Após a temporada em São Paulo, a capital mineira é a primeira parada da montagem que marca o retorno de Drica Moraes ao teatro
Patrícia Cassese | Editora Assistente
Pandemia, atuação em séries, novela… Fato é que, quando Drica Moraes se deu conta, já haviam se passado seis anos desde a última vez em que subiu aos palcos de teatro. “E eu sou um bicho de teatro! Comecei nos palcos aos 13 anos, no Tablado. Depois, fui sócia-fundadora da Cia. dos Atores, onde conheci e trabalhei com o Enrique Diaz. A gente fez muita peça junto ao longo de 25 anos – duas, três peças por ano – nesta companhia que ainda existe, que ainda é muito forte”. Assustada com o hiato na sua jornada pelas artes cênicas, Drica tratou de sair em busca de um bom texto para montar.
Daí surgiu “Férias”, que chega neste final de semana em BH (para duas sessões no Cine Theatro Brasil Vallourec), após temporada em São Paulo. Na comédia, Drica Moraes divide o palco com Fabio Assunção.
“H” e “M”
Com texto inédito de Jô Bilac e direção dos atores Enrique Diaz e Débora Lamm, a peça trata de um casal de meia idade – H e M – que ganham, dos filhos, uma viagem de navio pelo Caribe. De acordo com a sinopse, livres da rotina, os dois comportam-se como adolescentes. Desse modo, se amam por todo o navio como se não houvesse amanhã. Até que, flagrados pelas câmeras de segurança, são “gentilmente convidados” a se retirar da embarcação.
Daí, se veem em uma praia colombiana, onde são obrigados a dividir um apartamento com um casal de mochileiros. Detalhe: os dois – X e Y, também vividos por Drica e Fabio – vivem com a grana de um canal “caliente” na internet e transam com parceiros pescados em apps de relacionamento. Logo, X e Y tratam de provocar H e M, que, por seu turno, não querem dar o braço a torcer para a dupla de “millenials”.
O início
Como assinalado, a dramaturgia de “Férias” é inédita. No entanto, nos primórdios da empreitada, a ideia era outra. E Drica volta à gênese da montagem para contar. “Como eu não tinha patrocínio, naquele momento de escolha do texto a encenar, de imediato pensei em uma peça de elenco reduzido. De preferência, uma dupla – uma mulher e um homem ou duas mulheres”, rememora. Só que Drica pensava em remontar uma produção dos anos 1980 e 90. Para tal, chegou a se debruçar, em particular, sobre a obra de Mauro Rasi (1949 – 2013).
Vale lembrar que Drica Moraes foi a protagonista do (ótimo) filme “Pérola”, que adaptou a obra do saudoso dramaturgo para a telona (com o mineiro Leonardo Fernandes no papel de Rasi), sob a direção de Murilo Benício. Mas, neste percurso de pesquisa para a volta aos palcos, a atriz se deu conta de um sério entrave quanto às dramaturgias das décadas pensadas. “Tudo parecia precisar de muita adaptação, porque ou o elenco era muito numeroso ou as produções, complexas”.
Jô Bilac
Naquele momento, vale lembrar, a atriz já contava com o incentivo do produtor Sandro Chaim, que queria montar um espetáculo com ela justamente por ter visto (e se deliciado com) “Pérola”. Assim, Chaim passou a dividir com Drica o processo de garimpo em dramaturgias já existentes. No entanto, diante das barreiras que se impuseram (já citadas por ela), a atriz teve um lampejo: por que não convidar um autor nacional para escrever um texto inédito? “E de imediato pensei no Jô Bilac. Vejo ele como um dos maiores autores de teatro contemporâneo do país. Escreve de maneira muito peculiar, sempre com muita profundidade, com humor, numa medida muito precisa”.
