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150 anos de Alberto Santos Dumont, um inventor para a humanidade

Sítio Cabangu, onde nasceu Alberto Santos Dumont. Foto de arquivo. Crédito Simone Moreira.


Em meio à celebração de seu sesquicentenário de nascimento, em 20 de julho, Dumont ainda é pouco conhecido pela relevância que tem, mas seu legado é enaltecido na cidade onde nasceu 

Por Simone Moreira I Jornalista participante do Projeto Culturadoria em rede

Há pouco mais de 200 km da capital mineira, está a cidade onde nasceu Alberto Santos Dumont. A razão de essa história ter começado no interior de Minas Gerais tem relação com o ofício do pai, Henrique Dumont. O engenheiro chegou ao distrito de João Gomes – mais tarde, tida como “a cidade de Palmyra” – para construir, na região, um trecho da Estrada de Ferro Central do Brasil. 

A família foi morar no sítio Cabangu, onde nasceu o inventor do avião, em 20 de julho de 1873, data que coincide com o dia de nascimento do pai dele. A família permaneceu em terras mineiras até a conclusão das obras da estrada de ferro. À época, Alberto tinha apenas sete anos, e seu pai decidiu que iriam à cidade paulista de Ribeirão Preto, para investir em um novo negócio: plantação de café.

Infância

A infância no sítio o fez querer voltar. Depois de suas realizações mundo afora, especialmente em Paris, Santos Dumont voltou à sua terra natal em 1903, para visitar a casa onde nascera. Interessou-se pela casa pequena, de amplas varandas, distante da vida barulhenta. Em 1914, ao voltar novamente ao Brasil, visitou, pela segunda vez, a casa em Cabangu, disposto a comprá-la. As visitas se tornaram frequentes, até que o Governo Federal doou o sítio a ele. 

“Santos Dumont ganhou a casa do Governo Federal, como um presente por seus trabalhos, e ele comprou terrenos em volta, criando, aqui, uma fazenda, onde produzia leite e vendia”, afirma Tomás Castello Branco, ex-presidente da Fundação Casa de Cabangu e filho de Oswado Castello Branco, um dos pioneiros no resgate e na valorização da história local e na conservação da vida e da obra do inventor, na cidade onde nasceu. 

Santos Dumont, por vezes e durante anos, frequentou a casa de Cabangu. Depois, ficou por um tempo envolvido em outras atividades, e mantinha, por meio de cartas, o contato com João Mendes, seu campeiro de confiança e conselheiro nos negócios da fazenda. 

O aviador solicitou uma reforma na casa, que resultou na proposta atual, desde 1932. Ali, ele já implantava suas inovações, ao desenvolver um mecanismo no qual a água que alimentava o lago vinha de longe, passando, na parte superior, por manilhas. Pelo repuxo, o chafariz funcionava, sem a necessidade de bomba para alimentá-lo.

Lago e chafariz, com inovação de Santos Dumont. Foto Simone Moreira

Oswaldo Castello Branco, um visionário

Com a morte de Santos Dumont, em 1932, o prefeito da cidade de Palmyra, Jacques Gabriel Pansardi, solicitou ao então secretário, Oswaldo Castello Branco, que fosse à casa para verificar o estado em que ela se encontrava. “Quando chegou lá, estava tudo revirado. Pessoas já tinham invadido”, afirma Tomás. Foi quando o entusiasta e memorialista Oswaldo entendeu que material tão valioso não poderia ficar exposto daquela maneira, para não se perder. Então, juntamente a Antônio Fagundes Neto e Juvenal Pinto, recolheu preciosidades iconográficas da fazenda Cabangu: além de caixas, cartas de Santos Dumont, muitas das quais, rasgadas, envelhecidas e em qualidade ruim de conservação.

Museu Casa de Cabangu, em Santos Dumont (MG). Foto Simone Moreira.

A ação dos entusiastas foi o início de uma história documentada, capaz de garantir a memória de parte da vida do aeronauta, desconhecida por muitos. Trata-se do Santos Dumont fazendeiro. Oswaldo Castello Branco recolheu os materiais iconográficos espalhados pela casa, reuniu cartas e objetos, para iniciar a construção de um acervo. 

