Curadoria de informação sobre artes e espetáculos, por Carolina Braga

Fábio Jorge, um dos principais divulgadores da música francesa no Brasil

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No Dia da Festa Nacional Francesa, conheça mais sobre Fábio Jorge, que acaba de lançar um disco dedicado ao repertório de Charles Aznavour

Patrícia Cassese | Editora Assistente

A cultura francesa sempre esteve atrelada à vida do cantor paulistano Fábio Jorge, e por um motivo que diz respeito à própria ascendência: é que a mãe do artista nasceu naquele país. Mas o mais curioso de toda essa história é que, por ter migrado para o Brasil e se casado com um local, ela acabou deixando a ligação atávica com o seu país de origem em uma espécie de segundo plano. Foi, portanto, por mérito do avô que Fábio começou a se enfronhar no universo da chanson française.

Fábio Jorge, que dedica o novo disco à obra de Aznavour (Marco Máximo/Divulgação)
Fábio Jorge, que dedica o novo disco à obra de Aznavour (Marco Máximo/Divulgação)

De pronto, apaixonou-se por Edith Piaf (1915-1963), assim como por Charles Aznavour (1924 – 2018) e outros expoentes. Há cerca de 20 anos, Fábio decidiu assumir, profissionalmente, o ofício pelo qual sua alma já havia, de certo modo, optado há tempos: soltar a voz a serviço da música francesa. Deu tão certo que, agora, com vários títulos em sua discografia, ele lança mais um, dedicado a Aznavour.

Vive la France!

E foi justamente o disco o motivo da entrevista de Fábio Jorge ao Culturadoria, que está sendo publicada nesta sexta-feira, dia 14, não aleatoriamente. Afinal, a França, hoje, está em festa. Mais precisamente, a Festa Nacional Francesa, que lembra a Queda da Bastilha (14 de julho de 1789) e a Festa da Federação (14 de julho de 1790).

Embora a figura que mais tenha impactado Fábio Jorge seja Edith Piaf, o intérprete salienta que, naturalmente, esta não era a única voz que ecoava na casa do avô. “É claro que eu não ouvia só eu Piaf na casa dos meus avós. Eles também escutavam a grande expressão masculina da música francesa, Charles Aznavour. Evidentemente, outras vozes masculinas e femininas também (como Gilbert Bécaud ou Françoise Hardy), mas, se posso dizer assim, Aznavour foi um dos cantores franceses mais conhecidos, né? E no mundo inteiro. Teve uma carreira extremamente longeva. Morreu com 94 anos em plena atividade. Mais recentemente, um produtor, meu amigo, disse: ‘Olha, Fábio, você já não fez Piaf? Por que agora não faz Aznavour? E respondi: ‘Claro, mas não tenha dúvida’. Mesmo porque, ele merece'”.

Repertório

Assim, “Aznavour”, o disco, traz a voz de Fábio Jorge a serviço de músicas como “Que c’est Triste Venice” (Charles Aznavour/Françoise Dorin, 1964), “Hier Encore” (Charles Aznavour, 1964), “She” (1974), “La Bohème” (Charles Aznavour e Jacques Plante, 1965), “Comme ils Disent” (Charles Aznavour, 1972) ou “Tous les Visages de L’amour” (Herbert Kretzmere e Giorgio Calabrese, 1974).

Ele conta que, para o processo de seleção de repertório, mesmo conhecendo o repertório de Aznavour praticamente de cor e salteado, quis estudar mais um pouquinho. “Escolhi gravar tanto canções conhecidas como outras não tão óbvias, porque são músicas que me dizem muito. Mesmo porque, não tenho obrigação, enquanto artista, de gravar só sucessos. Imagina, um cantor que ficou 70 anos em atividade, tem uma obra imensa. E eu só podia escolher o quê? 12, no máximo 14 canções, do contrário, ficaria um disco cansativo”.

Embaixador informal

Curiosamente, Fábio Jorge já apresentou o repertório em Minas, mas não em Belo Horizonte. “Aliás, infelizmente, ainda não cantei em BH, embora tenha um pessoal aí que gosta bastante do meu trabalho. Digo que tenho a impressão de que o dia que pisar aí, para um show, vou ter bastante público, aceitação”. Fábio se apresentou pela segunda vez em Conselheiro Lafaiete. “A primeira vez foi em 2018, e a segunda, agora, Fiz quatro noites, uma no Teatro Municipal e as demais, em um bistrô muito bacana, um lugar bem cultural”.

No cômputo geral, Fábio diz que nunca imaginou que iria se tornar uma espécie de representante da música francesa no Brasil. “Há 20 anos, eu dizia: ‘Quem é que vai querer me ouvir cantando em francês? E estava enganado. Hoje, estou quase completando duas décadas de música francesa no Brasil”, orgulha-se. Confira, a seguir, outros trechos da entrevista, por tópicos.

Contato com a cultura francesa

Eu sou filho de mãe francesa, mas o meu aprendizado do idioma e a música são coisas um pouco diferentes. O aprendizado do idioma não aconteceu dentro da casa dos meus pais. Minha tia, que veio para o Brasil junto com a minha mãe, acabou se casando, aqui, com um francês – e, incrivelmente, por acaso. Mas a minha mãe, não. Então, com o passar dos anos, ela não quis mais falar francês, achou que seria mais interessante falar em português, já que o marido era brasileiro e os filhos, nascidos aqui. Assim, o meu aprendizado de língua francesa começou a acontecer ouvindo música. Meu avô tinha um sítio. Na infância, os adultos ficavam no terraço e a gente, na sala, ouvindo muita música francesa. E eu ficava grudado na caixa de som. Me interessava muito mais ouvir a música do que ficar no terraço com os mais velhos.

