Dona Margarida Pandolfo, mãe de Gustavo e Otávio, mostra seu talento no bordado na exposição “Assim Bordei Meus Sonhos”, em cartaz no CCBB BH
Patrícia Cassese | Editora Assistente
Em cartaz no CCBB BH, a exposição “Nossos Segredos”, que reconta a trajetória artística da dupla Gustavo e Otavio Pandolfo, está em vias de se despedir da capital mineira: o prazo final para conferir o percurso d’OSGEMEOS é o dia 22 deste mês. Quem passa com frequência pelas imediações da Praça da Liberdade, onde o equipamento fica localizado, certamente já se deparou com as longas filas que volta e meia se formam para visitar a iniciativa.
Mas não são só as obras dos talentosos irmãos que vêm chamando a atenção do público que adentra a edificação. Assim, à direita da entrada, uma exposição inédita vem encantando os visitantes e extraindo sorrisos. Trata-se de “Assim Bordei Meus Sonhos”, que flagra a maestria no bordado e em outras artes manuais da mãe de Gustavo e Otavio, a Dona Margarida Leda Kanciukaitis Pandolfo, 76 anos.
“Essa exposição veio na minha vida como um furacão, porque eu sempre fiz esse trabalho (de bordado) com a ideia de mostrar para um e para outro. Jamais imaginei ter uma exposição ao nível desta que os Gêmeos me levaram. Foi uma emoção muito forte”, assume Dona Margarida, acrescentando que, após o nascimento dos filhos, foi a experiência que mais mexeu com o seu coração. “Foi muito forte – na verdade, está sendo, porque ainda não acordei do susto”, conta ela.
Repleta de significados e transcendendo afeto e apuro, a exposição é, em primeiro lugar, imperdível. E, assim, como estamos às vésperas do Dia das Mães, o Culturadoria resolveu celebrar esta artesã que, além do talento no bordado, é pura simpatia.
Confira outros trechos do bate-papo
Pelo que li, a senhora aprendeu algumas técnicas artesanais ainda pequena, nas aulas de educação artística do ensino fundamental (a antiga escola primária), mas só voltou às agulhas de fato após a aposentadoria. Como foi aquele primeiro momento, o primeiro aprendizado, aquele primeiro encontro com as agulhas?
Foi na época do ginásio, especificamente. Eu estava com 10 anos. Naquele tempo, da quinta até a oitava série, a gente estudava artes e desenho. E eu já me apaixonei de cara por tudo o que eu aprendia, em termos de desenho, em termos de trabalhos de artes. E isso foi o começo. Ainda me lembro o nome da professora (de educação artística), Helena Bruna Rossi Pena. Ela nos ensinou um pouco de cada coisa, em termos de costura, de bordado, de tricô, de crochê. Tudo. Aprendi tudo.
Depois, até se aposentar, a senhora realmente não tinha voltado mais a esses ofícios? Foi por falta de tempo mesmo?
Intimamente, eu sempre tive vontade de fazer alguma coisa, mas, devido à vida corrida da gente, a criação de filhos e tudo, e fui deixando essa vontade de fazer “alguma coisa” pra frente. Até que, quando fiz 61 anos, um curador Luiz Nogueira, veio até mim e perguntou se eu podia fazer um bordado em cima de um desenho dos Gêmeos. Isso eu nunca tinha feito e nem tinha ideia de por onde começar.
Mas aí foi feito e ele levou esse trabalho, do desenho dos Gêmeos e bordado meu, para Piracicaba, e depois ele foi exposto. Exatamente no dia do meu aniversário de 62 anos, outro curador me procurou, um português de nome Fernando. Ele me ligou dizendo que tinha gostado do meu bordado. E me convidou para expor na Lituânia. Assim, acabei conhecendo a terra do meus antepassados. Na sequência, passei a bordar as obras que os Gêmeos desenhavam.
O que achou da Lituânia?
A Lituânia apareceu na minha vida assim, primeiramente, como uma casualidade muito bonita, porque tive a chance de conhecer a terra e o local onde meu pai nasceu. E parece que a gente, quando vai a um lugar assim, volta cheia de matéria, cheia de energia para passar isso para a tela. E é tão grande essa energia que parece que a gente, se for contar a vida inteira, não vaza toda ela. Sempre vai ficar um pouco. E a Lituânia foi o meu primeiro passo no exterior. Depois vieram outros países, né? Expus nos Estados Unidos, na Espanha (em Barcelona), na Holanda.
