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Agenda Cultural

Curta-metragem “Um Ano” relembra ataque sofrido pela cantora Coral em 2023

A cantora Coral, cuja superação a uma agressão virou tema de um filme (frame)

“Um Ano”, de Pri Garcia, segue a cantora Coral durante um ano, de um Carnaval a outro, após um episódio trágico e revoltante

Patrícia Cassese | Editora Assistente

Carnaval de 2023. Ao passar por um dos cartões-postais da capital mineira, o Viaduto de Santa Tereza, a cantora Coral é esfaqueada e espancada por dez homens. O episódio – mais um entre tantos comprobatórios da violência que paira cotidianamente sobre mulheres trans e travestis – embasa o curta-metragem “Um Ano”, destaque na programação da 18ª CineBH. O filme, que leva a direção de Pri Garcia, será exibido nesta quinta-feira, 26 de setembro de 2024, dentro da mostra A Cidade em Movimento. O título também dá um indicativo do viés abordado na narrativa. Assim, mostra Coral no Carnaval de 2024, um ano após a agressão, aclamada durante o cortejo do bloco Então, Brilha!. Como uma fênix.

Em entrevista ao Culturadoria, Coral falou sobre como essa história – revoltante, trágica, absurda – acabou sendo levada às telas. “Para além da urgência de dar uma resposta à violência que sofri, a vontade de dizer alguma coisa ? porque de fato a justiça não é imediata no nosso país ?, é um filme com uma provocação quase que educativa”, aponta. E complementa: “Eu acho que a questão da transexualidade, com todas as violências que nós sofremos, passa por um lugar de falta de informação. Portanto, entendo que o intuito, para além de dar uma resposta ao que aconteceu, é educar mesmo. Fazer com que as pessoas reflitam a respeito dessa violência que esse grupo passa diariamente”.

Paralelo

O filme, prossegue a cantora, é todo em primeira pessoa. “Ou seja, sou eu contando o que aconteceu comigo na noite de Carnaval em que eu fui violentada. Paralelamente, imagens minhas no Carnaval de 2024. Então, o filme é esse paralelo. E sim, tem alguns materiais do dia da violência que eu sofri ? áudios, fotografias ?, mas é uma costura entre os dois dias”, pontua Coral.

Sequelas

Naquele Carnaval de 2023, Coral só conseguiu atendimento médico horas após a violência. “Demorou um pouco para conseguir ser atendida”, recorda ela, que, ao ser liberada para voltar para casa, ficou reclusa durante um mês. “Primeiramente, foram duas semanas para me recuperar e depois, para conseguir sair minimamente de casa. Ou seja, um mês depois do que aconteceu. Eu recebi pontos na perna e tratei vários machucados, porque recebi muitos chutes e pontapés na cabeça, no braço, na barriga. Em várias regiões do corpo, eu fiquei arroxeada”.

As marcas físicas foram sumindo com o tempo. No entanto, a violência psicológica, óbvio, deixou sequelas. “Essa é muito mais profunda”, compartilha ela, acrescentando que os agressores não foram identificados. No entanto, Coral entende que a culpa não é das pessoas que cometeram a violência. “Acho que vem de um lugar muito maior. Essa agressão física é só a ponta do iceberg. A violência que vem antes dela é que a sustenta e que a legitima”, lamenta a cantora, que, vale dizer, foi uma das atrações da noite de abertura da 18ª da CineBH. No palco do Cine Theatro Brasil Vallourec, Coral foi ovacionada.

Fênix

Perguntada sobre a sensação que a invadiu ali, ao se ver no alto do Trio Elétrico, no Carnaval de 2024, um ano após a agressão, a cantora, que nasceu na Bahia, mas está radicada em BH já há um tempo, relata que uma certa tensão foi, claro, inevitável. “Bom, primeiro que o Então, Brilha! é um bloco gigantesco, muito bonito. Assim, eu estava muito nervosa, porque eram muitas pessoas. Mas eu acho que estava muito presente, sabe? Eu fui tentando me nutrir daquela energia de Carnaval mesmo. Ou seja, de ficar alegre, tentando receber o que o Carnaval tem para dar”.

Coral, em cena do curta-metragem dirigido por Pri Garcia (Frame)

Coral acrescenta que, em alguns momentos, quando estava em cima do trio, olhava para as pessoas e se questionava: ‘Poxa, ali, embaixo, pode ter alguém como eu. E pode estar acontecendo alguma coisa parecida com o que aconteceu comigo”. E prossegue: “Mas eu estava ali em cima. Então, dizia: ‘Eu tô segura, né? Tá tudo bem’. Só que não, né? Na verdade, nós não estamos seguras em nenhum lugar. Nem em cima do trio, nem embaixo do trio, nem no mercado, nem nas nossas casas, nem de frente para o espelho. A sensação de perigo para quem é uma pessoa dissidente é muito constante, acredito. Mas, naquele dia, eu estava tentando ser carnavalesca mesmo”.

Sobretudo, acrescenta Coral, estava tentando focar na missão de fazer um Carnaval bonito para as pessoas que estavam ali, ávidas para vê-la e escutá-la. “E para mim mesma também”, assinala.

“Um Ano” – Ficha técnica

Direção: Pri Garcia

Produção: Camila Mello

Roteiro: Coral e Camila Mello

Direção de fotografia: Pri Garcia

Montagem: Vinícius Martins

Desenho de som: QUALQ

Fotografias still: Pri Garcia

Design gráfico: Bernardo Winitskowski

Vozes: Sheila Sampaio, Roberto Sampaio, Coral

Música: “Quimera” (composição Coral)

Gravado no bloco Então, Brilha! (BH) e no Tiatru Dell’Arte (Betim) entre fevereiro e abril de 2024.

Serviço

Exibição de “Um Ano” no CineBH

Quando. Nesta quinta, 26 de setembro, às 19h

Onde. Teatro de Câmara | Cine Theatro Brasil – Praça Sete, s/nº

Quanto. Entrada gratuita, com retirada de ingressos 60 minutos antes da sessão, na própria bilheteria.

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