Curadoria de informação sobre artes e espetáculos, por Carolina Braga

O que os filmes ‘Lady Bird: A hora de voar’ e ‘Me chame pelo seu nome’ têm em comum?

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O cinema tem andado muito tecnológico, né? Tanto que os cinco filmes com as maiores bilheterias no Brasil do ano de 2017 foram superproduções apoiadas em alguma medida nos efeitos especiais. São elas: Meu malvado favorito 3, Velozes e Furiosos 8, A bela e a fera, Liga da Justiça e Mulher-Maravilha. Os dados são da Ancine.

Incensados na temporada de prêmios Lady Bird: A hora de voar e Me chame pelo seu nome caminham em sentido oposto de todas essas produções. São filmes muito simples. Aí está o principal valor de cada um deles. Tem mais: são histórias que falam sobre as dores do tornar-se adulto, cada uma à sua maneira. São jornadas de crescimento.

Quem pensou que a resposta para a pergunta do título se resume ao ator Timothée Chalamet foi bem simplista. Sim, o rapaz está nos dois filmes “independentes” mais comentados da temporada. É apenas uma feliz coincidência.

 

 

Dores de amor

Me chame pelo seu nome é adaptação do livro homônimo de André Aciman. Um trabalho bem-sucedido do roteirista James Ivory e, claro, do diretor italiano Luca Guadagnino. Narra o amadurecimento afetivo/sexual do adolescente Elio (o surpreendente Timothée Chalamet). Ele tem 17 anos e passa as férias em algum lugar no norte da Itália, na casa do pai (Michael Stuhlbarg), um pesquisador de história da arte.

O professor tem o costume de receber ajudantes para as pesquisas acadêmicas. No verão de 1983 quem chega é o americano Oliver (Armie Hammer).  Moço bonito, mais velho que Elio, com postura e olhar sedutor que inquietam o adolescente.

Luca Guadagnino não tem pressa em desenvolver o jogo de sedução dos dois. É um filme lento. De anfitrião simpático, Elio passa pela fase da repulsa até se render à curiosidade de entender o que está sentindo por Oliver. Há equilíbrio entre os atores embora o trabalho de Chalamet chame mais atenção.

 

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Romance

Me chame pelo seu nome é um representante do gênero romance bem tradicional. Até a fotografia, meio em tons pasteis reforça escolhas estéticas comuns a produções que abusaram das paisagens italianas para contar histórias de amor entre homens e mulheres. O mesmo vale para a delicada trilha sonora de Sufjan Stevens.

É toda essa banalidade que faz bem a Me chame pelo seu nome. O longa trata com respeito e absoluta naturalidade o fato de um homem se interessar por outro. Eles se permitirem viver um romance sem que haja peso ou julgamento. O que normalmente é uma grande questão para os filmes que abordam relações homossexuais, não é para a criação de Guadagnino.

Os últimos 15 minutos de Me chame pelo seu nome são definidores e portanto pode-se falar muito pouco sobre. Está ali o motivo que tem colocado o filme na linha de frente na discussão da temporada de prêmios em 2018. Não chega a ser um spoiler, mas repare bem a fisionomia e a respiração do transformado Elio nos créditos finais. É uma cena bem bonita, daquelas que resumem tudo.

 

Dores da independência  

Já o conflito de Lady Bird: A Hora de Voar é outro. A descoberta no longa vencedor do Globo de Ouro na categoria Melhor comédia ou musical é diferente. É a inevitável e necessária separação entre mãe e filha. Quando elas são pessoas muito parecidas, com dificuldade de expressar afeto, costuma ser ainda mais difícil o corte deste cordão umbilical.

Os americanos chamam esse tipo de filme de “coming-of-age”, ou seja, sobre a chegada da idade.

Assim como em Me chame pelo seu nome, a diretora e roteirista Greta Gerwig (Frances Ha) também conta uma história de crescimento pessoal com muita simplicidade. Lady Bird (a ótima Saoirse Ronan) é uma adolescente comum (também de 17 anos) em Sacramento, cidade natal da cineasta, na Califórnia.

Como quase todas as jovens da idade dela, tem planos de se mudar para uma cidade grande, conseguir uma vaga em uma boa universidade e vive em embates com a mãe controladora (Laurie Metcalf), uma enfermeira arrimo de família.

O amor entre elas é tão grande que, muitas vezes, deixam as pequenas implicâncias cotidianas falar mais alto. Greta Gerwig insere uma cena que ilustra isso de maneira precisa. Lady Bird e a mãe vão escolher o vestido de formatura da jovem. Quase no mesmo segundo em que discutem, se divertem. E quando elas choram juntas ouvindo um audiolivro? Quer cumplicidade maior?

 

 

Nome fictício

Como é uma garota cheia de personalidade, escolheu se chamar Lady Bird e não se reconhece como Christine McPherson, o nome de registro. O que me pegou logo de início no filme foi a habilidade que a diretora teve em gerar empatia entre a protagonista e eu. Pode ser que não ocorra com todo mundo.

Você vai vendo o filme e aos poucos se dando conta de que em algum momento da sua vida viveu algo parecido ou viu algum amigo passar por aquilo. Essa dose de realidade só pode ser explicada pelo fato da roteirista ter incluído experiências pessoais na jornada de Lady Bird. E não fica forçado.

São mais que merecida todas as indicações que a jovem Saoirse Ronan acumula pelo papel. Aliás, como é bastante comum em filmes dirigidos por atores, o elenco de Lady Bird é impecável. Destaque para as coadjuvantes Laurie Metcalf como a mãe da protagonista e a melhor amiga interpretada por Beanie Feldstein.

Não é um roteiro com pontos de virada. É o carisma da protagonista que vai te carregando mais e mais para dentro da história. Uma menina intempestiva, corajosa, engraçada e que não mede esforços para correr atrás dos próprios sonhos.

 

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Aprovação

Lady Bird: A hora de voar ostenta o impressionante índice de 99% de aprovação pela crítica especializada na plataforma Rotten Tomatoes. Me chame pelo seu nome tem 96%. São ambas notas muito altas.

Sabendo disso é natural gerar expectativa. A surpresa vem quando você se dá conta que os “filmaços” da temporada são histórias simples, porém, muito bem contadas. O que isso significa? Que o banal anda fazendo falta ao à indústria do cinema.

 

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