O Culturadoria conversou com os integrantes da banda Escadacima, que abriram o coração sobre passado, presente e futuro.
Por Caio Brandão | Repórter
Não é novidade para ninguém a quantidade de bandas que surgem em Belo Horizonte. Nesse sentido, o status de capital brasileira do rock não é dado à toa para BH. Os últimos anos foram simbólicos nesse processo, já que, nesse período, vários conjuntos de grande relevância para o rock nacional foram formados e projetados para todo o país, como Daparte e Lagum.
Sendo assim, as novas safras de bandas belo-horizontinas sempre surgem cercadas de expectativas, tendo em vista o legado que carregam. Um dos nomes da nova geração é a Escadacima, e o Culturadoria conversou com os integrantes João Pedro Zarife, Theo Vargas, Nina de Masi, João Viola e Xico Turrer para entender as dores e as glórias de ter uma banda em um cenário tão fértil. Confira!
Como se deu o processo de formação da Escadacima? Essa dinâmica afetou a construção da sonoridade de vocês?
João Pedro: Eu e o João Viola já tivemos uma banda, mas ela não estava dando muito certo e a gente acabou se desfazendo na pandemia. O Xico eu já conhecia, inclusive a gente já teve uma banda juntos também, aí eu juntei os dois com a intenção de ter um projeto mais duradouro. Já a Nina eu conheci em um vídeo no Instagram (risos). Ela é um pouco mais nova que a gente, mas estudava na mesma escola que eu frequentava.
Um conhecido que a gente tem em comum postou um vídeo dela tocando “R U Mine”, do Arctic Monkeys, e ali já dava para ver que ela tocava muito. Então, eu conversei com Xico e chamamos ela para a banda, do nada mesmo, e ela topou! (risos).
Nina: Eu sempre fui muito certinha, e eu nunca toparia tocar com uns meninos que eu nem conhecia direito (risos). Mas acabou dando alguma “louca” na minha cabeça, eu decidi que ia fazer isso sim, e acabou dando certo!
João Pedro: A gente já tinha uma baixista antes, a Júlia, mas ela foi morar nos Estados Unidos e deixou esse presente que é o Theo, que acabou substituindo ela. Ele já fazia os posters dos nossos shows, aí rolou esse match.
Xico: Foi até a Júlia que deu o nome da banda, né? O nome apareceu em um brainstorm que a gente fez em um grupo de WhatsApp mesmo depois que ela mandou uma lista gigante com um monte de sugestões. Mas, quando a gente viu “Escadacima” não teve jeito, a gente sabia que tinha que ser aquele.
Theo: Acho que, igual em qualquer outra banda, era um tanto de nome ruim e a gente escolheu o “menos pior” (risos). Sobre a sonoridade da Escadacima, é interessante por que ela foi se formando aos poucos, já que a gente passou muito tempo tocando covers. Então, foi um processo natural, a gente ia tocando e percebendo o que queria fazer.
Xico: É legal perceber isso porque somos muito diferentes um do outro, e nossas referências musicais também são assim. Acho que isso transparece nas nossas músicas, nós vamos unindo inspirações até chegar em algo que representa todo mundo.
Queria entender mais sobre a história de vocês com a música. Como vocês se apaixonaram por isso? Quais foram os primeiros artistas que comoveram vocês?
João Viola: Para mim foi Beatles, com certeza (risos). Eu sempre escutava eles o tempo inteiro em um iPod daqueles antigos, e isso, junto com as aulas de música que eu fazia quando era mais novo, me aproximaram demais da arte. Depois, ali pelos 13 anos de idade, comecei a ouvir muito Dream Theater e, mesmo que não tenha nada a ver com o que a gente faz hoje, eu viajava muito nas composições deles. Isso me estimulou demais a aprofundar meu conhecimento.
João Pedro: Quem me viciou em música no geral, na verdade, foi o pai do Xico (risos). Ele sempre trabalhou com música, então quando eu ia na casa dele sempre tinha algum vinil tocando, desde metal até jazz. Ele sempre falava que não existe gênero musical ruim, mas sim música boa e música ruim. Assim, meu gosto musical acabou sendo uma mistura do gosto dele, que era um “metaleiro” clássico, com o da minha mãe, que gostava demais de coisas tipo MPB, John Mayer e Coldplay, por exemplo.
