Nova obra do vencedor do Prêmio Jabuti , “O dia” é lançada pelo Círculo de Poemas
Gabriel Pinheiro | Colunista de Literatura
Mailson Furtado marcou seu nome no cenário literário brasileiro em 2018, quando venceu não apenas a categoria Poesia no Prêmio Jabuti, mas também a honraria máxima da premiação, Livro do Ano, com seu “à cidade”, uma publicação independente. O escritor cearense chega, agora, ao catálogo do Círculo de Poemas com “O dia”, longo poema em ato único – como o próprio nos indica logo em seu início.
Uma longa madrugada
Por mais longo que um dia possa ser, é difícil superar o interminável passar do tempo de uma noite insone. Quantas vezes você não se pegou acordado madrugada adentro, a mente inquieta, as preocupações de um dia que irrompem à noite? Estado de alerta. Numa longa madrugada que se dà a ação deste “O dia”:
“espero/ espero o sono/ o meu desencontro/ que não chega// e tudo bem/ : os pecados em segredo/ as vontades pela metade/ o dedo na cara/ o desejo por quem/ não amei”.
O levantar da cama, o caminhar pelo quarto, conferir se a porta de casa se encontra trancada. Ritos de um insone. O narrador de “O dia” cumpre cada um deles. E mais. Se o interruptor apaga a luz em milésimos de segundo, a mente é uma tecnologia mais complicada. Não há um interruptor para desligá-la. Enquanto lida com a companhia da insônia, o eu-lírico mergulha no passado, nas memórias do ontem, no que já foi, em quem já foi.
“por onde anda maria?/ continua com os olhos/ mesmos?/ os mesmos não dizeres?/ por onde anda?/ por onde?/ ./ ./ ./ e/ não durmo”.
O tempo do capital que nos tira o sono
O longo texto poético é dividido por diferentes indicações, como rubricas de teatro, que dividem e descrevem a ação posta em cena. No início:
“Pequeno apartamento./ Noite. Breu.// Deitado. Já sem”. Depois: “Levanta-se. Acende uma lâmpada./ Tudo se ilumina. Tudo se ilude”. Ao fim: “Despertador toca./ Levanta. Des-liga”.
Noite insone metamorfoseada em poema. Poema metamorfoseado em noite insone. Mailson Furtado escreve tanto sobre um tempo íntimo, quanto sobre um tempo coletivo. Um tempo do capital contemporâneo. Um tempo que nega o descanso, por mais cansados que possamos estar.
“e/ toda a vida cabe/ nesta noite// tal qual toda a poesia cabe/ num caderno em branco/ tal qual todo o sol cabe/ numa fresta/ tal qual todo o futuro cabe/ num passo”.
Círculo de poemas
O Círculo de poemas é uma coleção de poesia e um clube de assinaturas da Fósforo Editora. A cada mês, o assinante recebe em casa uma caixinha com duas publicações cuidadosamente editadas. No mês seguinte, essas obras são vendidas também em livrarias de todo o país. No volume maior, os leitores encontram obras inéditas, reuniões de livros raros ou antologias, com a poesia de autores brasileiros ou estrangeiros de diferentes gerações.
Já nas plaquetes – pequenas brochuras que homenageiam a forma de publicação independente tradicionalmente usada pelos próprios poetas para fazer circular seus versos –, a coleção apresenta textos inéditos: poemas, ensaios, diálogos e estudos sobre poesia, para aproximar ainda mais os leitores desse universo. Cada plaquete tem, no verso de sua capa, uma imagem escolhida especialmente para dialogar com os textos, formando uma incrível coleção de obras visuais. Saiba mais e assine em: https://circulodepoemas.com.br/.
Gabriel Pinheiro é jornalista e produtor cultural. Escreve sobre literatura aqui no Culturadoria e também em seu Instagram: @tgpgabriel (https://www.instagram.com/tgpgabriel)