Curadoria de informação sobre artes e espetáculos, por Carolina Braga

Isabel Teixeira encena texto biográfico de Jandira Martini

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Com direção de Marcos Caruso, “Jandira, Em Busca do Bonde Perdido” terá duas sessões no Teatro do Centro Cultural Unimed–BH Minas

Patrícia Cassese | Editora Assistente

Ao usar a palavra “falecer” para se referir a Jandira Martini (1945-2024), pilar de sua nova investida na seara das artes cênicas, a atriz, dramaturga e diretora paulistana Isabel Teixeira prontamente se corrige. “Ela preferia a palavra ‘morrer'”, explica. Na verdade, Isabel ia usar o termo “falecer” para destacar que a montagem com a qual chega agora à capital mineira – “Jandira, Em Busca do Bonde Perdido”, direção de Marcos Caruso – seria encenada pela própria Martini (1945-2024). No entanto, não houve tempo – Jandira Martini faleceu em janeiro, aos 78 anos de idade, em decorrência de um câncer de pulmão.

Isabel Teixeira em cena de "Jandira, Em Busca do Bonde Perdido" (Roberto Setton/Divulgação)
Isabel Teixeira em cena de "Jandira, Em Busca do Bonde Perdido" (Roberto Setton/Divulgação)

Aliás, a atriz – queridíssima do público brasileiro por meio da presença em novelas como “Sassaricando”, “O Clone” e “América” – e produtora é a autora do e-book autobiográfico “Casaco de astracã verde ou em busca do bonde perdido” (Editora e-galáxia, 66 páginas), que, por sua vez, acabou sendo o calço da dramaturgia de “Jandira, Em Busca do Bonde Perdido”. Antes de seguir, vale dizer que, em BH, o espetáculo solo com Isabel Teixeira ocupa o palco do Teatro do Centro Cultural Unimed–BH Minas neste sábado e domingo, dias 3 e 4 de agosto, respectivamente, às 20h e às 17h. O espetáculo estreou em Santos, cidade na qual Jandira Martini nasceu.

Discrição

“Essa peça nasce do livro que ela escreveu entre setembro de 2015 e meados de 2017. E sei porque isso inclusive é parte do texto (da peça”), especifica Isabel. À época, Jandira já travava uma luta contra a doença que acabou vitimando-a. “Assim, ela resolve escrever com muita coragem sobre aquele momento tão pessoal. Ela, que, até onde sei, não costumava falar sobre si própria com a maestria do tecer dramatúrgico que tinha nas mãos. Sempre elaborava muito a escrita, mas, sobre si própria, falava pouco”, ressalta Isabel Teixeira.

No entanto, Jandira resolveu traduzir em palavras o difícil processo que estava enfrentando longe do olhar público. “Ao mesmo tempo, ele (o processo) a leva a muitas reflexões sobre a vida, sobre o passado, sobre o presente.. E com muito humor, sempre. Isso está no livro”, comenta Isabel. A atriz, cujo talento se amplificou nacionalmente com a novela “Pantanal”, acrescenta que já na época do lançamento do e-book (janeiro de 2020), os amigos de Jandira Martini passaram a incentivá-la a adaptar o texto para o teatro. “‘Isso dá uma peça’, diziam”.

Primeira versão

Entre os defensores da transposição do texto autoral para os palcos, estavam os nomes à frente do Mesa 2, que assina a produção de “Jandira, Em Busca do Bonde Perdido”. Ou seja, Roberto Monteiro e Fernando Cardoso. Tal qual, um dos melhores amigos de vida de Jandira Martini, o ator e dramaturgo Marcos Caruso. “E de fato ela fez uma primeira versão de um texto o qual ela mesma faria no teatro, dirigida por Elias Andreato. Aliás, chegaram a fazer uma leitura. Mas depois veio a pandemia, então, ela não teve como montar. E acabou não dando tempo”. Foi nesse momento, diga-se, que Isabel proferiu a palavra falecer (“ela acabou falecendo”), trocada em fração de segundos por “morrendo”. Como Jandira preferiria, explicou.

Com isso, o Mesa 2 convidou Marcos Caruso para dirigir o texto, enquanto a Andreato foi dada a tarefa de assumir a batuta na montagem de outro texto inédito de Jandira Martini, que vai estrear em São Paulo. Isabel Teixeira antecipa que a peça vai se chamar “Memórias do Vinho”, e trará Caio Blat e Herson Capri no elenco. “Então, nós ficamos com o que acabamos chamando de ‘Jandira, em Busca do Bonde Perdido'”.

“Match”

Neste ponto da entrevista, a simpática (falamos simpática? Simpaticíssima!) Isabel Teixeira abre um parênteses para falar da aproximação com Caruso, com quem dividiu os bastidores da novela “Elas por Elas”. “A gente teve um encontro ali, foi muito legal. E eu sempre falava: ‘Caruso, vamos ler uma peça na sua casa’. Na verdade, a gente até chegou a ler uma dramaturgia dele e da Jandira, chamada ‘Jogo de Cintura’. E foi incrível. Mas um dia, ele me chamou para ler ‘Em Busca do Bonde Perdido’ e, já na primeira leitura, eu falei: ‘Quero fazer'”. (abaixo, Isabel Teixeira em cena da peça – Foto: Roberto Setton/Divulgação)

Isabel Teixeira explica que essa espécie de epifania é algo que acontece com alguns textos, em projetos nos quais está envolvida. “É uma certeza que eu não sei de onde vem. Uma vontade, um desejo de manifestar e de realizar que já tive algumas vezes e voltei a ter desta vez, com este texto. Então, foi muito imediato. E foi muito bonito esse encontro que eu sempre quis ter com o Caruso no teatro”.

