Curadoria de informação sobre artes e espetáculos, por Carolina Braga

Mel Lisboa e a disposição de encarar novos desafios

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Em Tiradentes, a atriz Mel Lisboa esteve a bordo da estreia do filme autoral “Foram os Sussurros que Me Mataram”, de Arthur Tuoto

Patrícia Cassese | Editora Assistente

Já se passaram quase 13 anos desde que a atriz Mel Lisboa foi revelada ao Brasil – do Oiapoque ao Chuí – por conta da minissérie “Presença de Anita”. Desde então, muitas pedras rolaram, e hoje, aos 42 anos, a gaúcha já descolou totalmente a imagem da ninfeta que interpretou na produção assinada por Manoel Carlos e baseada no livro homônimo de Mário Donato, sob direção de Ricardo Waddington. Para tal, Mel contou tanto com o próprio talento (indiscutível) quanto com a capacidade de se enveredar por caminhos bem diferentes. Assim, encarnou personagens de espectros diversos, muitas vezes refletindo escolhas da intérprete que vão na contramão do caminho mais fácil.

Mel Lisboa, que foi a Tiradentes apresentar o mais recente filme no qual atua (Leo Fontes/Universo Produção)
Mel Lisboa, que foi a Tiradentes apresentar o mais recente filme no qual atua (Leo Fontes/Universo Produção)

E é justamente um personagem desafiador que a trouxe agora à cidade histórica de Tiradentes, da 27ª Mostra de Cinema da cidade. Precisamente, na pré-estreia mundial do filme “Foram os Sussurros que Me Mataram”, de Arthur Tuoto. O longa ficcional protagonizado por Mel Lisboa foi exibido no Cine-Tenda, no início da noite de segunda-feira, dia 22 de janeiro. Nele, Mel é Ingrid Savoy, uma celebridade prestes a entrar em um reality show. Assim, passa os dias confinada em um quarto de hotel. Entre visões premonitórias, um ataque de paparazzi e atentados anarquistas que eclodem pela cidade, ela vive a constante iminência de um escândalo.

Bate-papo

No elenco, além de Mel Lisboa, estão Otavio Linhares, Carla Rodrigues, Pedro Gaeta, Patrick Sampaio e Isabela Lago. Já na terça, atores do elenco e membros da equipe técnica participaram do seminário Encontro com os Filmes, no Cine-Teatro Aymoré. A mediação foi do curador Juliano Gomes. A mesa contou, ainda, com a presença do crítico convidado João Pedro Faro, do Rio. Na sequência, Mel Lisboa e colegas se encontraram com representantes da imprensa, para uma entrevista coletiva. Confira, a seguir alguns tópicos.

Confinamento

Mel Lisboa lembrou que “Foram os Sussuros Que me Mataram” é um filme que traz uma situação bastante hermética. “O quarto (no qual a personagem está confinada) é um lugar fechado. E o único lugar ali a partir do qual você teria uma vista para fora também. Então, essa linguagem teatral da quarta parede, o filme acaba erguendo. Na medida em que espectador, entendo, se torna essa quarta parede, ao estar dentro daquele ambiente. Assim, compreendo o ponto de vista de quem (do espectador, na exibição em Tiradentes) se sentiu angustiado”, ri. Vale dizer que, quando a ação do filme deságua num quarto branco, a sensação de clausura, claustrofobia, permanecem.

Elementos

Perguntados sobre a opção por fazer da anarquia quase que um personagem, uma entidade, que rege tudo que está do lado de fora, atores e diretor presentes ao encontro com a imprensa levantaram questões como a de que que, ao fim, tal questão emerge de forma ainda mais clara, quando os anarquistas são comparados à “regra”. Ou seja, ao mainstream, ao industrial, ao convencional, ao televisivo; enquanto o outro lado, mostrado como radical, revoltado, anti-industrial.

No entanto, ao mesmo tempo, ambos os extremos elegem a personagem Ingrid como alvo, seja para almejar, seja para lutar. Assim, seria, lembraram eles, mais uma espécie de banalização dessas revoltas, que muitas vezes não têm um objetivo definido. Ou seja, no filme, aparece mais como uma ideia de tecer criticar sobre os dois lados. Desse modo, o branco que toma conta da tela ao final reforçaria esse ideário, mostrando a personagem quase como se fosse uma entidade, uma deusa, que ascendeu exatamente pela adoração dos fanáticos.

