“Fernando Brant e tudo que a gente sonhou” ficará em cartaz nos dias 24, 25 e 26 de março, no Teatro Feluma, em Belo Horizonte
Por Patrícia Cassese | Editora Assistente
Parceiro constante na trajetória do grupo Ponto de Partida, Fernando Brant (1946 – 2015) sempre deixou explícita a vontade de assinar, junto à companhia, um musical. A partida precoce do celebrado letrista poderia ter colocado um ponto final ao projeto, mas eis que, recentemente, a veterana companhia de Barbacena recebeu, por parte do Teatro Feluma, o convite para engendrar um espetáculo que focasse justamente a obra desse que foi um dos sócios-fundadores (digamos assim) do celebrado Clube da Esquina.
“Para a gente, pareceu uma benção, uma coisa encantada”, resume assim a diretora Regina Bertola, em entrevista ao Culturadoria, exalando, em sua fala, todo o entusiasmo que perpassa a montagem “Fernando Brant e tudo que a gente sonhou”, que estreia nesta sexta, dia 24, ficando em cartaz também no sábado e domingo.
Parceria com a FCM
Regina Bertola ressalta também o fato de o teatro do qual veio o convite estar imbricado a uma instituição de ensino, no caso, a Faculdade Ciências Médicas de Minas Gerais. “Isso é outra bênção, porque só vamos ter um país culturalmente evoluído, com uma sociedade mais justa e generosa, quando a educação e a cultura andarem juntas, agarradas. Então, nesse caso, houve o encontro desses dois fatores inusitados e muito bem vindos”.
A ideia, vale dizer, partiu de Wagner Ferreira, presidente da Fundação Educacional Lucas Machado (Feluma), mantenedora da FCM. E foi Jair Raso, diretor do teatro, que pensou na ideia de levá-la ao Ponto de Partida. Um dos motivos, claro, foi ele saber da relação do saudoso poeta com o grupo, estabelecida dessa forma a partir de 1990, com a montagem de “Beco – A ópera do lixo”, um dos maiores sucessos da carreira da companhia. “Foi o nosso primeiro musical e, para ele, convidamos o Fernando Brant para fazer as letras e o Gilvan de Oliveira, as melodias”, lembra Regina.
Aval da família Brant
Dessa forma, com a semente plantada, o grupo contou com o apoio de Bel Brant, filha de Fernando Brant, que disponibilizou toda a obra do pai para a empreitada. “Daí, pulamos fundo na pesquisa”.
Regina conta que desde o início queria ter no repertório “aquelas músicas que são hinos mesmo, que marcaram toda uma geração”. “Mas queria apresentá-las do ponto de vista das letras, e isso muda completamente o jeito de olhar, né? Então, a pesquisa foi feita a partir das composições e de umas duas ou três crônicas. Ou seja, as palavras (que costuram a dramaturgia) são dele”, comenta ela.
Desvendando a cabeça de um poeta
No geral, o objetivo é tentar entender como funciona a cabeça de um poeta. “Desvendar, dessa forma, como são os processos criativos de um poeta – no caso, o Fernando Brant”.
Não por outro motivo, ela diz se tratar de um espetáculo que se distancia de um viés realista. “Ele parte de uma fantasia, mas é sério. O público vai entender como ele era um grande poeta, que sabia lidar e manipular as palavras. E, também, como seus escritos continuam atualissimos. Há coisas que parecem ter sido escritas semana passada. Um material poético fortíssimo, imprescindível”.
No palco, estão sete atores da companhia, bem como uma banda, composta por piano, sax, clarinete, flauta, violão, bateria e voz (leia, ao fim, o nome dos integrantes). Vale dizer que não há, em cena, um ator interpretando Brant.
O público vai fruir desde sucessos como “Encontros e Despedidas”, bem como “Bailes da Vida”, “Canções e Momentos”, “Travessia”, “Paixão e Fé”, “Manuel, o Audaz” às composições compostas para o repertório do Ponto de Partida, todas em parceria com Gilvan de Oliveira.
“E o legal é que as canções ganharam arranjos inéditos, feito pelo grupo musical formado na Bituca (Universidade de Música Popular, instituição criada em 2004 pelo Ponto de Partida, também em Barbacena)”, situa Regina.
Iluminação e cenário foram pensados no sentido de se distanciar do realismo. “O figurino traz transparências, nesse objetivo de mostrar as entranhas, um pouco do que é a gente por dentro”.
Emoção e ansiedade
Espetáculo montado, agora é conter a emoção diante da iminência da estreia, que, claro, terá a presença da família Brant. “A Bel Brant, como eu disse, acompanhou o processo mais de perto. Ela esteve lá, em Barbacena, e a gente também trocou correspondência. Mas também guardamos um segredo para ser surpresa”, revela Regina.
