Da última fileira do teatro, o diretor e dramaturgo Marcio Abreu observa a encenação. Coça a barba, franzindo a testa. Do lado direito, está Rafael Lucas Barcelar. Do esquerdo, Lydia Del Picchia. Ambos diretores assistentes. Ao mesmo tempo em que o sorriso aparece no canto da boca, o nervosismo também aparece. Estão atentos e orgulhos dos formandos do terceiro ano do Centro de Formação Artística e Tecnológica do Palácio das Artes que encenam Vinte. A montagem de formatura fica em cartaz até o dia 19 de dezembro no Sala João Ceschiatti e tem entrada gratuita.
É com essa mesma atenção que os diretores dão os últimos toques na passagem do espetáculo horas antes da apresentação. “Troca para mar. Mar, saca!?”, comenta Abreu sobre uma das cenas de Pedro Henrique Pedrosa. “Exercício do dedão”, grita depois. Em suma, essa é uma maneira de concentrar e relaxar os atores que chegam três horas antes do início da peça. “Concentração e força”, rebate.
Atenção e concentração
Nos bastidores, o clima é de nervosismo, com um mix de ansiedade e emoção. “Estou tentando me concentrar bastante. É uma felicidade muito grande estar formando. O Cefart é uma avalanche que passa na nossa vida e ocupa muito tempo”, comenta a atriz Nayara de Sales Neves. No camarim, uns cantam, se arrumam, outros passam o texto, jogam conversa fora e todos se divertem. “É uma alegria ter o Marcio como diretor. Foi uma escolha da turma. Um desejo de pesquisar e vivências novas coisas. Neste espetáculo, ele investiga a ideia de acontecimento cênico e espaço. Sendo assim, trata-se de uma peça de teatro com linguagem performática e com tudo que o diretor já trabalha”, conta Pedro Henrique Pedrosa.
Antes de começar a apresentação, o tempo que resta é para aquecer o corpo e a voz. Tem o abraço e o grito de boa sorte. Casa cheia. A encenação começa no hall do Grande Teatro e segue para a sala João Ceschiatti, no piso inferior.
A montagem
Quem conhece os trabalhos de Abreu sabe que não pode faltar água, tons de preto, nudez, repetições, e claro, muita crítica social. Em Vinte, o grupo cria uma performance que dialoga com a cartografia de Belo Horizonte. No palco, os 20 atores utilizam elementos da música, da dança e do teatro. São cenas individuais e coletivas que falam sobre a cidade, o corpo, relações de independência, poder, sexualidade e diferenças. O movimento Menos Palácio, Mais Arte também aparece no texto. No cenário, um amontoado de cadeiras e mesas no fundo do palco e um chão mapeado.
“Sendo uma montagem de conclusão de três anos, achava importante que de algum modo a dramaturgia fosse gerada em processo que viesse deles. Sendo assim, escrevi alguns textos para nortear o caminho e dividi a turma em núcleos. Boa parte do texto e direção foram criados em conjunt. Foi um prazer e um compromisso. É uma forma de colaborar para formação de outros artistas e para a conservação de espaços como o Cefart”, explica Marcio.
O cenário de Vinte vai aparecendo à medida em que as situações vão se desenvolvendo. Sendo assim, é possível ver que a peça é dividida entre o que acontece antes e depois desta cartografia. Antes, os atores formam um grupo padronizado, inclusive visualmente. Depois, as singularidades começam a aparecer. Há também, importantes acontecimentos de Belo Horizonte e histórias de pessoas que habitam a cidade.
Vigor
Tudo em Vinte é pensando, mesmo tendo muita experimentação. Chama a atenção como o diretor trabalha o potencial e o ponto fora da caixa de cada um. Uma peça forte, que toca e faz sair de lá refletindo. Principalmente sobre a importância de espaços como o Cefart para a formação. É bonito ver o vigor e a emoção dos atores para colocar a peça no palco. Uma energia toma conta. Corpos diversos celebrando a arte do encontro, que é o teatro.