O encontro para um café com Wilson Oliveira é daqueles que qualquer pessoa que se interessa por teatro deveria desejar ter um dia. O tempo voa em papo que começa sobre a cena, discute a crítica, política, as novas gerações dos palcos de BH, as escolhas estéticas feitas em cada uma das 17 montagens criadas ao longo dos 32 anos de carreira com o grupo de teatro Encena.
É justo a larga carreira que me leva ao encontro do professor e diretor de teatro no Café Khalua. Assim como eu, Wilsinho (como é chamado pela classe) também não é adepto a atrasos. Se me adiantei em 30 minutos do horário combinado, lá já estava ele antes de mim.
Na pequena agenda, os apontamentos de produção. Não dá para escapar disso. O grupo Encena, fundado por ele em 1984, completou 30 anos em 2014. Na época a ideia era fazer da estreia de Um interlúdio: a morte e a donzela o marco das três décadas de atuação. Quem atrapalhou foi mecanismo de incentivo à cultura brasileiro. Sem captação, a peça não saiu no tempo desejado. Mas saiu. Ainda bem que saiu.
Em cartaz no Teatro Marília até 30 de outubro, Um interlúdio…, é inspirado na obra do chileno Ariel Dorfman. Foi levado ao cinema por Roman Polanski em 1994, com Sigourney Weaver, Ben Kingsley e Stuart Wilson nos papéis principais.
Agora é a vez de Christiane Antuña, Gustavo Werneck e Nivaldo Pedrosa. Que trio! A força desse elenco e a qualidade de cada nuance que eles levam para a cena é o aspecto que, de imediato, chama atenção na montagem. É imperdível.
Um interlúdio… fala de violência, de machismo, de ditadura, de justiça – ou falta dela – arrependimento, vingança. Ou seja, temas nada suaves. A encenação é bastante limpa o que faz com que a força se concentre nas interpretações, obviamente sustentadas pela força do que é dito.
A peça não tem qualquer mirabolância. Usa o vídeo sem exagero ou alegoria. O mesmo vale para a iluminação e o cenário, sóbrio. É teatro de nível superior a muitos forasteiros que passeiam por nossas bandas.
O primeiro espetáculo do Encena foi A Lira dos 20 anos, texto político de Paulo César Coutinho. Wilson Oliveira era bancário, egresso do curso de teatro do Centro de Formação de Artes Cênicas e também da oficina de teatro organizada por Pedro Paulo Cava. Logo nas primeiras experiências profissionais, soube que o caminho seria a direção e a educação.
Trilha esse caminho desde os anos 80. Hoje é professor do curso de artes cênicas da Universidade Federal de Ouro Preto. A rotina faz com que o olhar dele esteja sempre ligado ao que as novas gerações produzem sem perder a admiração e o respeito pelos textos transformados em clássico pela força do tempo.
Para o diretor, uma característica dos jovens atores, dramaturgos e diretores é a ânsia por falar de seu universo. “Eles tem um desejo de deixar um depoimento de vida embora sejam jovens demais”, observa. Oliveira diz que pode-se, até, discutir a dramaturgia, mas são artistas que estão escrevendo a história a partir deles. É diferente de escolher um clássico, por exemplo.
A montagem de O beijo no asfalto do Encena, texto de Nelson Rodrigues dirigido por Wilson Oliveira em 1996, é até hoje considerado um marco na história do teatro mineiro. O espetáculo tinha no elenco Yara de Novaes, Luiz Arthur, Jorge Emil e outros. Assim como em Um interlúdio: a morte e a donzela, havia por parte do elenco e direção uma grande compreensão sobre intenções e nuances presentes no texto.
O teatro de Wilson Oliveira é realista, conectado com temas urbanos. Seja uma tragédia, uma comédia e mesmo um espetáculo infantil, o objetivo dele ao longo desses 32 anos continua o mesmo: entreter. “É a natureza da minha profissão. Acho que isso é o elogio ao ato cênico. Estamos no mundo para entreter e, se possível, fazer refletir.”
Um Interlúdio: A Morte e a Donzela
Teatro Marília. Av. Alfredo Balena, 586 – Centro – Belo Horizonte, Telefone: (31) 32774697.
Sexta e sábado 20h30, domingo 19h. Até 30/10/16. Ingressos: Inteira R$30 Meia R$15 Postos do Sinparc R$12. Duração: 90 minutos