E, sim, além da emoção, a ansiedade também faz o coração da diretora bater mais forte. “Porque, como sabemos, a palavra só se completa na leitura, e essa pode ser quase oposta ao que você quer dizer. Então, há todo esse receio (quanto à reação da família). E também não tem jeito, um espetáculo sobre o Fernando Brant não vai ser completo nunca. Cada um pensa o Fernando Brant de uma maneira, e essa é a nossa. A obra dele é vastíssima, você pode adentrá-la por centenas de lados. O que me norteou foi o carinho, a admiração e o respeito por ele. Então, entramos com asas de borboleta”.
Regina Bertola complementa em seguida: “A gente queria fazer com que ele estivesse ‘vivo’ em cena, que o espetáculo tivesse o jeito dele, jeito esse que a gente conhecia tão bem. Há coisas fundamentais na obra dele, e isso, penso, está no musical. Como Manoel de Barros, para Brant, o fato poético acontece na infância, que, por sua vez, não acaba nunca”, analisa a diretora e dramaturga.
Convite
A diretora também exalta uma capacidade que Brant sempre manifestou: a de sonhar. “Qualquer crônica ou obra dele, mesmo que trate de uma desgraça, há uma mensagem de que é preciso sonhar, que há luz no fim do túnel. Isso é super importante. Esse lado utópico é que faz a pessoa a caminhar, em busca de um mundo melhor, de um ‘homem mais humano’, norteado pela alegria, pelo afeto. Se a pessoa ler (a obra dele) com olhos mais descuidados, pode parecer ingenuidade. Mas é essa força que move os visionários, que faz caminhar para além do real e do possível”.
Antes de se despedir, Regina reforça, por fim, o convite para o público belo-horizontino assistir à montagem. “Especialmente as pessoas que conheceram o Fernando Brant, que foram marcadas pela obra dele, que caminharam com ele, porque tenho certeza que vão ficar emocionadas. Como falei, ele está vivo em cena, não como pessoa, mas como ser criador. E o criador é eterno”.
Repertório do espetáculo
“Valsa do Adeus” – Gilvan de Oliveira e Fernando Brant
“Travessia” – Milton Nascimento e Fernando Brant
“Caxangá” – Milton Nascimento e Fernando Brant
“Vendedor de sonhos” – Milton Nascimento e Fernando Brant
“Bola de meia, bola de gude” – Milton Nascimento e Fernando Brant
“Canoa, canoa” – Nelson Ângelo e Fernando Brant
“Encontros e despedidas” – Milton Nascimento e Fernando Brant
“Manoel, o Audaz” – Toninho Horta e Fernando Brant
“Aqui é o país do futebol” – Milton Nascimento e Fernando Brant
“Paixão e Fé” – Tavinho Moura e Fernando Brant
“Canções e Momentos” – Milton Nascimento e Fernando Brant
Pot-pourri – “Canção da América” (Milton Nascimento e Fernando Brant),
“Paisagem da Janela (Lô Borges e Fernando Brant),
“Para Lennon e McCartney” (Lô Borges, Márcio Borges e Fernando Brant),
“Amanhecer” – Gilvan de Oliveira e Fernando Brant
“Nos Bailes da Vida” – Milton Nascimento e Fernando Brant
“Blues da Maria Bomba” – Gilvan de Oliveira e Fernando Brant
“O Beco” – Gilvan de Oliveira e Fernando Brant
“Fruta boa” – Milton Nascimento e Fernando Brant
“O que foi feito devera” – Milton Nascimento e Fernando Brant
“Vevecos, Panelas e Canelas” – Milton Nascimento e Fernando Brant
“Gaivotas” – Gilvan de Oliveira e Fernando Brant
“San Vicente” (citação) – Milton Nascimento e Fernando Brant
“Maria, Maria” (citação) – Milton Nascimento e Fernando Brant
Elenco
Ana Alice Souza
Andressa Mello
Carolina Damasceno
Ciro Belluci
Érica Elke
Lido Loschi
Renato Neves
Ronaldo Pereira
Músicos
Caetano Brasil – sax e clarineta
Ciro Belluci – voz e flauta
Gladston Vieira – bateria
Pablo Bertola – sax, voz e violão
Pitágoras Silveira – piano
Ficha técnica
Texto: Construído a partir da obra de Fernando Brant, acervo do poeta disponibilizado para pesquisa por Bel Brant
Concepção e pesquisa: Ponto de Partida
Direção geral e dramaturgia: Regina Bertola
Direção musical: Ciro Belluci, Pablo Bertola e Pitágoras Silveira
Arranjos: Ciro Belluci, Gilvan de Oliveira, Marcos Leite, Pablo Bertola e Pitágoras Silveira
Cenário e figurinos: Alexandre Rousset
Convite
“Fernando Brant e tudo que a gente sonhou”
Quando: Sexta e sábado, dias 24 e 25, às 20h, e domingo, 26, às 19h
Onde: Teatro Feluma (alameda Ezequiel Dias, 275, Centro)
Ingressos: R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia)
Vendas: Sympla
Informações: 31 3248-7250 / site do Teatro Feluma