Curadoria de informação sobre artes e espetáculos, por Carolina Braga

Maria Rita em BH: um show de afeto, intimidade e memórias

Maria Rita fez o show do projeto voz:piano no Palácio das Artes na noite do dia 02 de novembro

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Com os pés descalços, na badalada das 21h20, Maria Rita caminhou calmamente até o centro do palco do Palácio das Artes. Do lado direito dela, o pianista Rannieri Oliveira estava preparado. Mas, quem disse que voz: piano começa de maneira tradicional? É uma conversa, bem descontraída e leve, que abre esse encontro. As canções, claro, são importantes, mas o que protagonizou a noite foi a relação entre artista e plateia.

Por isso, encontro é uma palavra boa para sintetizar o espetáculo apresentado na noite do dia 02 de novembro. Maria Rita diz que é um show íntimo e sobre intimidade. Ou seja, muitas das canções escolhias para o repertório fazem parte da vida dela. Sabe aquelas que todo mundo fica cantarolando pela casa? Então, é uma forma dela compartilhar as delas da maneira mais à vontade possível. “Digamos que é um acesso que vocês tem à sala da minha casa”, disse. Exibir os pés tamanho 35, foi um charme a mais (rs).

Maria Rita já percebeu que, quando o público sabe que o formato é voz e piano, a tendência é que se estabeleça um distanciamento. Tudo que ela não queria. Então, a experiência ensinou que é melhor quebrar o gelo, desmitificar os pés descalços (só porque eles estavam doendo mesmo) e estabelecer de cara o clima ameno, amigo e de coração aberto para todos os lados. E foi assim que a noite seguiu. Sem mirabolâncias de iluminação, uma técnica cada vez mais apurada no cantar e, sobretudo, afeto no apresentar.

Maria Rita em BH. Foto: Carol Braga/Culturadoria

Repertório

Dos Gardênias, canção gravada pelo Buena Vista Social Club e pela própria no primeiro disco, lá em 2003, abriu o repertório. Para quem não sabe, Maria Rita é formada em comunicação social e estudos latino-americanos. Ou seja, a conexão som a sonoridade (y otras cositas) do nosso continente é algo que sempre passa pelo radar dela.

Na sequência, apresentou versões muito particulares para Lindeza, de Caetano Veloso e Manhã de Carnaval, de Luiz Bonfá e Antônio Maria, que fez parte da trilha sonora do filme Orfeu Negro (1959). Embora não tenha gravado, Maria Rita entra para imponente a lista de intérpretes que já se dedicaram a esta canção junto com Maysa, Nara Leão e até Frank Sinatra.

O primeiro bloco do show termina com Caminho das águas, do segundo disco dela e uma linda versão de Grito de Alerta, de Gonzaguinha. Como é bom quando um artista chama a sua atenção para algo que até então passava batido. No caso, a letra dessa música.

No roteiro, há o cuidado de equilibrar as canções. Há lugar para aquelas que demandam uma intensidade maior da cantora e outros momentos mais leves. Sendo assim, depois de uma outra rodada de papo com a plateia – sim, as pessoas estavam conversando com ela – Maria Rita abriu alas para o samba. Num corpo só e Maltratar, não é direito, do disco Samba Meu (2007), combinaram perfeitamente com Cara Valente, presente que ganhou de Marcelo Camelo para o repertório do primeiro disco.

 

 

Humor e intimidade

“Viver e cantar é muito perigoso”, alguém gritou da plateia. “Muito perigoso. Alta periculosidade”, respondeu Maria Rita, em tom de brincadeira. Todos os momentos em que parou para conversar, bateu papo mesmo. As pausas funcionam tanto para estreitar esse laço como também para compartilhar a forma como ela se entende como artista e cidadã. “Nem sei se sou politizada não. Eu estou é irritada, isso sim”, comentou. A tudo o público reagia. Teve #elenão.

Antes de abrir o set em homenagem às cantoras que mais admira, Maria Rita contou mais casos. Começou dizendo da importância e relevância que Ella Fitzgerald teve na formação dela. No entendimento que tem da voz como um instrumento e de que forma a voz também é capaz de captar todas as emoções. Essa parte, diz ter aprendido ouvindo a mãe, Elis Regina. E aí que entrou um dos casos mais curiosos da noite.

Durante a entrevista com querido Tutti Maravilha, soube que em uma das vindas de Elis a BH, o radialista ganhou de presente um disco de Ella Fitzgerald e Billy Holiday. Na dedicatória dizia: “as minhas nossas senhoras”.  Da plateia, Tutti gritou: “eu trouxe o disco”. Pronto, emoção geral para abrir o bloco com Over the rainbow, Inútil paisagem, Romaria, Vida de bailarina, É com esse que eu vou. As últimas quatro, gravadas por Elis Regina.

 

 

Gratidão

O show voz:piano termina, mais uma vez e acertadamente, com o flerte latino-americano.  Gracias a la vida, gravada por Violeta Parra. No bis, novamente, laços estreitos com a plateia. É o que todo mundo gostaria de dizer naquele momento. Depois rolou um Maria Maria à capela, com todos juntos. Em seguida, atendendo a pedidos, Maria Rita terminou com Simplesmente Elis, samba-enredo da Vai-Vai campeão do carnaval de São Paulo em 2015.

Existem vários tipos de show. Para divulgar disco, para gravar e simplesmente para o encontro do artista e da plateia. Claro que há o esmero técnico que acompanha Maria Rita nos 17 anos de carreira. Mas, sobretudo, no voz:piano que passou por Belo Horizonte, houve afeto.

 

Maria Rita em BH. Foto: Carol Braga/Culturadoria

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