Xico: O João Pedro já entregou tudo (risos). Como ele já falou, eu cresci num ambiente muito privilegiado em termos de acesso à música. Meu pai tinha muitos vinis, muitos CDs, sistemas de som muito bons. Eu tenho uma memória de infância muito viva de uma vez que eu pedi para o meu pai para conhecer Pink Floyd enquanto eu fazia dever de casa, ele colocou o “The Wall” para tocar. Aquilo abriu um buraco na minha cabeça, parei de fazer tudo que eu estava fazendo para ouvir o disco. Eu também convivia com vários artistas por causa do trabalho do meu pai, e isso abriu muito minha mente para explorar vários estilos musicais.
Nina: Minha família é da Bahia, aí eu cresci escutando axé, principalmente Banda Eva. Além disso, eu era a fã número um do Luan Santana (risos). Eu já tive uma festa de aniversário que foi um cover do Luan Santana, e o cara não tinha nada a ver com ele! Conforme eu fui ficando mais velha eu comecei a escutar mais coisas, tipo rock, etc. Hoje em dia eu gosto demais da MPB! Minha cantora favorita é a Elis Regina.
Theo: Eu cresci num ambiente muito musical também. Meu irmão é músico e o meu pai sempre mostrava muita coisa para nós quando éramos mais novos. Dessa forma, as primeiras bandas que eu gostei foram The Who, Pink Floyd, essas bandas de rock clássico. Acho que a minha primeira memória com música eu devia ter uns 5 ou 6 anos, e aí teve uma atividade na escola que cada aluno tinha que levar um CD que gostavam. Todo mundo levou CDs da Xuxa, de trilha sonora de desenhos, e eu levei o “Flashpoint”, que é um álbum ao vivo dos Rolling Stones (risos). Depois, comecei a gostar muito de punk e hardcore, e daí fui desbravando e descobrindo mais coisas.
Vocês referenciam várias coisas que, pelo menos à primeira vista, não tem nada a ver com música em si, como o desenho Phineas e Ferb e até o ET de Varginha. Como surgem essas ideias?
João Pedro: É um caos total, já que nós cinco somos muito diferentes um do outro, nossas referências estéticas são um pouco distantes. Então, esse processo acaba sendo muito aleatório, e isso é muito bom! Pode perguntar para qualquer um que já foi assistir nossos ensaios, nós somos caóticos (risos). Cada um tem uma “parada” nada a ver, e aí a gente vai dando ideias, e essas referências vão se juntando. Aí, corta para a gente no Campus da Guignard fazendo aquele ensaio do ET de Varginha (risos).
Theo: A ideia de referenciar Phineas e Ferb é meio que uma piada interna mesmo. Nós percebemos que a temática da música tinha a ver com a abertura desse desenho, já que na letra tem uma parte que fala “vem cá, eu tive um plano”, e isso tem muito a ver com a proposta do desenho (risos). Somos muito amigos, aí esse tipo de coisa acontece naturalmente.
João Viola: Eu nunca tinha parado para pensar nisso que você perguntou, mas acho que isso acontece porque a gente não se preocupa muito em fazer as coisas seguindo um modelo rígido. Estamos livres para brincar, pensar as coisas desse jeito mais lúdico, e isso contribui muito para essas referências.
Como é a atmosfera quando vocês estão no estúdio ensaiando e compondo? Vocês são mais metódicos ou deixam as coisas acontecerem com mais liberdade?
Theo: O João Viola é o cara pé no chão da banda. Uma vez a gente foi ensaiar sem ele, e simplesmente não tinha como fazer o ensaio (risos).
Nina: O João é mais focado mesmo, mais organizado. Só que o João Pedro parece uma criança de cinco anos (risos). Alguém entra no estúdio, ele olha. Passa um mosquito, ele olha. Enquanto a gente está conversando, ele vai e dá um grito no microfone. Então, os “Joãos” começam a discutir, o Xico fica rindo, eu fico pedindo para a gente ensaiar logo, e o Theo sempre tipo: “massa!”. Mas, no final das contas, sempre acaba dando certo!
