Curadoria de informação sobre artes e espetáculos, por Carolina Braga

Ailton Krenak: “Eu sou filho da terra. Eu tenho mátria, não pátria”

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Escritor e liderança indígena, Krenak foi homenageado na 2ª edição do Fliparacatu, que encerrou a programação celebrando a vida e a obra do autor

Gabriel Pinheiro | Colunista de Literatura

“Nunca mais um Brasil sem indígenas, sem negros, sem mulheres, sem a diversidade”, declarou Jamil Chade no encerramento do Fliparacatu, que recebeu o homenageado desta 2ª edição do evento, o escritor e líder indígena mineiro Ailton Krenak. O jornalista destacou que a honra da entrada do autor de “Ideias Para Adiar o Fim do Mundo” (entre outras obras) na Academia Brasileira de Letras não é de Krenak, um imortal antes de qualquer título, mas da própria instituição em, finalmente, se abrir ao pensamento indígena. “Obrigado Krenak, por ser essa fresta de luz, frente à escuridão, para o Brasil”, concluiu Chade.

Ailton Krenak, um dos homenageados da 2ª edição do Fliparacatu (Bleia/Divulgação)

Homenagem

Homenagear Ailton Krenak foi um grande acerto do Festival, por tudo aquilo que o escritor indígena representa, pela potência de sua produção literária e pelo olhar deste pensador para o porvir da infância e da juventude. Em um dos momentos mais emocionantes do evento, Krenak participou da entrega dos Prêmios de Redação e Desenho para alunos da rede pública de ensino de Paracatu. Na ocasião, fez um discurso potente para os jovens artistas e escritores. “Crianças queridas, aqueles mais pequenininhos e aqueles que são mais grandinhos, essas pessoas lindas que estão começando a trilhar essas jornadas, esses palcos, esses caminhos… Mantenham os seus coraçõezinhos no lugar onde sempre estiveram, seguros. A beleza de vocês é que dá sentido ao mundo. Os desenhos que vocês fazem, os textos que escrevem, as palavras que comunicam são o sentido da literatura, do desenho, da arte”.

“Nós podemos nos curar e curar o mundo ao nosso redor com aquilo que já temos dentro de nós. Nós temos um efeito de cura”, comentou Krenak, no início da homenagem à sua vida e à sua carreira. “É preciso estar atento e forte”, citou. “É com calma e tranquilidade que vamos reconhecer a trilha que nós poderemos passar. Eu me perguntei muito se eu deveria aceitar a inscrição a uma vaga na ABL. Mas isso aconteceu de uma maneira tão coletiva, tão ampla, que você sente que não pode amarelar: Vai lá!”.

Filho da terra

Ailton Krenak também debateu a questão da língua: “O que significa pensar numa língua nos termos de que a sua língua é a sua pátria? Eu sempre desconfiei dessa história de ‘minha língua, minha pátria’. Inclusive, eu desconfio desse termo ‘pátria’. Eu sou filho da terra. Eu tenho mátria, não pátria.” Para o autor mineiro, as línguas são maneiras de a gente nomear: lugares, pessoas, coisas. “A nossa capacidade de inventar línguas é algo maravilhoso”. Ele rememorou, então, o trabalho do escritor mineiro João Guimarães Rosa e seus neologismos.

Construção de pensamento singular

“Vamos pousar suavemente na Terra. Vamos ver os outros organismos vivos que estão ao nosso redor”. Ao longo da noite, Ailton Krenak mostrou o grande contador de histórias e construtor de pensamento que é, em uma longa fala, na qual pontuou questões como a ancestralidade, a humanidade, a natureza e as cosmogonias indígenas. “As crianças entendem que a gente não pode matar formigas. Os adultos ainda não entenderam que não podem aniquilar palestinos”, declarou Krenak, num pensamento construído com um brilhantismo singular. E concluiu sua fala com um sonoro: “Palestina Livre!”.

“A esperança de cada geração melhorar pode parecer um lugar comum. Mas para povos que foram excluídos historicamente, como os de origem africana e ameríndios, ter a palavra significa ter uma fresta nessa caixa fechada onde o colonialismo nos segrega. Furar essa caixa é uma arte”. 

– Ailton Krenak

Encontre as obras já publicadas por Ailton Krenak aqui:

*Gabriel Pinheiro é jornalista e produtor cultural. Escreve sobre literatura aqui, no Culturadoria, e também em seu Instagram: @tgpgabriel (https://www.instagram.com/tgpgabriel)

* O Fliparacatu é patrocinado pela Kinross, por meio da Lei Rouanet. O Culturadoria visita o festival a convite do patrocinador.

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