Curadoria de informação sobre artes e espetáculos, por Carolina Braga

Jornalista Bruno Mateus lança livro que mescla crônicas, poemas e autoficção

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“O Que Pesa Sobre Todos Nós”, de Bruno Mateus, tem edição da Ramalhete e lançamento na Casa de Jornalista

Patrícia Cassese | Editora Assistente

Nem teria como ter escapatória. Filho de jornalista, sobrinho de jornalista, irmão de jornalista, Bruno Mateus desde sempre esteve envolto no universo da escrita. “É algo que me rodeia desde sempre”, reconhece ele, que, neste sábado, dia 9 de novembro, a partir das 11h, coloca no mundo seu segundo livro “O Que Pesa Sobre Todos Nós” (Editora Ramalhete), que mescla crônicas, poemas e autoficção. O lançamento, vale dizer, será na Casa de Jornalista. O material de divulgação da obra sinaliza: “ao longo de quase 80 páginas, o autor joga com o que é real e o que é invenção. Entre o que é verdade e fantasia, Bruno Mateus fica com um e outro”.

Tenho a impressão de que ele foi se construindo, se desenhando", diz Bruno Mateus (Paula Salerno/Divulgação)

Em conversa com o Culturadoria, Bruno Mateus, 41, falou sobre o ensejo de reunir textos de variadas vertentes no livro. “Há uns dois ou três anos, minha irmã Maíra, jornalista e poeta, disse uma coisa que ficou na minha cabeça. ‘Precisamos publicar o que escrevemos, precisamos tirar os textos da gaveta’. Comecei a pensar nisso, a pensar, a pensar… Até que, no início deste ano, comecei a reunir alguns textos, revisar, editar. Ter uma outra leitura deles. E, assim, senti certa urgência em publicá-los, como que para fechar um ciclo, um período de produção”.

Olhar do cronista

A mudança de emprego – a saída da redação de um grande jornal, do jornalismo cultural diário, para uma assessoria de comunicação institucional – de certa forma também motivou Bruno Mateus a avançar nesse projeto. “Como se eu afirmasse a mim mesmo que eu não posso – e não quero – me afastar da cultura, da escrita, do olhar do cronista para as coisas do mundo. A coisa deu certo, o Álvaro Gentil, editor da Ramalhete, topou a empreitada e aqui estamos com ‘O Que Pesa Sobre Todos Nós'”.

Perguntado sobre o que o norteou na escolha dos textos, Bruno responde que, como já estava pensando nesses textos há um bom tempo, o livro já estava praticamente desenhado na sua cabeça. Com título e tudo. Assim, o processo de seleção dos textos se deu, como ele aponta, de maneira muito natural. “Não houve um critério específico, embora, após reunir os textos, eu tenha percebido uma coerência entre eles. Uma coerência que abrange uma diversidade de temas e inspirações. Diria, talvez, que há uma coerência ideológica, de visão de mundo, de uma indignação diante das injustiças e também do deslumbramento diante do que é belo ou do que é maravilhosamente cotidiano”.

Do particular ao universal

No meio disso tudo, complementa o jornalista e escritor, há o seu olhar sobre as coisas, sobre o mundo. “Um olhar que se transformou ao longo dos anos, evidentemente, mas que ao mesmo tempo também conservou o que me mantém sensível e atento ao que me cerca”. Portanto, “O Que Pesa Sobre Todos Nós” é algo que nasce do particular, mas encontra o que é universal, nas palavras de Bruno.

“Assim, escrevo sobre aquilo que me revolta, me fascina, me alegra, me entristece, me angustia. Escrevo sobre aquilo que me enche o peito, me emociona e não posso guardar. Também escrevo para me livrar do que me incomoda, para expurgar, para libertar, para tirar das costas aquilo que pesa sobre todos nós”, explana. Se há um fio condutor a nortear os textos, diz ele, seria esse. “Todo mundo tem algum medo, alguma dor do passado, alguma saudade, alguma paixão arrebatadora, alguma revolta, alguma melancolia incurável”.

Tópicos

No caso, Bruno lamenta o assassinato de John Lennon, homenageia a filha, Amora, se vê trabalhador nos Estados Unidos dos anos 1950 ou se diverte no aniversário de Mick Jagger. Tal qual, dramatiza um desejo de amizade com o ator Humberto Carrão. Sim, a política, tema que sempre o interessou, também se faz presente. “Desse modo, esculacho Jair Bolsonaro, celebro a memória dos mortos e desaparecidos na ditadura cívico-militar brasileira (1964-1985), debocho de João Doria”, enumera.