O idioma

Fábio ressalta que a mãe nunca foi de cantar em casa e nem de falar o francês. Aos 12 anos, ele entrou para uma nova escola, de freiras, para fazer a 6ª série. “Lá, o ensino do francês era obrigatório. Assim, comecei a aprender o idioma atrasado – quem tinha começado na escola na 5ª série já tinha a base do primeiro ano de francês, e eu não”.

Paixão por Piaf

Na primeira prova, Fábio tirou uma nota muito ruim. “Cheguei em casa e falei: ‘Mãe, me socorre que tirei 3 e meio. Aí, ela sentou e foi me ensinando os verbos, que, pra mim, era a coisa mais difícil. Conclusão: na segunda prova, tirei 8 e meio. E me apaixonei pelo idioma francês. Deixei de tirar notas baixas para tirar notas muito altas, ganhar medalhas. E, assim, não só a língua, mas a música. Eu ouvia muito Edith Piaf em casa e fiquei apaixonado por ela, foi a grande cantora que me arrebatou. Aquela dramaticidade”.

Daí, Fábio Jorge, com 14 anos, pediu ao pai que o levasse para ver Bibi Ferreira cantando Piaf. “Saí encantadíssimo, mais do que já era. E, a partir daí, comecei a comprar LPs dele. Meu pai me levou para comprar o primeiro disco da Piaf que tive. Fui colecionando até que concluí toda a discografia de tudo que ela gravou. Viajei, importei. Mas, claro, não ouvia só a Piaf, mas a música francesa como um todo. No entanto, Piaf sempre em primeiro lugar”.

O início

Acontece que, na Faculdade de Letras, que Fábio cursava, havia um evento no qual os alunos eram desafiados a apresentar um número, que podia ser de teatro, música, poesia… “Escolhi fazer uma homenagem a Piaf. E foi um sucesso”. Certo dia, um amigo, futuro produtor, resolveu lançá-lo como cantor – isso, em 2004. Uma apresentação inicial, em São Paulo, fez Fábio entender o que era um show. “Eu levei a sério, entendeu? Para mim, não era uma brincadeira, aquilo. Eu tinha que fazer direito”.

Depois se seguiram alguns shows de teatro. “Mas um diretor de teatro, que era nosso amigo, percebeu que, quando eu cantava em francês, as pessoas vibravam muito. Porque, segundo ele, eu tinha alguma coisa na interpretação que se diferenciava. Era uma coisa mais forte, que vinha mais de dentro. Aquela coisa mais da alma. E daí me propuseram uma temporada de música francesa na Praça Roosevelt, com o título “Sob o Céu de Paris”. Eu falei: ‘Gente, vocês estão malucos. Quem é que vai querer me escutar cantando música francesa?’ E eu estava enganado, porque todas as noites lotava. Claro, era um espaço pequeno, mas, mesmo assim, as pessoas iam para me ver cantar a música francesa”.

Primeiro disco

O passo seguinte foi o primeiro disco, “Chanson Française”. “E ele fez um barulho. As pessoas quiseram saber quem era aquele garoto – bem, na verdade, não era bem garoto, já tinha 38 anos, imagina. Aquilo chamou atenção dos jornalistas na época, inclusive aí, em Minas. Depois veio o “Chanson” 2, com participação da Cida Moreira, do Cauby Peixoto e de outros artistas, como Silvia Maria e o pianista João Carlos Assis Brasil. Com ele, fui indicado ao Prêmio da Música na categoria disco de música internacional, mas, infelizmente, perdi. Fato é que estou no sexto disco”.

A capa do disco físico de Fábio Jorge, que traz uma colagem de Gustavo Gontijo

Em tempo: Fábio Jorge faz questão de lançar o CD físico. “Eu ainda sou amante da mídia física”. Já em termos de show, ele se apresenta em agosto em São Paulo e, na sequência, no Rio. Perguntado sobre o que tem ouvido de música francesa contemporânea, ele se diz apaixonado por Calogero. “Que fiquei conhecido por indicação nos streamings”. E, ainda, ZAZ. “Canta divinamente, gosto bastante”.

“La Bohème”

Mas seu coração segue batendo forte por Piaf. “Nas redes sociais, há grupos que às vezes perguntam qual a música da Piaf que as pessoas que seguem mais gostam. E é muito difícil, porque a obra deles – dela, de Aznavour – é muito grande, e tem canções que, poxa… Optar só por uma música é muito complicado”.

No caso do Aznavour, se colocado contra a parede, Fábio ficaria com “La Bohème”, por ser, justifica, uma música que fala justamente de um tempo que não existe mais, saudosista. “A letra trata da dificuldade que os pintores que viviam em Montmartre à época (ele compôs a música nos anos 1960) passavam. Ficavam na Place du Tertre, querendo ter um nome, ser felizes, querendo se alimentar, porque era tudo muito difícil. Durante toda a música, ele fala da dificuldade de sobrevivência daqueles artistas. E sobre a saudade de um tempo que não existe mais”.

“Les Lilas”

Sendo assim, uma música que diz muito a Fábio. “A poesia, a forma como ele descreve as coisas, quando fala, ao final: ‘Le lilas sont morts’. A minha mãe não está mais aqui e era uma grande paixão da minha vida. Ela é um desses lilas”.

Para o artista, a música deve contar uma história. Assim, ter começo, meio e fim. “Sou uma pessoa extremamente apaixonada pelo teatro. E o teatro, claro, tem começo, meio e fim, assim como um filme. O roteiro, né? Então, quando eu vou fazer um disco, quando vou cantar uma música, tem que ter uma história, com começo, meio e fim. Essas canções, elas passam uma carga emotiva, uma carga de emoção ou uma história a ser contada, que têm uma importância muito grande para mim”, finaliza.

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