Sobre estar vivo

Embora o texto de Jandira Martini aborde a finitude da vida, Isabel Teixeira explicita que a grande tônica de “Em Busca do Bonde Perdido” é o tempo presente e a alegria de vivê-lo. “Sobre estar vivo e aproveitar cada momento que nos foi dado para estar aqui, nesta existência. Traz essa reflexão sobre o estar presente na vida que nos coube e, principalmente, a nossa consciência da finitude. Porque, sim, é fato, tudo passa, tudo acaba, tudo tem o seu prazo. E isso não é necessariamente ruim. Porque encarar a finitude também faz com que olhemos para o presente dando mais importância ao nosso estar aqui. Fica tudo mais belo, então, acho que isso é parte muito importante da peça”.

Aliás, Isabel Teixeira diz que, em certo trecho do texto, que também está na peça, Jandira Martini manifesta a resistência em acreditar “nessas coisas de vidas passadas”, por exemplo. “Ela diz: ‘Estou aqui me esforçando ao máximo para me encaixar nesta vida aqui, que me coube”. Um outro trecho que a atriz destaca, do espetáculo, é quando Jandira começa a descrever um sonho, no qual está em volta de uma mesa junto a amigos, fazendo o que mais gosta na vida: conversar. “E, ano depois, retomar um assunto que tinha ficado pendente exatamente do mesmo ponto. Eu, Isabel, adoro esse trecho, acho lindo”.

Sem eufemismos

A bela Isabel também retoma a fala de Jandira Martini sobre o uso da palavra “morte”. “Ela disse: ‘Morrer é um verbo que me choca um pouco, mas eu prefiro usar o termo exato. Falecer, eu me recuso. Descansar, acho ridículo. Imagina, ‘passar dessa para melhor’, ‘virar estrelinha’.. Não, é morrer mesmo'”. A “Helena” de “Elas Por Elas” arremata: “Às vezes, quando a gente faz uma peça, isso acontece: as falas ficam muito aqui, sabe? Orbitando e vindo”.

Parceria com Caruso

Momentos ou frases. “Agora mesmo, estava vindo do Rio para São Paulo, e passei o voo inteiro falando o texto. Você acredita que sinto falta de fazer? Quando a gente está na fase dos ensaios, faz todo dia. Agora, que a gente está rodando, não. E eu estou realmente apaixonada por esta peça. Por isso, por mais que eu fale, quero mesmo é convidar você, a todos, para assistir, esta escrita que é da Jandira Martini, mas que também é fruto da parceria dela com o Marcos Caruso, de quatro décadas”, explana Isabel. NR. os dois assinaram, conjuntamente, peças como “Sua Excelência, o Candidato” (1986), “Jogo de Cintura” (1988), “A Vida É Uma Ópera” (1992) e “Porca Miséria” (1993).

Afinal, lembra a atriz, Caruso e Jandira Martini escreveram e atuaram juntos. “Desse modo, sinto que essa peça vem celebrar esse encontro tão frutífero dos dois. Porque, na verdade, dirigir uma peça também é escrevê-la, num certo sentido. Trazer movimento à palavra. Então, um trabalho da parceria deles da qual sou testemunha. Assim, entendo que assistir à peça se torna um programa extremamente interessante porque, além de divertir, o público também é testemunha desse encontro tão bonito de duas grandes personalidades do teatro brasileiro”, entende Isabel.

Sorte grande

A conversa de Isabel Teixeira com o Culturadoria também levou a atriz à infância. “Minha mãe (Alexandra Corrêa, morta em 2006, aos 56 anos) era atriz, então, criança, me lembro de ficar nas coxias. E me recordo que, no final da década de 1980 ou começo de 90, o Marcos Caruso foi capa da revista ‘Veja’. Falei: ‘Nossa, é um ator que escreve e que faz teatro. Leva milhões de pessoas ao teatro!’ Eu achava isso tão lindo, tão poderoso. E as peças tão inteligentes e tão acessíveis a todo mundo. E depois, quando ele começa a fazer TV também, eu falava: Olha, é um ator de teatro levando também para a televisão essa sabedoria dele…”

Sabedoria ou… via direta. “Sempre chamei isso de via direta com o público. E, da minha parte, eu sempre tive o sonho de trabalhar com ele. Quando soube que ia fazer a novela com ele, achei, uau, um presente. E foi (risos)! Porque a gente se deu muito bem em cena, foi muito legal trabalhar com ele. Do mesmo modo, a gente se deu muito bem nas coxias. Acho que pelo fato de sermos dois seres humanos intrigados pela dramaturgia. Ela nos intriga no bom sentido. A arte da palavra, do escrever, do dizer. Então, isso nos uniu muito. Assim, foi – e é – um prazer trabalhar com ele”.

Isabel Teixeira e Marcos Caruso: sintonia na TV e nos palcos (Roberto Setton/Divulgação)
Isabel Teixeira e Marcos Caruso: sintonia na TV e nos palcos (Roberto Setton/Divulgação)

Em suma, Isabel Teixeira entende que vem do mesmo planeta que Caruso. “Ou seja, atores que escrevem; Estou na fase de me comunicar, então, essa parceria com ele é mais que um presente: é uma sorte grande. É isso”, finaliza.

Serviço

“JANDIRA – Em Busca do Bonde Perdido

Quando. Dias 3 e 4 de agosto, sábado às 20h e domingo às 17h

Onde. Teatro do Centro Cultural Unimed–BH Minas (Rua da Bahia, 2.244, Lourdes)

Quanto. Ingressos: R$ 100,00 (inteira), R$ 50,00 (meia)

Ingressos Populares: R$ 39,00 (inteira), R$ 19,50 (meia)

Vendas na bilheteria do teatro e na plataforma Sympla https://bileto.sympla.com.br/event/96167

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