Foto da performance "Árvore do empretecimento", de Rodrigo Antero (Pollirouz/Divulgação)
A 12ª temporada da segundaPRETA reforça o viés de partilha de trabalhos e processos artísticos de pessoas negras
Patrícia Cassese | Editora Assistente
Como bem assinalado no material de divulgação da nova edição da segundaPRETA, o projeto entrou em cena em 2017 já com o firme desejo “de ser um lugar de fortalecimento e cuidado para a partilha de trabalhos e processos artísticos de pessoas negras”. Assim, visando a geração de conhecimentos e, tal qual, ser um espaço de fabulação para uma reinvenção em fluxo contínuo. Do mesmo modo, a produção do evento celebra o fato de que, neste 2023, esta sendo possível realizar a 12ª temporada, após o hiato do presencial em função da pandemia (mas com ações online). Logo, a segundaPRETA presencial está de volta ao hipercentro de Belo Horizonte.
Assim, nesta segunda-feira, dia 16 de outubro, haverá apresentação da cena curta “Estilhaça”, de Sâmia Ramare, e as performances “Árvore do empretecimento”, de Rodrigo Antero, e “Vem… pra ser infeliz”, de Priscila Rezende. Já no domingo, 22 de outubro, às 16 horas, acontece a segundaPRETINHA, iniciativa que recebe trabalhos artísticos voltados para as infâncias. Nessa edição deste braço da segundaPRETA será mostrado o espetáculo “A Lenda de Ananse – Um Herói com Rosto Africano”, do grupo Teatro Negro e Atitude.
Programação
Já no dia 23 de outubro, será a vez, no segundaPRETA, das performances “Mavambo”, de Anderson Ferreira, “Yibambe”, de Jonatas Pitucho, da Cia Fusion de Danças Urbanas, e da cena curta Mimo Bambu em “O Catador de Risos”, do grupo Caras Pintadas. Tal qual, no dia 30 de outubro, encerramento da temporada, haverá a prosaPRETA, com a homenageada Nívea Sabino. Do mesmo modo, a festa de encerramento, comandada pelos DJs Alexandre de Sena e Preto C.
A bilheteria da segundaPRETA abre uma hora antes do início das apresentações. Os ingressos têm preços populares (R$ 15 e R$ 10 – moradores localizados fora dos limites da avenida do Contorno pagam valor reduzido).
“Vem… Pra Ser Infeliz”
Ao Culturadoria, Priscila Rezende falou sobre a performance “Vem… Pra Ser Infeliz”, que será apresentada nesta segunda-feira, no segundaPRETA. “Na verdade, fiz duas apresentações em 2017, ano da criação da performance: uma, em fevereiro daquele ano, no Perfura – Ateliê de Performance, no Sesc Palladium. E depois, em agosto, na segundaPreta mesmo. Agora, nesta temporada, temos feito algumas apresentações de trabalhos que já rolaram. Assim, surgiu essa oportunidade, mas realmente vai ser a última vez. É um trabalho que, na verdade, eu já aposentei, pretendia só fazer um registro em vídeo”, conta ela, que ano passado fez uma apresentação no Rio de Janeiro, em fevereiro.
Objetificação do corpo em debate
“Vem… Pra Ser Infeliz”, conta Priscila Rezende, discute a questão da objetificação do corpo feminino negro pelo viés do Carnaval. “Assim, eu faço uma alusão à Globeleza e àquela imagem bastante objetificada que foi reverberada ali, na TV, durante duas décadas. Porém, trago elementos que questionam essa imagem feita desse corpo da mulher negra e da ideia da ‘mulata exportação’, da ‘mulata Sargentelli’. E trago outras palavras que têm relação com esta objetificação”.
Priscila acrescenta que “Vem… Pra Ser Infeliz” é um trabalho no qual, basicamente, ela samba ininterruptamente ao som de alguns enredos de escolas de samba. “Assim, não tem um tempo limite, porque realmente depende muito do dia, da minha energia. A música vai tocando, e vou dançando até quando aguentar, der conta”, diz, sobre o trabalho que será mostrado nesta edição do segundaPRETA.
Homenagem
Assim como nas edições anteriores, a segundaPRETA volta a prestar homenagem a uma mulher negra viva. Nessa temporada, o nome escolhido foi o de Nívea Sabino. Poeta, um dos grandes nomes da poesia falada de Minas Gerais, slammer e educadora social, Nívea Sabino é companheira de caminhada da segundaPRETA. Tal qual, inspiração.