Theo: O dono do estúdio que a gente ensaia sempre acha muito engraçado o tanto de gente que levamos lá. Sempre chamamos alguns amigos para assistir o ensaio, eles participam da coisa toda, é uma energia muito boa!
João Viola: O clima é sempre muito bom, mas claro que também temos os momentos de seriedade, ainda mais agora que já estamos com quase dois anos de banda. É um rolê, a gente se diverte demais, mas também é o nosso trabalho.
Xico: Realmente, é uma mistura dos dois. A gente trabalha e também descontrai, todo mundo fica muito à vontade quando a gente ensaia, e isso é essencial. Sobre o processo de composição, é legal demais porque temos várias cabeças pensantes. Então, por exemplo, às vezes estou em casa, penso em um arranjo, uma letra, e já mando para o resto da banda, e o trabalho vai evoluindo.
Nina: Existe muita liberdade nesse processo. Estamos escrevendo uma música agora que foi uma ideia do Theo, mas ele não vira e fala “ah, eu quero a bateria desse jeito específico”, eu tenho total autonomia para fazer as linhas de bateria. Tem vezes que eu chego no estúdio com cinco versões diferentes de uma música e a gente decide juntos qual é a melhor. Isso é legal demais porque todo mundo participa do processo criativo.
Xico: Tem uma outra música que estamos fazendo agora, por exemplo, que do nada a Nina improvisou uma bateria meio de samba, meio de bossa nova, e o João começou a solar em cima, e ficou muito doido! Essa criação livre é ideal para nós.
Na sexta-feira vocês vão para o Mercado Distrital do Cruzeiro abrir o show da Daparte, que é uma das bandas que mais movimentam o rock nacional hoje. Como fica o coração em um contexto desses, ansioso ou mais tranquilo?
João Pedro: A ficha, para mim, só caiu essa semana, quando a gente estava com os caras da Daparte no Sonastério. Eu sempre falei com o João que ir para o Sonastrério já era uma coisa bizarra, um monte de gente gigante já gravou lá. Isso é muito louco!
Theo: É especial demais porque, igual eu tinha falado antes, a gente sempre toca covers, e a Daparte sempre esteve presente nas nossas setlists. Esse show também representa um momento de transição para a banda, já que vai ser a primeira vez que nosso set será composto, na maioria, de músicas autorais. Fazer isso, abrindo para a Daparte, é simbólico.
João Viola: Eu achei muito engraçado que, na real, eu estou muito tranquilo (risos). Esse show veio na hora certa, a gente está pronto para isso. Uns meses atrás, talvez a gente estaria apreensivo, mas agora a gente só fica feliz e satisfeito de chegar onde a gente chegou.
Nina: Acho que o João falou por ele, porque eu estou completamente biruta (risos). Meu cérebro só consegue pensar nisso a semana inteira, mas claro que não é uma ansiedade ruim, tem muita empolgação nesse sentimento também.
E os planos para o futuro? Tem algum spoiler que vocês poderiam dar para o Culturadoria?
Xico: A gente já tem uma música nova gravada, que chama “Homem Ao Mar”, que é aquela que eu tinha falado antes, que a Nina fez uma bateria que puxa muito do samba. Fora isso, já temos outra música engatilhada, que chama “Barquinho de Papel”. Mas, o nosso grande projeto para esse ano é lançar nosso EP em dezembro. Nós já temos as músicas, falta só gravar e negociar a distribuição.
Theo: Se tudo der certo, esse EP vai ser composto de cinco músicas inéditas. Então, ainda vai ter muita coisa nova esse ano!
Xico: Tudo isso que a gente está fazendo aponta para um plano maior, que é lançar um álbum ano que vem. Já estamos juntando várias ideias com isso na cabeça.
Show de abertura
A Escadacima fará o show de abertura para a Daparte na sexta-feira, dia 2 de junho, no Mercado Distrital do Cruzeiro. Os portões estarão abertos a partir das 20h, e os ingressos podem ser adquiridos pelo link.