Elon não acredita na morte é um daqueles filmes em que a curiosidade em ver era grande. Muito grande. Não porque estive no set, mas porque se trata do projeto mais robusto de Ricardo Alves Jr.
Sigo os passos dele na arte desde quando escrevia em parceria com Grace Passô o Senhora K, nos tempos em que ninguém sabia o que era um blog. Da faculdade de cinema em Buenos Aires, das investidas na direção teatral e a estreia como curtametragista.
Ter expectativa em relação a um filme pode ser muito nocivo. Mas a sensação é indescritível quando mesmo assim você consegue sair surpreendida da sala de cinema.
O longa sobre a peregrinação de um homem atrás da mulher desaparecida é positivamente incômodo. Daqueles que você sai da sala querendo falar sobre, entender mais. Desde aspectos técnicos, tipo a escolha das locações até mesmo compreender os abismos existenciais dos personagens.
Bom cinema é isso, deixa rabichos para você pensar.
Elon não acredita na morte elevou a tensão no Cine Tenda na Mostra de Cinema de Tiradentes. Embora seja o primeiro longa de Ricardo, o roteiro derivado de um premiado curta, há muita segurança no comando de cada cena.
O filme começa com um plano sequência dentro de uma fábrica de tecidos fechada. O silêncio dos personagens, o eco de cada passo, já instaura o clima dominante nos 75 minutos da projeção.
Parece durar mais. O tempo é dilatado mesmo. Pensado para incomodar. Foi inevitável não pensar em Samuel Beckett (1906-1989) e seu Esperando Godot.
Planos
Os planos com a câmera na mão são dominantes. É como se o espectador tivesse oportunidade de entrar naquele confuso labirinto mental do protagonista. Abrem-se e fecham-se muitas portas. Uma representação metafórica do quanto Elon é um homem perdido em si mesmo.
Elon não acredita na morte leva para a tela uma Belo Horizonte que poucos conhecem. A escolha das locações está em sintonia com a energia daquele personagem. Um homem degradado – talvez também degradante?
Ricardo Alves Jr escolheu o elenco de seu primeiro longa a partir das parcerias artísticas que estabeleceu ao longo de sua trajetória.
O que dizer sobre Rômulo Braga como Elon? Nada além do óbvio já reconhecido com o prêmio de melhor ator no Festival de Brasília. O mineiro tem trilhado um caminho consistente na composição de grandes personagens na carreira no cinema. O encontro com o Ricardo na tela sucede outra parceria marcante: a dobradinha ator / diretor no teatro com a adaptação de Sarabanda, de Ingmar Bergman (1918-2007).
Parcerias antigas também com Silvana Stein e Grace Passô. Encontros que misturam diálogos teatrais e cinematográficos. Os novatos da turma são Lourenço Mutarelli e Clara Chovaux.
Elon não acredita na morte será exibido na próxima semana no Festival Internacional de Rotterdam. Levará um Brasil sem clichê. Um cinema que não reinventa roda, mas busca sua originalidade.
Culturadoria viaja a convite da Mostra de Cinema de Tiradentes