Falecido há 20 anos, Jorge Lafond tem sua trajetória recontada em peça que estreia nesta quinta, no Teatro II do CCBB BH
Patrícia Cassese | Editora Assistente
Há pouco mais de 20 anos, o Brasil perdia o talento de Jorge Luiz Souza Lima, o Jorge Lafond. Nascido em Nilópolis, no Rio de Janeiro, o ator, comediante e dançarino faleceu em 11 de janeiro de 2003, com apenas 51 anos. Desde dezembro do ano anterior, ele estava internado em um hospital da capital paulista, e, após apresentar complicações renais, acabou sofrendo um infarto fulminante. Muito conhecido por meio de seu personagem Vera Verão, Lafond é agora homenageado no palco por meio do espetáculo “Jorge Pra Sempre Verão”, que estreia nesta quinta-feira em BH – no Teatro II do CCBB BH.
“Jorge Pra Sempre Verão” é apresentado como “uma narrativa fictícia permeada de fatos verídicos sobre a trajetória do artista”. Dirigida por Rodrigo França, a montagem tem texto de Aline Mohamad, prima de Jorge Lafond, e Diego do Subúrbio; enquanto Alexandre Mitre interpreta o ator em cena. O elenco traz, ainda, Aretha Sadick e Noemia Oliveira, que interpretam, respectivamente, Vera Verão e Aline, a prima.
“Bullying-homofóbico estrutural”
Vale dizer que a ideia de escrever o roteiro nasceu após Aline redigir uma carta póstuma ao primo, com quem, na verdade, não chegou a conviver. “Essa carta foi a única maneira de me reconciliar com meu primo, que não conheci por conta de um tipo de bullying-homofóbico estrutural”, analisa ela.
Assim, ao reconhecer seu primo em si, Aline sentiu que deveria redigir uma missiva pedindo desculpas “por tudo o que senti, ainda que inconscientemente”. O texto, prossegue ela, traz a carta na íntegra, mas com toda uma dramaturgia em torno. “Há, ainda, muitas histórias de Jorges, Veras e Primas que atravessaram nossas histórias”.
Formas de contar a história
Quando terminou de redigir a carta, Aline Mohamad decidiu enviá-la a alguns amigos, que, por sua vez, de pronto, opinaram: “Você tem uma peça nas mãos e precisa montá-la!”. “De lá para cá, foram três anos buscando formas de contar essa história em cima do palco”, diz ela.
Perguntada sobre que traço da personalidade de Lafond ainda desconhecido pelo grande público a peça eventualmente descortinaria, Aline reconhece que, assim como o grande público, todo o seu relacionamento com ele se deu através da mídia, assim como da leitura da autobiografia. Do mesmo modo, de conversas com pessoas que conviveram com Lafond. “Portanto, e infelizmente, não tenho como responder a essa pergunta a não ser com o meu imaginário”.
Racismo e homofobia
“Tudo o que tenho (de informações sobre Lafond) são imagens, palavras, histórias…”, explica Aline Mohamad. “E cada uma das histórias que ouvi. durante todo esse processo de pesquisa, escrita e trajetória da peça, me faz enxergar um cara único, singular. Forte. Mas, exatamente por passar toda essa imagem de fortaleza, as pessoas não o enxergavam como um ser humano. E, assim, não estavam, de fato, ao lado dele”.
Parafraseando, como ela mesma diz, o atual ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil, Silvio de Almeida, Aline considera que Lafond era alvo de racismo e homofobia recreativos. “Pode parecer um julgamento o que direi agora – e de fato é, ainda que, ao mesmo tempo, também uma denúncia!. Mas os tipos de ‘pegadinhas’ feitas com ele… A produção de um grande programa não ficar a favor dele diante de um ‘pedido’ homofóbico de um padre, por exemplo. Tudo isso mostra o quanto aquele corpo de fato não importava para eles”, lamenta.
No entanto, Aline não se furta a opinar sobre o principal legado do parente. “Ser quem se é, apesar de tudo e de todos. Ver o Jorge Lafond, a Vera, em um grande lugar na mídia, nos dá esperança, liberdade de sermos quem somos, da maneira que acharmos melhor para se viver neste mundo”, entende.
Quanto ao espetáculo, ela enseja que o público se encontre na iniciativa. “Assim, que se encontre nos Jorges, nas Veras, na Prima… O público pode esperar, sim, dar muita risada. Mas esperamos que também se emocione e que reflita sobre atos e consequências, para a formação de um mundo mais justo, igualitário e, de fato, inclusivo”, conclui.
Trajetória
Nascido em Laranjeiras, na zona sul do Rio de Janeiro, e criado na Penha, zona norte da capital fluminense, Laffond Formou-se em teatro pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio). Também se graduou em Educação Física.
Deu início à carreira como bailarino com 17 anos, tendo se apresentado também no exterior. Integrou o corpo de bailarinos do “Fantástico” em 1974. Na Globo, também participou de programas como “Viva o Gordo”, “Os Trapalhões” e de especiais como o infantil “Plunct, Plact, Zuuum”.
Na extinta TV Manchete, fez a novela “Kananga do Japão”. Mas foi no SBT, no programa “A Praça é Nossa”, que veio a personagem que o consagrou, Vera Verão. Na emissora de Silvio Santos, trabalhou, ainda, no “Domingo Legal”.
No cinema, atuou em filmes como “Rio Babilônia”, “Bar Esperança”, “Bete Balanço”, “Rock Estrela” e “Leila Diniz”. Cumpre frisar que, como bailarino, Lafond chegou a dançar com Mercedes Batista, a primeira bailarina negra a integrar o corpo de baile do Theatro Municipal do Rio de Janeiro.
Serviço
“Jorge Pra Sempre Verão”
Teatro II do CCBB BH (Praça da Liberdade, 450)
Temporada: de 13 a 31 de julho, sempre às 20h30. Os ingressos custam R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia), e estão disponíveis no site ou na bilheteria do CCBB BH.
Clientes Banco do Brasil com cartão Ourocard pagam meia-entrada.
Em tempo: no dia 29, o espetáculo terá tradução simultânea em Libras
Duração: 75 minutos