Os novos 50
No primeiro contato, recorda Drica, Jô Bilac comentou que estava voltando de férias. E desabafou: “Deu tudo errado!”. “Ali, falei: pôxa, já temos um tema, um ponto de partida. E, assim, começamos a explorar a ideia de um casal, na faixa dos 50, que recebe dos filhos esse presente, que é uma viagem ao Caribe”. Portanto, durante a viagem, a dramaturgia se incumbe de apontar quem é aquele casal. “Isso foi muito conversado com o Jô. A gente queria fazer um casal moderno, o atual casal na faixa dos 50 anos, que não é mais aquilo de 20 anos atrás”.
A atriz se refere a tempos em que um casal nesta faixa, conhecida como “meia-idade”, era representado como um par “sem sexualidade, sem desejos, sem projetos, sem sonhos de futuro”. “Então, a gente pensou neste casal muito ativo, muito disposto, muito cheio de desejo. De desejo sexual, de diversão, de conexão com o mundo, consigo mesmo. Desejo de contato com o desconhecido. Então, a gente foi inventando esses dois personagens que batizamos de ‘H’ (de homem) e ‘M’ (de mulher). E, nesta aventura louca, eles vão se descobrindo e se redescobrindo, num texto que tem muito humor”.
Jogo teatral
Tal qual, prossegue Drica Moraes, de “muito jorro de pensamento, muito fluxo mental”. “Com questões relacionadas à passagem do tempo, à própria sexualidade, à relação com os filhos, com casamento… Ou seja, é um jogo muito divertido, teatral. E, na minha opinião, fala sobretudo do amor pelo teatro. Eu acho que, na verdade, ‘Férias’ é uma reconexão de dois atores com o teatro. Porque o jogo teatral é o mais bonito de se ver! É uma peça extremamente alegre, as pessoas realmente saem tocadas pela alegria do encontro e pelo ritual de teatro que acontece ali”.
Temporada em São Paulo
Ao Culturadoria, Drica Moraes conta que a temporada de “Férias” em São Paulo foi um sucesso tremendo. “A gente teve as melhores respostas possíveis, tanto no humor, no riso, quanto na reflexão.
Eu acho que o mais bonito é a leveza e a alegria com que o público termina o espetáculo”. De acordo com ela, trata-se de uma grande conversa (“honesta e sincera”) com o público sobre o estar vivo e em uma relação amorosa. “E o público nos acompanha o tempo todo, participa o tempo todo. E termina com um grande sentimento de gratidão, pela alegria com que são tocados”.
Numa análise mais ampla, ela entende que, de certa forma, “Férias” renova o olhar do público para o teatro. “No sentido de a peça ser um ritual de alegria mesmo. De êxtase. A gente tem momentos de puro gozo com a plateia. De risos e reflexão. Foi realmente uma explosão de alegria em São Paulo”. Drica não se furta a compartilhar um momento em específico. “Na história, tem um momento em que os personagens começam a criar personas. A M começa a mentir terrivelmente. E certo dia, da plateia, uma mulher falou: ‘Eu também, eu também’ (inventava personagens em viagens). Ao fim, ela explicou que sempre fingia ser outra pessoa em cada viagem. Achei muito divertido da parte dela, ter assumido isso. Sensacional”.
BH no radar
Quanto a começar a viajar pelo Brasil com “Férias” pela capital mineira, Drica explica. “BH estava no nosso radar por reconhecidamente ter um público extremamente comprometido com teatro. Aliás, com cultura, com arte. A gente sabe que é um público exigente, crítico, mas que gosta muito de gostar também”. Um outro fator corroborou com a escolha. “É Sudeste. Então, sendo uma peça sem patrocínio, como já falei, a gente teve que começar pelas cidades mais próximas a nós. E está sendo uma honra começar por BH”.
Serviço
“Férias” – Com Drica Moraes e Fabio Assunção
Quando. Dias 24 e 25 de agosto, sábado às 21h e domingo às 17h
Onde. Cine Theatro Brasil Vallourec (Av. Amazonas, 315, Centro/Praça Sete)
Quanto. Ingressos a partir de R$ 60 (meia entrada)
Vendas na bilheteria do teatro e no Eventim: https://www.eventim.com.br/artist/ferias/
Duração: 1h30
Classificação: 14 anos