Ao final, ele aponta haver muitos sentimentos ambíguos no livro, bem como muita ironia, sarcasmo. “Eu vou me equilibrando entre tudo isso e me permito transitar também entre o que é realidade, o que é pura ficção e o que é uma mescla do que é verdade e do que é ilusão, fantasia. Afinal, precisamos de um pouco de cada e de tudo para viver”, pondera Bruno Mateus.

Confira, a seguir, três textos que estão no livro, comentados pelo próprio autor.

“O que pesa sobre todos nós”

É o texto que dá título ao livro. Bruno Mateus lembra que, em outubro de 2011, caminhava pelo Centro de Porto Alegre, onde estava para ver o show de Eric Clapton. Ele se lembra que fazia um calor absurdo naquela tarde. “Parei em uma praça para tomar água e resolvi fumar um cigarro em um banco. Foi aí que chegou Fabrício e me pediu um cigarro. Fabrício, a esposa e duas filhas moravam em um albergue da prefeitura. Ele se sentou ao meu lado e começou a falar de uma terceira filha”.

Bruno conta que a garota tinha nove anos de idade quando Fabrício e a esposa perderam a guarda dela, que, um tempo depois, foi adotada por uma nova família. “Fabrício precisava contar aquilo para alguém. Naquele dia, fazia exatamente um ano que ele não via sua filha”. A história tocou o jornalista profundamente. “Fabrício sentia uma dor devastadora. Aquilo pesou sobre mim, e a história dele e de tantos outros Fabrícios é o que pesa sobre todos nós. Fiquei com aquilo na cabeça”. Desse modo, Bruno chegou ao hostel onde estava hospedado e rascunhou uma primeira versão do texto. Em BH, concluiu a crônica. “Sempre penso em Fabrício”, confessa.

“Vinte e um de março”

Bruno revela tratar-se do nascimento de Jair Messias Bolsonaro, pessoa pela qual, admite, não sente nenhum apreço – ao contrário. ” O poema saiu inspirado pela literatura de cordel. Eu nunca havia escrito um cordel, mas é engraçado porque, rigorosamente, não posso chamá-lo assim. É que há certas regras da literatura de cordel, como estrofes de seis versos, que você não vê nesse meu poema. Mas não importa. Eu curto a linguagem do cordel, aquele humor, a forma de escrever como se fala. Porque em ‘Vinte e um de março’ não é ‘gritou’, e, sim, ‘gritô'”.

O jornalista diz adorar efemérides, datas de aniversário. “E quando vi que Bolsonaro nasceu em 21 de março, resolvi que esse dia ficaria marcado. É um poema sobre o quão asqueroso esse sujeito é, e eu trato disso com humor. Tem ali uma sacanagem que eu gosto. Saiu num tiro, depois fui ajeitando palavras e algumas expressões”.

“Para Barbosa” e “Crônica de uma saudade”

Bruno Mateus também entende que não seria quem é hoje sem o time de seu coração, o Cruzeiro, e as arquibancadas do Mineirão. “O Cruzeiro é parte do que sou. Me deu amigos queridos. Sou um sujeito feliz por ter vivido tantas histórias naquele estádio, uma delas com meu saudoso tio Jairzinho, como conto em ‘Crônica de uma saudade'”. Já na fase adulta, ele visita o Bruno de 12 anos numa tarde de domingo no Mineirão. “Esse livro também é isso: um encontro com quem eu fui no passado”.

Já “Para Barbosa” fala da injustiça imposta ao goleiro da seleção brasileira derrotada pelo Uruguai na final da Copa de 1950, “diante de um incrédulo e choroso Maracanã”. “Barbosa foi culpado pelo revés e conviveu com esse peso durante 50 anos, até morrer em 2000. Eu me coloquei ao lado de Barbosa quando, em 1994, vi, em uma matéria na TV, que ele havia sido barrado no centro de treinamento da seleção brasileira”. Barbosa, lembra Bruno, estava ali para visitar os jogadores que se preparavam para a Copa. “No entanto, Zagallo e Parreira, cruéis, não permitiram a entrada do ex-goleiro, que, para a dupla, simbolizava derrota. Aquilo caiu como uma tonelada em minhas costas. O peso que jogaram em cima de Barbosa é, também, o que pesa sobre todos nós”.

Serviço

Lançamento de “O que pesa sobre todos nós” (Editora Ramalhete), de Bruno Mateus

Quando. Dia 9 de novembro (sábado), das 11h às 15h

Onde. Casa de Jornalista (Rua Álvares Cabral, 400 – Centro, BH)

Quanto. Entrada gratuita. O livro será vendido a R$ 50

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