Na ocasião, foi publicado, em jornal, que ele atuava como editor, e a prefeitura da cidade estava com a intenção de criar um museu, na tentativa de resgatar materiais que tivessem relação com a vida de Santos Dumont, para doar ou vender. 

O próprio prefeito atribuiu a responsabilidade de resguardar o acervo a Oswaldo, que, ao ver o crescimento do material, criou, em 1949, a Fundação Casa de Cabangu, uma das mais antigas de Minas Gerais. “Oswaldo convidou 50 pessoas a se tornarem membros da Fundação, e dividiu toda a responsabilidade”, explica Tomás. 

Museu Casa de Cabangu

Em 1973, o Museu Casa de Cabangu foi inaugurado, na casa da fazenda onde Santos Dumont nasceu. “Papai pedia ajuda às pessoas para manter aquela casa em pé. Ele chegou a tirar telhas de nossa moradia para substituir as que tinham sido quebradas por uma árvore lá na Fazenda de Santos Dumont”, lembra. 

Certa vez, Oswaldo escreveu e requisitou apoio a um ministro da aeronáutica, que pediu ao major Oswaldo Terra de Faria que fosse conhecer a casa. “Ao chegar ao local, ele ficou maravilhado. Dali em diante, a Escola Preparatória de Cadetes do Ar começou a apoiar”, completa. 

No local, também há um parque tombado. A unidade de preservação ambiental é expressiva e consta no guia dos bens do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG). São 36 hectares, com lago, cascata, árvores centenárias, área de lazer, quiosque e churrasqueiras. 

Tombamento

O tombamento estadual do parque Cabangu, e do respectivo acervo, foi aprovado em 1978. Entre os bens imóveis, destacam-se a histórica casa, de aspecto colonial, construída no século XIX. A residência natal de Alberto Santos Dumont é tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). 

Situado na Serra da Mantiqueira, a quase 18 quilômetros do centro da cidade, o imóvel tem belezas e riquezas peculiares. “Um dos acervos valiosos do Museu de Cabangu são as cartas originais de Santos Dumont, nas quais pedia apoio aos vizinhos e fazendeiros para o funcionamento da fazenda, além de fotografias originais de todas as experiências dele na França”, diz Mônica Castello Branco, coordenadora aposentada do acervo do museu e filha de Oswaldo Castello Branco.

Museu Casa de Cabangu, em Santos Dumont (MG). Foto Simone Moreira.

Uma cidade à beira do caminho novo

Além de ter sido um visionário em relação ao acervo e à criação do Museu, Oswaldo Castello Branco publicou, em 1988, a obra “Uma cidade à beira do caminho novo”, com referências históricas do município, que se tornou referência para consulta e pesquisa sobre o tema.

Livro publicado, em 1988, por Oswaldo Henrique Castello Branco. Sítio Cabangu, onde nasceu Alberto Santos Dumont. Foto de arquivo. Crédito: Simone Moreira.

O memorialista, escritor e criador da Fundação Casa de Cabangu também esteve envolvido na mudança do nome da cidade, de Palmyra para Santos Dumont, ao referenciar aos políticos que, com a morte do inventor, havia tal sugestão informal, além de um movimento em prol da alteração. 

Oswaldo Castello Branco era o secretário do prefeito à ocasião, e levou até ele a intenção, como forma de homenagear Santos Dumont. Foi, então, orientado a consultar o líder político da região, o deputado José Vieira Marques, que se motivou à mudança. 

Oswaldo prosseguiu com a orientação do deputado, e redigiu o memorial, com a assinatura do prefeito, e o publicou no jornal. O documento foi entregue ao governo de Minas. “O governador queria homenagear Santos Dumont, e não sabia como. Quando chegou o documento, ele prontamente fez a mudança por decreto”, afirma Tomás. 

Oswaldo Henrique Castello Branco. Foto de arquivo. Crédito: Simone Moreira.

Identidade

A herança de visionários – por vezes, desconhecidos – carrega a identidade de uma cidade, consagrada em um ilustre filho brasileiro, com história, genialidade, inventividade e criações muito à frente de seu tempo. 

Santos Dumont transcendeu barreiras, e, apesar de se revelar uma personalidade quase invisível – algo desproporcional a sua significância nas mais diversas áreas –, permanece vivo na cidade mineira que o honra pela grande contribuição à humanidade. 

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Publicado por Carol Braga

Publicado em 20/07/23

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