Aliás, falando sobre a família… Pelo que li também, parece que sua avó, Ana, também fazia bonito na tapeçaria…
Sim, isso mesmo. E, assim como ela, eu também comecei a fazer tapeçaria primeiramente com sacos de mantimentos. Não me lembro o saco que ela usava, devia ser de trigo ou de milho. No meu, eram sacos de batatas. Mas ela tinha outra técnica, ela usava uma espécie de agulha grande, e o ponto era muito diferente daquilo que faço. A linha dela era feita de retalhos de tecidos, que formavam umas tripinhas. E ela fazia inclusive os desenhos.
Qual a arte que a senhora mais domina, que mais gosta de trabalhar?
A que mais gosto de trabalhar é a arte do bordado. Não vou dizer, assim, que é uma arte que eu domino, porque, enquanto estou bordando, sempre fico imaginando o que eu vou fazer depois. Fico imaginando, idealizando o fundo, a cor, o tema. Ou muitas vezes primeiramente passo um tema para os meus filhos, eles desenham e eu bordo. Mas também faço meus trabalhos a partir da minha imaginação. Na exposição de BH, tem alguns que foram criados por mim. Agora, confesso que gosto de bordar sobretudo as coisas d’Osgemeos.
Que espaço a tapeçaria foi pouco a pouco ocupando em sua vida? E hoje, que espaço ocupa?
Um espaço muito grande. Não digo que total, porque a gente faz algumas outras coisas. No momento, estou com a ideia de fazer desenhos.
Como foi vir a BH e conferir a montagem da mostra?
Uma coisa legal de dizer é que estava todo mundo junto, né? A família toda trabalhando. E esse momento foi único na minha vida, porque eu estava na companhia do meus quatro filhos. Assim, mais junto comigo. E, no entorno da exposição, estavam nossos amigos, pessoas que me incentivaram, que ajudaram a que tudo isso chegasse nesse ponto que chegou. Nesse nível, a exposição. E o agrado do público de uma forma geral.
Eu amei a representação de um cachorro que aparece lá… Pode falar da história dele com a família?
É a Pink, a nossa mascotinha. Foi assim: um dos meus gêmeos achou ela na rua e trouxe para casa. E assim foi. Ela foi ficando, ficando… Quando os meninos sentavam para fazer desenho, ela ia para o colo deles, sabe? Quando viajavam, ficava muito sofrida de saudades. Eu precisava colocar uma peça de roupa deles para ela poder dormir, porque ela ficava com muita saudade. Ela foi muito especial e nos acompanhou em todos os momentos, primeiramente, a mim e aos gêmeos. Depois, mais especificamente a mim, até o dia que se foi.
Qual o seu trabalho preferido entre os que estão na mostra?
Ah, todos eles. Tudo que faço e bordo, todas as obras têm, antes de tudo, uma história. Se um dia eu tivesse que falar de cada uma, lembraria de cada coisa que aconteceu no momento em que eu bordei, e, assim, o que se passava no meu interior que eu estava passando, pelo bordado, para o exterior.
Agora, lá tem bordado que fiz com saco, desenho que eu já fiz com a tela, pintura com tela e tem os primeiros que fiz a partir da minha própria inspiração. E o último que bordei também está lá.
Como a senhora se definiria? Que características listaria como as que mais traduzem a sua personalidade?
Eu me defino, no caso, como a maior espectadora do meus filhos, porque eu sempre gostei de ver uma obra começar e observar até o momento que ela chega no fim. Eu vejo o nascimento e até a hora de ele (trabalho) ir para exposição. A minha característica maior em termos de arte é a persistência.
Uma curiosidade: a senhora comercializa as obras?
Eu faço meus desenhos sempre com a melhor intenção possível, de passar a minha inspiração, como uma alegria para os olhos de quem vê. Acontece que eu não faço com a intenção de comércio, de quanto eu vou ganhar. Não penso nisso, mas se houver alguma oportunidade, eu posso pensar.
Como é a sua relação com os filhos artistas, sendo também uma artista?
A relação com meus filhos é, assim, a melhor possível. Uma relação de amor e carinho, de atenção, de expectativas e de incentivo ao que cada um faz – eu do trabalho deles, eles do meu. Eu sempre comento isso, quando tenho oportunidade. Falo sempre isso, que meus filhos, eles deixaram nascer essa parte que havia dentro de mim. Então, brinco que eles saíram de mim, mas que em termos de arte, eu saí deles.
Serviço
OSGEMEOS: Nossos Segredos e “Assim Bordei Meus Sonhos”
CCBB BH (Praça da Liberdade, 450)
Até 22 de maio, de quarta a segunda, das 10 às 21h30
Entrada gratuita, mediante retirada de ingressos.