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Teatro

Herança: celebração poética e ancestral de Maurício Tizumba

Herança. Foto: Pablo Bernardo

Herança. Foto: Pablo Bernardo

Com Maurício Tizumba, Sérgio Pererê, Júlia Tizumba e Rosa Moreira, Herança emociona e nos leva em uma viagem pela história da família de Tizumba e pela cultura afro-brasileira.

Por Carol Braga

Vou ao teatro para sentir o que senti depois de ver Herança, novo espetáculo da Cia Burlantins. A montagem celebra os 50 anos de carreira de Maurício Tizumba. O espetáculo me afeta em tantas dimensões que nem sei por onde começar. Mas, é básico dizer que o ponto de partida é a ancestralidade de um dos maiores mestres da cultura afro-mineira. É muito emocionante compartilhar dessa viagem com elenco formado por ele, Sérgio Pererê e Júlia Tizumba, com a luxuosa participação de Rosa Moreira, irmã de Tizumba.

A língua é uma das expressões mais fortes da identidade e da cultura de um povo. Por isso, é bastante simbólico que Herança se inicie daí. Com o palco ainda escuro, Pererê estuda o vocabulário bamum. Fala calmamente palavra por palavra. E, então, Júlia Tizumba nos transporta para Camarões, contando a história dos ancestrais da família. O reino do Bamum foi invadido por colonizadores franceses e o que sobrou foi uma história de repressão, apropriação cultural e roubo. 

Dramaturgia

A abordagem adotada por Aline Vila Real, Grace Passô e Tomás Sarquis na construção da dramaturgia de Herança não apenas celebra a figura de Tizumba, mas também valoriza de maneira profunda e significativa a cultura afro-brasileira. Deste modo, a dramaturgia revela um cuidado especial e um comprometimento genuíno em preservar e enaltecer essa herança cultural tão importante e, lamentavelmente, tão negligenciada em nossa sociedade.

Deste modo, ao mesmo tempo em que é extremamente reverente ao passado, na cena, Herança é contemporâneo. Obra de Grace Passô que, com muito respeito, consegue transportar Tizumba de um lugar conhecido, para um outro de muita intimidade e história. E amor, claro! Para fazer isso, explora elementos e expressões que o acompanham ao longo da carreira: a música (todas compostas para o espetáculo), instrumentos africanos, a religiosidade e até o humor.

Foto: Pablo Bernardo

Parceiros

É muito significativo que Sérgio Pererê e Julia Tizumba estejam ao lado de Maurício Tizumba em Herança. Como parceiros de longa data, Pererê e Tizumba compartilham o interesse pela pesquisa e valorização da música afro-mineira, o que se reflete na qualidade da apresentação.

Por sua vez, Júlia Tizumba é uma presença marcante na encenação. Além de ser filha de Maurício Tizumba, ela é uma artista completa, capaz de interpretar, tocar e cantar de forma impressionante. A performance é uma verdadeira homenagem à herança cultural afro-brasileira e ao legado em permanente construção pelo pai.

Assim, a cada ato, o trio nos conta a história de um familiar. Tem os avós, os tios e os pais. Entremeados a cada uma, as histórias do próprio Tizumba. Ou seja, a estreia no show de calouros, admiração pelos discos do tio, o canto de Elza Soares e muitos outros. Os relatos de memória dos familiares são tão afetivos que é impossível não se emocionar. Pela beleza da cena, pela força da música e pelo amor contido na memória.

Encenação

Uma das coisas que mais me marcou em Herança foi a forma como a encenação consegue transmitir a importância da preservação da cultura afro-brasileira. A partir das histórias pessoais e familiares do trio, entendemos a beleza da transmissão da cultura de geração em geração.

A cenografia de Herança, assinada por Alexandre Tavera, é simples, mas cheia de simbolismo. É composta por objetos de família. A iluminação, de Edmar Pinto, é precisa em criar ambientes e climas diversos. A encenação utiliza elementos visuais como fotografias e vídeos projetados para criar um ambiente de imersão na cultura afro-brasileira. A habilidade de Grace Passô em unir todas essas expressões artísticas de forma coesa e harmoniosa é impressionante. Assim, contribui para a força e a beleza do espetáculo.

Em resumo: Herança é um espetáculo emocionante e necessário, que celebra a vida e a obra de Maurício Tizumba de maneira poética e contemporânea. A montagem mostra como as artes cênicas podem ser utilizadas para a valorização e preservação da cultura afro-brasileira. Viva o teatro! Viva Tizumba!

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