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“O céu para os bastardos”, de Lilia Guerra, é olhar vivo e pulsante para realidade brasileira

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“O céu para os bastardos” da escritora paulista transforma personagens em protagonistas de suas próprias vidas, numa escrita aguçada e difícil de largar.

Por Gabriel Pinheiro | Colunista de Literatura

Maria Expedicionária, Xispê, Sá Narinha ou simplesmente Maria – mais uma Maria entre tantas, dependendo do ambiente. Esses são alguns dos nomes pelos quais a narradora de “O céu para os bastardos” é conhecida, seja na comunidade onde vive. A pulsante e múltipla Fim-do-Mundo, no bairro nobre onde trabalha ou dentro da linha de ônibus que conecta estes dois ambiente tão opostos. “O céu para os bastardos” é o novo romance da paulista Lilia Guerra, publicado pela Todavia Livros.

Entre o lar e o trabalho, um sem fim de personagens, acontecimentos e situações – desde as mais cotidianas, até as mais definitivas – fisgam o olhar de uma narradora que não perde o fio da meada na construção de uma linha narrativa firme. “O céu para os bastardos” é um daqueles lançamentos incontornáveis da nossa literatura no último ano. Dona de uma prosa viva e pulsante, Lilia Guerra consegue nos inserir dentro da realidade de seus personagens, parece nos puxar para perto de si e contar as muitas histórias que circulam entre eles.

Empregada doméstica, Sá Narinha escutou de um antigo patrão, ao dizer para ele de seu sonho de, um dia, escrever um livro: “Não pense nisso, Maria! (…) Há escritores medíocres aos bocados, Maria. Mas está cada vez mais difícil encontrar alguém com talento para passar uma camisa do jeito que você passa”. Nesse discurso, realidade e ficção se encontram. Lilia, um dia, ouviu um “conselho” semelhante de alguém bem mais próximo de si. Sorte da literatura brasileira – é nossa, é claro – que tanto Guerra quanto Expedicionária não escutaram seus respectivos interlocutores.

Caminhando entre a experiência pessoal e a fabulação

Guerra escreve um romance vivo e mutante. Cabe um mundo de temas e de vivências na comunidade de Fim-do-Mundo, assim como essa Fim-do-Mundo ficcional parece caber em tantas outras comunidades que nos circundam, que existem e, sobretudo, resistem na realidade brasileira. “Andando a pé, é possível constatar com maior atenção questões elementares que assolam Fim-do-Mundo. Como são sujas as ruas. As calçadas aleijadas. Fios repletos de restos de rabiola. Paisagem doente”. Se o descaso do poder público grita no texto de Lilia, a poesia do cotidiano permeia as ruas e vielas dessa comunidade, como forma de resistência: “Coisa que me adoça é ver pessoas comprando comida. Para muita gente, ter dignidade é botar a sacola debaixo do braço e ir à feira”.

“O céu para os bastardos” é um olhar aguçado e generoso para uma realidade brasileira que é múltipla e segue em constante movimento, se reinventando geração após geração. Breve e de leitura ágil – é difícil largá-lo – o romance discute temas como a desigualdade social, o racismo, a violência doméstica e o feminicídio com cuidado e atenção, numa mão leve e acolhedora. Num livro onde todos os personagens carregam um nome próprio, Lilia Guerra os torna protagonistas de suas próprias histórias, de suas próprias vidas. 

Encontre “O céu para os bastardos” aqui

Gabriel Pinheiro é jornalista e produtor cultural. Escreve sobre literatura aqui no Culturadoria e também em seu Instagram: @tgpgabriel (https://www.instagram.com/tgpgabriel)

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