Marina Viana é uma artista inquieta e sem fronteiras. Ao mesmo tempo em que experimenta novas possibilidades com a Primeira Campainha, seu grupo, nunca deixa de marcar presença e buscar outros limites a si mesma.
O Grupo Mayombe, do qual também é integrante, tem sempre lugar garantido no turbilhão de ideias dela. É uma postura diferente. No grupo liderado por Sara Rojo, Marina Viana se permite ser transportada para outros tempos.
A mulher que andava em círculos é um solo. Sara Rojo dirige Viana em um texto de Éder Rodrigues, outro parceiro antigo. Também são dele, por exemplo, os espetáculos Por esta porta estar fechada outras tiveram que se abrir (2007), A Pequenina América e sua Avó $ifrada de Escrúpulos (2010) e Klássico com K (2013).
Mais uma vez a companhia rodeia a memória política de nosso continente, dedicando um olhar estético e social para a realidade. Foram dois anos de pesquisa e preparação para chegar à cena. Uma trajetória que Marina Viana descreve como processo/performance/encontro/café com biscoito entre ela e Sara.
Que pergunta faria a si mesma sobre a peça e qual resposta daria?
E qual é a boa? Tá se repetindo? Tá fazendo algo novo? Tá se pondo a prova? Como é estrear uma peça nesse ano cabuloso de 2016?
Tô andando em círculos. Caminhando. Resistindo.
O que o circulo representa para você neste momento e nesta historia?
Por ser um espetáculo que faz uma forte referencia às madres da plaza de Mayo, antes de qualquer coisa, o círculo aqui é um ato de resistencia. Aquela máxima do Galeano de pra que serve a utopia… Pra não deixar de caminhar. Pepe Mujica em um discurso que fez aqui no Brasil, na UERJ, fala que “el final del camino es el camino mismo”. Acho que é isso. Neste momento representa também essa repetição esculhambada, de um bando de discurso reacionário vindo a tona e se tornando ordem do dia. Esquecimento. Ignorancia. Mas tem gente que não se rende. Piracema desvairada. rs
A impressão que eu tenho é que seu processo criativo é contínuo. Estou certa ou errada?
Tá certa. Não para, não para, não para não. Tô até bem louca por causa disso. Os processos se misturam e se atravessam. Depois que estreio tambem continua, depois do encontro com o público e tudo mais, muita coisa se transforma, se revira. Trabalho com um monte de gente, cada parceiro interfere no meu trabalho de um jeito, mas parece às vezes que eu tô fazendo uma peça sem fim.
Não sei onde que eu vou parar, pode ser que pareça tudo muito inconcluso, sem “método”, fora do tom e sem melodia, mas tem sido assim. É como tenho construído meu trabalho, na rua, no cabaré, no teatro, debaixo do refletor lavanda, na frente do computador…
Você escreve com frequência. O que te motivou fazer desta vez um texto do Eder e não montar dramaturgia própria?
Era um desejo de Eder e de Sara. Eder escreveu o texto e entregou prontinho pra gente. A ideia de pensar uma mulher que reivindicou memória por tantos anos de sua vida, passa a se esquecer e buscar rastros de memória na sua caminhada mexeu muito comigo. O texto do Eder é lindo, jamais escreveria como ele. A poesia do Eder me acompanha desde que entrei no Mayombe. A poesia do Mayombe é a poesia do Eder. Eu acabei interferindo no texto com coisas minhas, mas o texto do Eder me conduz pra outros lugares, distintos. Se fosse um texto meu, eu estava em cima de um banquinho com um megafone, o texto do Eder me leva pra outros tempos, mais dilatados, me permite silêncio, o texto do Eder me tira de mim.
Resgatar a memória política, estética e social do Brasil são características sempre presentes nas peças. De que modo A mulher que andava em círculos reforça e inova a linguagem tradicional do grupo?
Foi a primeira vez que fomos para a sala de ensaio para criarmos um monólgo. O “Amor”, solo anterior, surge a partir de fragmentos de Klassico (com k), então foi muito mais um trabalho de reconcatenar as ideias, não começamos do zero. Nesse caso começamos do zero. E foi um processo longo até aqui. E um processo muito íntimo entre Sara e eu. Os ensaios sempre começamavam com uma análise política dos acontecimentos, com café e biscoito. Naturalmente foi fazendo parte do processo esse momento. E como tivemos assunto durante todo esse ano pra conversar. Não sei se buscávamos inovação… ou reforçar tradições… Fomos acontecendo juntas, mais o Fabrício e o texto do Eder. Talvez seja o nosso trabalho mais feminino, por ter sido um processo/performance/encontro/café com biscoito entre Sara e eu todas as manhãs de quinta e sexta durante um bom tempo.
A MULHER QUE ANDAVA EM CÍRCULOS
Solo de Marina Viana com Grupo Mayombe.
De 21 a 30 de outubro . Sexta a domingo, às 20h. Ingressos a R$20 (inteira) | R$10 (meia) . Local: Teatro 171 – Rua Capitão Bragança, 35, Santa Tereza, BH. fb.com/mayombe.teatro