“De Onde Vem Essa Força” foi escrito por Vilma Nascimento, prima de Milton, que dividiu autoria com João Marcos Veiga e Jary Cardoso.
Por Caio Brandão | Repórter
Todos conhecem o ícone que é Milton Nascimento. A obra de Bituca se ergue como um dos catálogos artísticos mais importantes da história da música, se fazendo presente nas vidas de múltiplas gerações. Contudo, poucos conhecem a história dos primórdios da família Nascimento, que compõe uma árvore genealógica cuja trajetória, marcada pela garra e pela alegria, se entrelaça, até, com a história da música brasileira. O livro está em pré-venda, que está disponível até o dia 26 de outubro. Para reservar seu exemplar, basta clicar no link.
É justamente esse processo que o livro “De Onde Vem Essa Força” contempla. Idealizada por Vilma Nascimento, prima de Bituca, e com co-autoria de João Marcos Veiga e Jary Cardoso, a obra registra, por meio de relatos familiares, a história da família Nascimento, desde as origens na cidade de Lima Duarte, em Minas Gerais. Além disso, a narrativa perpassa por Três Pontas, Rio de Janeiro e Juiz de Fora, lugares que se tornaram fundamentais na linha do tempo da família.
Vilma conta que a ideia surgiu de forma inesperada ao comprar uma revista no Rio de Janeiro. “A ideia do livro começou durante um período que estive no Rio de Janeiro, quando comprei uma edição da revista Manchete que continha uma reportagem sobre sobre o Milton, falando muito sobre a família dele e, conversando com a minha irmã, nós tínhamos pensado em fazer algo parecido. Ao ler essa reportagem, percebemos que o Milton tinha duas famílias: uma em Três Pontas, e uma em Juiz de Fora. Daí, vimos que uma reportagem não seria suficiente, já que a família era muito grande. Sendo assim, surgiu a ideia do livro. Então, falei com o Jary se a ideia era possível, ele topou e, assim, peguei um bloquinho, um gravador e saí para coletar informações sobre a família, conversando com tias, tios, primos, primas… Assim, o livro foi nascendo.”
O impacto de Maria do Carmo
Um dos pontos mais impactantes da obra se manifesta por meio de um raro registro de Maria do Carmo, mãe biológica de Milton Nascimento. Durante as pesquisas, Vilma se deparou com uma foto de Maria que estava em posse da irmã. A história de Maria era algo oculto, desconhecido pelo público, muito por causa de seu falecimento ainda jovem, aos 26 anos. Vilma conta que essa relíquia foi decisiva para a narrativa presente no livro.
“Essa foto da tia Maria do Carmo estava com a minha irmã, Vanda. Eu nem sabia da existência desse registro, e ele foi fundamental para o livro. Essa foto é de um documento de trabalho dela, da época em que ela trabalhava na casa da família da Lilia, mãe adotiva do Milton. A foto é muito importante para a obra pelo impacto enorme que ela possui, ninguém conhecia a Maria do Carmo, e aí surge essa foto, dessa negra linda que tem uma história de vida que me comoveu. Foi uma grande sorte ter encontrado esse registro.”
João Marcos Veiga, um dos coautores do livro, ressalta o valor inestimável que a foto possui, além do fato de que esse registro teve um impacto tão grande, que acabou viralizando nas redes sociais. “A foto é um documento histórico. A vida da Maria do Carmo foi muito curta, e não era muito falada. De repente, aparece esse documento que mostra o nome dela, o histórico de trabalho, o valor do salário… Foi uma surpresa enorme encontrar esse registro, o impacto dela nos pegou de surpresa, pois, quando ela foi divulgada, ela não era nem a foto de capa do livro, mas a repercussão foi enorme. Depois que essa foto emergiu para o grande público em uma matéria da Folha de São Paulo, as pessoas compartilharam muito, transcendendo, até, o próprio livro. Creio que esse processo faz parte da história do nosso trabalho.”
Do interior à capital
A trajetória da família Nascimento possui uma riqueza impressionante, englobando quatro cidades de perfis muito diferentes, começando em Lima Duarte, passando por Três Pontas e Juiz de Fora, e chegando até o Rio de Janeiro. Assim, as vivências dos parentes, e até do próprio Milton, se distribuem entre esses quatro locais.
“Quando começamos a escrever a história, começamos pelo interior, em Juiz de Fora. Daí, fomos percebendo que também havia muita história no Rio de Janeiro, Lima Duarte e, principalmente, Três Pontas, que foi onde o Milton cresceu. Assim, realizamos uma escrita que busca mostrar esse outro lado menos conhecido do Bituca. Nossa família é muito linda, muito grande, muito alegre, muito festeira! Tudo isso faz parte do livro, e eu tenho muito orgulho de ter construído, junto ao João e o Jary, esse registro tão bonito da história do Milton”, contou Vilma.
