
Babygirl (2024) FOTO A24 (3)

Babygirl (2024) FOTO A24 (3)

Em Babygirl (2024), Nicole Kidman encarna CEO em um intenso e controverso romance com o estagiário

Por Carol Marques | Repórter

Babygirl (2024) é o terceiro longa-metragem da diretora holandesa Halina Reijn, conhecida por Instinto (2019) e Morte Morte Morte (2022). Estrelado por Nicole Kidman, que levou o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Veneza pelo papel, o thriller erótico acompanha Romy, CEO de uma empresa de tecnologia, mãe de duas adolescentes e esposa de Jacob (Antonio Banderas), um diretor de teatro. 

Já nos trailers a premissa do filme estava clara: Babygirl (2029) é sobre uma mulher poderosa que se liberta, com custos altos, em uma relação de submissão com o estagiário da empresa. Dessa forma, temas como papeis de gênero, fetiches, relacionamentos com diferença de idade, dinâmicas de poder e infidelidade permeiam toda a narrativa. 

Os conflitos da protagonista em Babygirl

Os primeiros minutos do filme já evidenciam o conflito entre a vida íntima da protagonista, repleta de fantasias de submissão não realizadas, e a vida pública. Primordialmente, como uma mulher importante e muito ocupada  que passa por um momento relevante na empresa, Romy parece sustentar um equilíbrio delicado, comum para mulheres em posição de poder. Afinal, é necessário tomar boas decisões, ser estratégica, mas não cruel ou mandona demais. Da mesma forma, em casa, ela se divide entre dar a atenção necessária para as filhas e o marido, que é muito carinhoso e sente falta da presença qualificada da esposa. 

Jacob (Antonio Banderas) e Romy (Nicole Kidman), em cena de Babygiel (2024) | Foto: A24

Num dia, andando na rua, ela é quase atacada por um cachorro. Um jovem desconhecido controla o animal com facilidade. Por fim, Romy é surpreendida quando esse mesmo rapaz começa um programa de estágio na empresa. Samuel (Harris Dickinson, Triângulo da Tristeza (2022)) poderia ser qualquer jovem bonitinho e meio rebelde. Entretanto, o episódio com o cachorro e a postura desafiadora dele faz com que o estagiário permaneça na mente de Romy. 

O interesse é mútuo e, apesar das frágeis tentativas de afastá-lo, Romy é finalmente convencida por Samuel. O jogo de poder entre os dois começou no momento em que ele a salvou do cachorro, mas a dinâmica só fica explícita num encontro furtivo em um quarto de hotel barato. Ali, Romy finalmente se liberta da jaula criada por ela própria. Apesar de se tratar de um caso extraconjugal, a vergonha vivida pela protagonista está muito mais ligada ao prazer que sente com a ideia da dominação. 

A química de Romy (Nicole Kidman) e Samuel (Harris Dickinson) | Foto: A24

Nicole Kidman e as muitas facetas da protagonista Romy

Reprimida por si mesma ao experienciar desejos sexuais considerados tabus, a protagonista tem muitos momentos de dúvida e constrangimento – diz “não” querendo dizer “sim” porque considera-se anormal. Tudo isso está na linguagem corporal, microexpressões e olhar penetrante de Nicole Kidman, uma atriz veterana prolífica que, somente em 2024, está em cinco lançamentos cinematográficos diferentes. 

Foto: A24

Nicole Kidman chegou a dizer que Babygirl (2024) é o filme mais ousado de sua carreira. De fato, houve uma entrega total da atriz à Romy, não só pelas cenas de sexo explícito mas pelas muitas facetas que precisa adotar. No longa de Reijn, Kidman entrega, aos 57 anos, uma performance realmente memorável. Ela se destaca pela contenção, devoção e coragem de levantar e expor as muitas camadas que podem estar por trás de uma mulher bem-sucedida. Não à toa, Kidman é uma das cotadas para a indicação ao prêmio de Melhor Atriz no Oscar 2025.

 

A direção de Halina Reijn em Babygirl

Reijn contrasta, na cinematografia do longa, a plasticidade do ambiente corporativo com o calor e proximidade dos quartos e salas em que Romy e Samuel se encontram e se despem dos contratos sociais. A câmera é muito íntima do rosto da protagonista. Várias vezes o plano é aberto lentamente, oferecendo ao espectador uma perspectiva, primeiro, do espaço mental de Romy. Em seguida, o filme vai situá-la nos ambientes que exigem dela performances exaustivas (mas não por isso rejeitados). Por outro lado, o contrário também acontece, removendo lentamente as camadas do que de fato está acontecendo numa cena. 

A CEO Romy (Nicole Kidman) e a funcionária Esme (Sophie Wilde) | Foto: 2022

É curioso também o papel de uma das funcionárias mais próximas de Romy, a ambiciosa Esme (Sophie Wilde, Fale Comigo (2022)), que admira a CEO e busca uma promoção na empresa. Por meio da personagem, Reijn faz um comentário muito contemporâneo sobre ambição feminina no ambiente corporativo e conflitos geracionais entre millennials e boomers. O tom lembra, vagamente, o sarcasmo de Morte Morte Morte (2022), terror cômico de Reijn que satirizou o egocentrismo da geração Z. 

Babygirl é sobre jogos de poder

Apesar (ou por causa) da carga sexual de Babygirl (2024) o filme é, na verdade, sobre poder. Em uma das cenas mais icônicas do longa, Romy diz a Samuel que não quer machucá-lo. A isso, ele responde: “acho que eu tenho poder sobre você, posso fazer uma ligação e você perderá tudo.”. Contudo, essa constatação torna a dinâmica ainda mais interessante para Romy. 

Foto: A24

O poder e suas implicações estão no figurino, nos diálogos, nos olhares e até mesmo nos momentos em que, de alguma forma, o jogo vira, os limites se tornam cinzentos e o risco aumenta. Afinal, qual seria o maior poder de todos? O de uma CEO sobre o estagiário? Um homem sobre uma mulher? Uma mulher rica sobre um homem pobre? Alguém que não tem nada a perder sobre alguém que já construiu tudo de mais precioso para si? Se existe alguém sendo usado nessa história, quem é?

Sem propor respostas ou soluções para os inúmeros conflitos que permeiam a narrativa e muito menos se colocar como um retrato ético de dinâmicas de dominação e submissão, Babygirl (2024) é a jornada controversa de Romy em direção à auto aceitação e liberdade. 

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