O Filhas de Clara desfila neste domingo, dia 18 de fevereiro, na avenida Clara Nunes, no bairro Renascença
Patrícia Cassese | Editora Assistente
No Carnaval estendido – aquele, para o qual a quarta-feira de Cinzas não é vista como o fecho da folia -, um dos destaques da cena belo-horizontina promete atrair muita gente no cortejo com um chamariz e tanto: o canto da guerreira Clara Nunes (1942-1983). O bloco, quem acompanha a cena foliã da capital mineira sabe, é o Filhas de Clara. Neste 2024, o desfile acontece neste domingo, dia 18, com concentração a partir das 13h30. O início do cortejo está programado para as 14h30. O endereço nem poderia ser outro: na avenida Clara Nunes, 88, no Renascença.
Flautista e diretora musical do Filhas de Clara, Marcela Nunes volta ao início de tudo para lembrar que o bloco nasceu de um desejo da cantora Aline Calixto, “grande defensora do trabalho da Clara”. “Foi ela que idealizou tudo, que gestou tudo. A Aline já tinha essa vontade de prestar uma homenagem a Clara Nunes através de um bloco. A partir daí, foi convidando musicistas da cena local. Assim, o bloco nasceu já numa formação de contar somente com mulheres, tanto cantoras quanto instrumentistas”.
Composição
Atualmente, são dez musicistas, sendo três cantoras e sete instrumentistas. “Então, a gente tem as vozes da Aline Calixto, a Júlia Tizumba e a Tia Elza, que é uma cantora da Velha Guarda de Divinópolis que está com a gente desde o comecinho do bloco. A Júlia chegou ano passado”, conta Marcela Nunes.
O Filhas de Clara também tem Bia Nascimento tocando violão e Maria Elisa no cavaquinho. Já Marcela toca flauta e, como já assinalado, responde pela direção musical. Na percussão, são quatro musicistas: Analu Braga, Solange Caetano, Alcione Oliveira e Nanda Bento.
Admiração e respeito
“Falar o que a gente mais admira na Clara Nunes é difícil”, comenta Marcela Nunes à reportagem do Culturadoria. “A gente tem uma admiração completa por ela como artista, pela pessoa que foi, pela intérprete. Para além das questões técnicas, pois é fato que ela foi uma grande cantora, Clara foi uma artista de uma relação profunda com o Brasil”, enaltece. “Um Brasil que muitas vezes não é cantado. E, numa relação de alegria e de autenticidade muito forte, Clara cantou de forma potente músicas que celebravam a religiosidade dela e as culturas vindas da África”.
Como exemplo, o canto aos orixás. “O canto a tudo que era sagrado para ela. Assim, acho que isso talvez seja a característica mais forte no trabalho dela. A relação profunda, de forma artística, de forma completa, com tudo o que era mais sagrado para ela”, complementa Marcela.
Lado B
Perguntada sobre o repertório do Filhas de Clara, Marcela brinca: “Dá vontade de cantar tudo dela, né?”. A diretora musical ressalta que ainda há um “lado B” do cancioneiro de Clara Nunes que o bloco ainda não colocou na roda. “São músicas mais desconhecidas do grande público. Na verdade, a gente já vem fazendo esse trabalho de trazer algumas músicas da Clara pouco conhecidas desde o nosso primeiro cortejo. E é bom porque estamos percebendo que, ao longo dos anos, elas já estão se tornando conhecidas por quem vai aos nossos shows. Então, acho que esse é um trabalho super importante”.
Sucessos
Quanto às que mais levantam o público, Marcelo diz perceber que “Conto de Areia” (Romildo Bastos/Toninho Nascimento) é uma bem forte, assim. “A gente até faz ela sempre no final dos shows, porque é uma música que as pessoas amam, muito conhecida. Já ‘Canto das Três Raças’ (Mauro Duarte e Paulo César Pinheiro) é uma música que toca fundo os corações, mexe profundamente com a gente. É uma que também o público gosta bastante”. (abaixo, a logo do Bloco)
O baião/forró “Feira de Mangaio” (Sivuca/Glorinha Gadêlha) – que, lembra Marcela, é uma música do repertório de Clara Nunes bastante conhecida também, ainda que saindo um pouco da linha do samba – é outra que faz a festa no cortejo. “Tem várias outras também que empolgam o público, mas acho que podemos ficar nessas três aí”. A única canção do Filhas de Clara que não faz parte do repertório da guerreira é “Um Ser de Luz”. A música foi composta após a morte da artista por João Nogueira, Mauro Duarte e Paulo César Pinheiro, que era o marido de Clara. Os versos dizem “O menino Deus chamou e ela foi pra cantar, para além do luar, onde moram as estrelas”.
Confira, a seguir, outros trechos da entrevista
Desfile
O cortejo acontece na Avenida Clara Nunes, na região onde a cantora trabalhou, ao chegar a Belo Horizonte. “Ela trabalhou em uma fábrica de tecidos”, pontua Marcela, acrescentando que o Bloco é super bem recebido no bairro. “A comunidade toda acolhe, sempre foram muito receptivos! Eu percebo moradores bastante contentes, bastante felizes. Penso que principalmente pela força da Clara, né? Ainda existem pessoas ali que se lembram dela com muito, muito carinho”.
Penetração nas novas gerações
Perguntada sobre a penetração do canto de Clara Nunes nas novas gerações, Marcela Nunes diz entender que o trabalho da mineira reverbera fortemente, tanto para os músicos que seguem tocando as composições que ficaram famosas na voz dela quanto para o público em geral. “Pessoas que ouvem, que reverenciam todo esse legado que ela deixou. E que, na verdade, é atemporal. Ele não tem época, é tão profundo e tão marcante, tão emocionante, que perpassa o tempo. Então, a Clara permanece viva, muito, muito viva”.
Prévia no Atrium da Liberdade
Na última segunda-feira, o Filha de Claras fez uma apresentação especial no Atrium da Liberdade, na Praça da Liberdade. “Foi muito bacana, foi um show bonito, com uma energia lá em cima. O público estava muito feliz! Assim, foi uma troca muito legal, muitos fãs de Clara Nunes. A gente se sentiu super feliz e honrada de estar lá, integrando aquela programação bonita com outros blocos que gostamos muito”.
Musicalmente, para o Filhas de Clara, também foi importante, afiança a instrumentista. “Foi uma espécie de entrada para o cortejo deste dia 18. Na verdade, a gente estava há algum tempo sem fazer shows. Assim, a apresentação da segunda de Carnaval acabou servindo para realizarmos os últimos ajustes, os últimos retoques musicais. Foi muito bacana também para a gente se sintonizar como grupo, como banda. Enfim, foi um show bonito, a gente ficou feliz”.
Projetos
O Filhas de Clara tem muitos planos para os próximos anos, antecipa a diretora musical do bloco. Marcela revela que um dos principais, pensando numa interação maior com o público, seria montar uma bateria composta por mulheres, para tocar junto as integrantes em alguns shows. “Isso já é uma prática de alguns blocos, e, na verdade, já é um pedido do público do Filhas de Clara, além de ser uma vontade da banda. Então, a gente tem esse plano de fazer nascer esse grupo, para que possa atuar com a gente em algumas apresentações. Que possa estar mais pertinho da gente ao longo do ano, não só no dia do desfile. Estar mais pertinho da gente atuando musicalmente também”.
Serviço
Bloco Filhas de Clara
Domingo, 18/2
Horário: 13h30 concentração | 14h30 saída
Concentração: Av. Clara Nunes, 88, Bairro Renascença
Mais informações pelo perfil do Filhas de Clara no Instagram