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Gastronomia

FIT 2024: a experiência multissensorial instigada por Zora Santos

Zora Santos, em foto do espetáculo "O Fim é Uma OUtra Coisa" (Jere Nunes/Divulgação)

Zora Santos, em foto do espetáculo "O Fim é Uma Outra Coisa" (Jere Nunes/Divulgação)

Dentro da grade do Festival Internacional de Teatro Palco & Rua – FIT BH, Zora Santos apresentou “O Fim é Uma Outra Coisa”

Patrícia Cassese | Editora Assistente (*)

Zora Santos é uma mulher que magnetiza o olhar do público de modo fácil, espontâneo. A sua própria (bela) figura atua para tal. Aos 70 anos, Zora é um mulher belíssima, que especificamente para o espetáculo “O Fim É Uma Outra Coisa”, uma das atrações nacionais da grade do Festival Internacional de Teatro Palco & Rua – FIT BH, potencializa seus atributos ao vergar um macacão amarelo ouro, além de uma longo e volumoso trançado que envolve os cabelos grisalhos. A apresentação do domingo, 23 de junho, a que o Culturadoria assistiu, aconteceu na Funarte MG e esgotou ingressos.

Logo de início, o público que estava na área externa é convidado a adentrar o galpão Zora já se encontrava sentada em uma cadeira, na extremidade de uma pequena passarela. Diante de si, uma mala. Trata-se de um espaço pequeno, no qual há pouquíssimos lugar para sentar – ela orienta que as cadeiras devem ser ocupadas por aqueles que de fato têm limitações para ficar em pé. Alguns acabam sentando no chão. Em dado momento, Zora ressalva que, certamente, todos ali anseiam por se sentar.

O início

Neste momento inicial, Zora se dirige a um homem da plateia, pergunta o nome dele e, a partir daí, emula uma história. Como apontado na apresentação, trata-se de uma dramaturgia que envolve acontecimentos biográficos que se entrelaçam a ficcionais. Ah, sim! Dione Carlos assina o texto, em colaboração com a própria Zora. “O Fim é Uma Outra Coisa” tem direção geral de Grace Passô e Gabriel Cândido. Bem, ainda neste estágio, vê-se a história de uma mulher que, acompanhada dos dois filhos, deixa a casa em que morava para fincar raízes em outro lugar.

Neste compasso, o público acompanha o que seria, pela condução da própria Zora, em palavras, o processo de construção da nova moradia. Ao mesmo tempo, há pessoas que se locomovem em meio aos espectadores que estão de pé com objetos que ajudam a emular essa nova etapa, com alusões, por exemplo, ao uso do adobe. A própria atriz convoca elementos da plateia para que a ajudem a carregar alguns itens, como a citada mala. Neste ínterim, há também a descrição do sacrifício fictício de um porco, com vistas ao preparo de uma feijoada. A sonoplastia reproduz o som da dor do animal, que, como se enfatiza, terá todas as suas partes aproveitadas.

Segunda parte

É nesta etapa que a aprodução convida o público a adentrar a parte posterior do galpão que, até então, por conta de uma divisória imperceptível (até mesmo pelo uso cênico de dispositivos como a fumaça), estava camuflado. Ali, sim, há arquibancadas, dispostas em torno de um espaço no qual, em uma das extremidades, há duas grandes panelas no fogo. Desta vez, os atores/músicos que participaram da primeira parte, transitando entre os espectadores, como dito, já estão posicionados diante de instrumentos diversos.

Refeição

Começa aí o ritual de preparo da comida, no qual vemos, por exemplo, Zora picar e adicionar os temperos ao que já está nos panelões, no fogo. Não tarda e o aroma que se espraia já acende o sentido do olfato no público. Prato pronto, Zora se serve, em uma cumbuca, e se senta, junto à plateia, para degustar um pouco do que preparou. Há um momento em suspenso até que o primeiro espectador levante para se servir, no que passa a ser acompanhado por um pá de outros. A refeição, pois, é compartilhada, e não há impedimento que aqueles que queiram repetir, assim o façam.

Findo o banquete, as portas do galpão se abrem, de modo que os olhares se volvem para Zora, iluminada, sentada a uma espécie de trono, elucubre sobre os artefatos – como uma concha de madeira – talhados pelo pai. Aquele que, lá atrás, foi deixado pela mulher junto aos filhos. A personagem se pergunta se aquela concha ainda teria alguma valia. E a resposta não diz respeito apenas ao uso do objeto.

Sentidos

No balanço geral, “O Fim é Uma Outra Coisa” promove uma experiência coletiva mesclada à dramaturgia. Experiência essa que se caracteriza pelo caráter multissensorial, a partir do momento em que cada sentido é notavelmente estimulado por múltiplos recursos. Primeiramente, a visão, claro. A montagem é riquíssima em incitamentos, neste sentido. Influxos que abarcam, por exemplo, a dança.

Do mesmo modo, o já citado olfato, ativado pelo cheiro da comida que se dissemina das panelas. O paladar, como também mencionado, pelo compartilhamento da comida. O tato, não só pelo envolvimento do público na primeira etapa, a manusear (e transportar) com cuidados os objetos que compõem a cena, mas também no próprio ato de servir. No caso da audição, há momentos em que o espectador parece estar imerso em um transe, ao som de tambores e de outros instrumentos que a eles se aliam, por vezes em um crescendo, fazendo todo o corpo retumbar.

Receita

Não é, pois, entretenimento. Ao fim da travessia, no curso da qual várias fomentações são lançadas, é muito provável que o espectador volte para casa assoberbado e até mesmo um pouco desconcertado. Potencialmente, imerso em pensamentos sobre a experiência que vivenciou, dando início ao processo de decupagem esperado. E, neste sentido, como já assinalado, o fato de Zora ser a figura imantadora que é fundamental para que a receita cênica funcione tal a contento quando a culinária.

(*) À exceção da foto principal desta página (Jere Nunes/Divulgação), as demais foram feitas pela equipe do Culturadoria na Funarte MG

Serviço

Festival Internacional de Teatro Palco & Rua – FIT BH
Até 30 de junho
Programação: Clique aqui

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