Tiradentes

A equipe discorreu sobre a coincidência de estar, neste período, na Mostra de Tiradentes, uma iniciativa que, cumpre frisar, representa o oposto do jogo proposto pelo Big Brother Brasil, o BBB, atração global que pauta conversas Brasil afora de janeiro a março. “Os três primeiros meses do ano do ano são dominados, na mídia, por esse assunto”. Da mesma forma, foi lembrando que há matérias jornalísticas apontando o desgaste do formato em vários países. No Brasil, houve, também, um movimento de queda no interesse do telespectador. Todavia, mais recentemente, a produção renovou o fôlego.

Desse modo, foi perguntado aos presentes qual a relação de cada um com o formato. Arthur Tuoto brincou dizendo que parou “no Bambam” (referindo-se ao participante Kleber Bambam, ou seja, ele teria parado de ver já na primeira edição)”. No geral, foi levantada a constatação de que, nas mais recentes edições, os participantes perderam a espontaneidade e passaram para um status de treino prévio e performance diante das câmeras, a partir da análise do que aconteceu de certo (ou errado) nas edições anteriores. Os atores e diretor brincaram que, hoje, o BBB estaria mais para “Jogos Vorazes” do que propriamente para a finalidade para a qual foi criado, e como se mantém em outros países.

Referências

Mel contou que o diretor Arthur Tuoto desde o início passou, para ela e demais componentes do elenco, o tom de atuação que esperava dos atores. Assim, falas que propositadamente não transmitissem sinceridade. “Era uma proposta estética do Arthur desde o início, ele sempre quis isso. Que eu falasse esse texto de forma fria, contida. Desse modo, o estudo foi para esse lugar, com essas referências”. Ela emendou dizendo que as referências visuais já estavam no roteiro inicial. “Algumas já estavam lá, descritas, mas de uma forma mais aberta. No entanto, a partir do momento no qual a gente começou a conversar sobre o filme, ele (Arthur) foi trazendo as referências de plano, de fotografia. E as imagens (para a criação da personagem) começaram a se formar na minha cabeça”.

Abaixo, frame do filme

Cinefilia

Mel falou sobre o reconhecimento, da parte dela, das referências trazidas pelo diretor Arthur Tuoto para a equipe. “Bem, conhecer cinema como o Arthur, realmente é para poucos. Taí uma pessoa que conhece de cinema. Mas eu fiz Faculdade de Cinema na Federal Fluminense. Não me formei, infelizmente, mas sempre me considerei cinéfila”.

Autocrítica

Perguntada sobre como é se ver na tela, Mel Lisboa comentou que é sempre um processo “ambíguo e difícil”. “Eu me critico bastante. Mas, neste caso, na verdade existe um prazer estético no filme do qual eu me sinto parte, objeto também. Curiosamente, por conta deste tipo de interpretação. Então, eu consegui também assistir de uma forma um pouco mais fria, me criticando menos. Talvez pela própria característica do filme. Agora, é isso: até então, eu nunca tinha estado em 100% das cenas de um filme. Na verdade, tem uma cena na qual ela fala menos. Desse modo, foi um processo muito intenso”.

Projetos

Além da encenação de “Misery”, de Stephen King, que Mel Lisboa inclusive levou a BH, a atriz gravou, recentemente, a série “Luz”, para a Netflix. Trata-se da primeira série infantojuvenil brasileira da plataforma. Baseada em argumento de Guillermo Pendino, a série tem realização de Thiago Teitelroit. Já o argumento é de André Rodrigues.

Rita Lee

Do mesmo modo, Mel Lisboa segue homenageando Rita Lee. Em 2014, vale lembrar, ela participou da montagem “Rita Lee Mora ao Lado”, baseado no livro de mesmo nome. A cantora e compositora inclusive deu o ar da graça na matéria. E as duas criaram um vínculo. Quando a artista lançou a primeira autobiografia, Mel foi convidada a ser a voz do audiolivro. O mesmo aconteceu na segunda autobiografia, embora essa já tenha sido lançado após a morte da rainha do rock. Agora, Mel Lisboa está envolvida em outra empreitada ligada a Rita Lee.

Na verdade, a ideia inicial seria reencenar “Rita Lee Mora ao Lado”, mas veio a constatação de que não fazia sentido voltar com a peça como era, ignorando o fato que a própria Rita Lee escreveu a própria história – isso, referindo-se à primeira autobiografia. Tanto que Lee abençoou a ideia e até deu sugestões. Assim, será a mesma equipe de criação e produção de “Rita Lee Mora ao Lado”. Porém, em um novo espetáculo. Mantendo algumas cenas, mas em uma nova montagem. A boa notícia é que ela afiança que a montagem passará por Belo Horizonte. Os fãs de Mel agradecem.

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