Ademais, Vilma ressalta que essa alegria intensa que faz parte da família Nascimento pode ser percebida no modo de fazer arte que Milton desenvolveu ao longo do tempo. “Os shows do Milton sempre foram uma grande festa! Quando ele anunciava show, eu demorava três dias para me arrumar, já que sentia que eu estava indo para uma festa maravilhosa. Então, sinto que a alegria da nossa família tem muita influência na obra do Bituca, já que a música sempre teve uma presença muito forte nas nossas criações, tanto a minha quanto a do Milton.”
A presença da arte
Quem vê o talento e a presença artística de Bituca, vê como habitual a maestria com a qual Milton desenvolve os trabalhos que produz. No entanto, quando se analisa a história da família Nascimento, percebe–se que a arte corre no sangue por gerações.
Vilma explica que a música é algo que foi extremamente presente na criação das crianças da família. “A presença da arte dentro da família foi algo muito natural. O mineiro é um povo festeiro, que gosta de celebrar, e lá em casa não era diferente. Me lembro que papai tocava sanfona, gostava muito de forró, sempre íamos às festas que aconteciam na cidade. Eu também sempre gostei de cantar, participava de um grupo escolar no primário, que tinha aulas de canto, de piano… Eu aproveitava toda oportunidade de cantar, até o hino nacional na escola (risos). Em Juiz de Fora, já havia apresentações musicais em rádio, programas de auditório, e esse contexto que transborda arte foi muito bom, tinha música, poesia, pintura, a cidade fervilhava.”
“É interessante perceber que até membros da família Nascimento que o Milton nem chegou a ter contato também eram envolvidos com música. Por exemplo, o avô do Milton, que era companheiro da Vó Maria, ainda lá em Lima Duarte, era uma figura fortemente ligada à sanfona, ele andava a cavalo enquanto tocava sanfona! Então, por conta dessas histórias, percebemos que a música já fazia parte da família Nascimento até mesmo antes do Milton”, explicou João Marcos.
Retratos de várias épocas
O caminho da família Nascimento tem como fundamento as cidades nas quais esteve presente. Sendo assim, os parentes e antepassados de Bituca viveram tanto em cidades do interior, como Lima Duarte, até megalópoles, como o Rio de Janeiro. Tendo isso em vista, o livro também destaca os panoramas socioeconômicos vigentes nesses espaços.
João Marcos explica que esses contextos são fundamentais para entender a lógica por trás da trajetória da família. “O livro tem uma narrativa familiar, de histórias familiares, que é quase um gênero de escrita por si só. Temos a figura do Milton como motor, mas cada janela de investigação abre a possibilidade de entender o contexto histórico de cada um desses lugares. Por exemplo, a Vó Maria, que é a grande matriarca da família, viveu em um período de transição entre os séculos XIX e XX. Nesse sentido, a escravidão ainda era muito presente, mesmo após a abolição, naquela zona rural.”
“Temos, ainda, Juiz de Fora, que, à época, era considerada a Manchester mineira por ser um polo industrial próspero ali nos anos 40, um contexto no qual as rádios eram muito importantes, tanto para a informação quanto para a arte. Juiz de Fora, naquele período, era uma cidade mais importante até que Belo Horizonte, e isso se entrelaça com a história da família, com a busca pela sobrevivência. Já no Rio, a MPB se torna algo muito proeminente, exacerbando a veia artística da família, do Milton, e até da Vilma”, completou.
Metodologia
A construção do livro se deu de forma quase inteiramente analógica, fazendo uso de documentos e registros antigos para compreender as várias facetas de uma história tão rica como a da família Nascimento. Nesse sentido, horas e horas de estudo foram necessárias para que tudo fosse devidamente contemplado.
“Esse livro foi um grande desafio que eu me propus, muito por teimosia de jornalista mesmo (risos). Estou há mais de meio século na profissão, e toda essa experiência me fez perceber a importância gigantesca da contextualização dentro desse universo do livro. Assim, antes de começar a escrita em si, eu quis me aprofundar nas histórias dessas cidades, como elas surgiram. Por exemplo, a Vó Maria nasceu em 1900, então eu queria explorar essa época, descobrir como ela cresceu. Então, estudei muito a origem urbana do Brasil, conversando com estudiosos da área que me deram uma lista enorme de livros nos quais mergulhei profundamente”, contou Jary Cardoso.
“Era muita informação, e o João me ajudou muito no processo de enxugar isso tudo. No entanto, o que realmente prevalece no livro são as histórias contadas pela própria família. Além disso, a Vilma foi fundamental nessa pesquisa, pois ela ia nas cidades, nas bibliotecas, e me trazia calhamaços de registros históricos sobre Lima Duarte, Juiz de Fora, Zona da Mata… Poxa, era muita coisa, mas isso ajudou o material a ficar tão rico”, completou o jornalista veterano.
Serviço
Livro “De Onde Vem Essa Força: histórias da família Nascimento de Minas
para o mundo”
Autoria: Vilma Nascimento, Jary Cardoso e João Marcos Veiga
Editora: Letramento (BH/MG)
Pré-venda: até 26 de outubro
Valor: R$ 48 (10% de desconto na pré-venda)
Link e mais informações: https://www.editoraletramento.com.br/produto/de-
onde-vem-essa-forca-historias-da-familia-nascimento-de-minas-para-o-mundo