Até então, já foram homenageadas da segundaPRETA, a atriz Ruth de Souza, a multiartista Zora Santos, a poetisa e ensaísta Leda Maria Martins, a escritora mineira Ana Maria Gonçalves. E, ainda, a escritora Conceição Evaristo e a capitã de Massambique Pedrina de Lourdes Santos. Do mesmo modo, a editora e fundadora da Mazza Edições, Maria Mazzarelo Rodrigues, a professora Nilma Lino Gomes, a artista visual Rosana Paulino e as atrizes Valdineia Soriano e Léa Garcia.
A importância do presencial
A atriz, produtora, roteirista e dramaturga Andréa Rodrigues conta que a volta do segundaPRETA para o presencial era algo muito importante para todos os envolvidos na iniciativa. “A gente se relutou muito no período da pandemia (em fazer online), porque não funcionava para a gente. Enquanto projeto, não tinha sentido. Mas, por questões burocráticas, por ter sido o primeiro ano, o único ano, que a gente teve alguma verba, uma lei de incentivo, a gente precisava encerrar esse projeto… Então, a contragosto seguiu este caminho. Porém, sempre falando, assim que possível, a gente retoma (a iniciativa) no presencial”.
Isso porque, lembra ela, a segundaPRETA também é o território onde ocorre. “Assim, onde nós formos, a segundaPRETA vai ser. Mas é importante para a gente que ela aconteça no Espanca. Logo, naquele espaço, embaixo do viaduto. Naquela região, com aquelas pessoas. Então, retomar pra gente é muito importante. Se estivéssemos ainda naquele processo, de reclusão, continuaremos sem fazer a temporada, porque não há sentido sem ser pessoalmente, sabe? A segundaPRETA surge do encontro presencial”, pontua Andréa.
Bagagem e potência
Andréa situa, ainda, que, nesta edição, não foi feito um chamamento justamente pelo sentido de retomada de que algo que foi bruscamente interrompido. “Assim, a gente retoma lá para a primeira vez, que foi quando a gente falou: ‘Olha, e aí?’ Todos nós somos artistas também, que projetam e gerem a segundaPRETA. Então a gente pensou o que queria ver, fazer, quem a gente, nesse momento , queria por perto”. E foi daí, aliás, que surgiu o nome de Nívia Sabino como homenageada, tal como o rol de trabalhos que a produção considerou interessantes rever.
Assim, prossegue Andréa, a 12ª edição do segundaPRETA trouxe, na abertura, no último dia 9, “MarcaPasso”. “Que hoje é um espetáculo, mas que começou como uma cena curta na SegundaPRETA. E, assim, de repente a gente vê o amadurecimento desse trabalho. E, nesta segunda, temos, por exemplo, a Pri (Priscila Rezende), que faz parte da SegundaPRETA e entra nesse lugar de ‘olha a grandeza dos artistas que a gente tem, sabe?'”. Andréa salienta que Priscila é, hoje, considerada uma das maiores performers do Brasil. “No entanto, o Brasil pouco a valoriza, ainda. Logo, é mais fora do Brasil que ela vai ter esse reconhecimento. A mulher preta com a bagagem que ela tem, a pesquisa que ela tem… O olhar artístico que ela tem! E a gente não vê essa referência, aqui. Lá fora, ela é super bem vista, bem quista”.
Respiro e reafirmação
Andréa Rodrigues finaliza ressaltando a importância de retorno ao início. “Assim, esta temporada, ela vem com o que a gente chamou, na entre temporada, de um reencontro. É o nosso desejo, é a nossa movimentação artística, é o nosso modo de fazer. Então, essa temporada vem para a gente primeiro como um respiro, pós todo esse processo que a gente vivenciou. e como uma reafirmação do que nós somos enquanto coletivo. De quem nós somos enquanto coletivo e onde nós somos enquanto coletivo”.
Serviço
segundaPRETA | 12ª temporada
Quando: Toda segunda-feira à noite, até 30 de outubro. A bilheteria abre às 19h, e as apresentações acontecem às 20h. A segundaPRETINHA será no dia 22 de outubro, domingo (bilheteria abre às 15h, apresentação acontece às 16h).
Onde: Teatro Espanca! (rua Aarão Reis, 542, centro)
Ingressos: (R$ 15 e R$ 10 – moradores localizados fora dos limites da avenida do Contorno pagam valor reduzido).
Mais informações: www.segundapreta.com | https://www.facebook.com/segundapreta/ | https://www.instagram.com/segundapreta/
