Espetáculo
Espetáculo do Oficinão 2023, Bagunça é uma grande homenagem ao Brasil e testemunho da força da diversidade
por Carol Braga | Editora

Isso não é uma crítica. Talvez seja um compilado de impressões sobre Bagunça. Ou seja, um texto-bagunça. Isso porque a vontade de registrar algo aqui é maior do que a busca por seguir qualquer manual do formato crítica de teatro. Mesmo porque, nem acho que caberia qualquer formalidade para falar de uma montagem que parece tão orgânica e, claro, fora dos padrões.
A montagem do Oficinão do Galpão Cine Horto em 2023, dirigida por Marina Viana, é um testemunho vibrante da diversidade e da autenticidade do Brasil. O espetáculo fez temporada até o dia 15 de outubro e já estamos na torcida para que volte em breve.
Identidade
A peça, originalmente concebida para “falar sobre música brasileira”, transcende as expectativas convencionais. Assim, em vez de se prender a um único gênero ou período musical, “Bagunça” celebra a riqueza da diversidade de pessoas e sonoridades. A busca por um artefato do passado, a Juca Caixa, uma Jukebox ancestral, serve como uma metáfora interessante para explorar a música como uma ferramenta que pode desvendar nossa identidade cultural.
O elenco composto por 22 artistas – com existências e corpos diversos – tem coragem suficiente para se entregar à experimentação teatral mesclando humor e ironia. O repertório apresenta músicas de uma infinidade de gêneros musicais brasileiros, costurando as letras como parte integral da dramaturgia. Cada canção é como um fio condutor, conectando-se com as narrativas e personagens. É inevitável não citar a paródia do Xou da Xuxa como ponto alto da montagem. É para ver e rever.
Liberdade
Como o próprio nome já diz, a produção é avessa a regras. Sendo assim, o espetáculo não se limita a oferecer uma experiência de observação passiva para o espectador. Em vez disso, chama o público a participar de um cortejo caótico por ruas e estabelecimentos da Zona Leste de Belo Horizonte. Nem sempre é possível ver ou ouvir tudo de uma só vez. Ou seja, a bagunça também se estende ao modo como vemos o espetáculo. E aqui cabe um adendo: são quase 3 horas de peça, talvez caiba uma pequena edição.
Enquanto alguns espectadores podem se sentir desafiados pela falta de uma narrativa linear e de um único ponto focal, outros podem encontrar uma beleza na liberdade de escolher para onde direciona a atenção a cada momento. A experiência de assistir “Bagunça” é como participar de uma festa onde a música está por toda parte, e a cada esquina – literalmente – há algo novo e empolgante para descobrir.

Descobertas
Essa abordagem interativa e imersiva convida o espectador a ser parte ativa da experiência, como se estivesse em uma jornada pela música e pela cultura brasileira. É uma quebra da norma que nos leva a abandonar a ideia de que o teatro deve seguir um caminho linear e previsível. Em vez disso, “Bagunça” nos desafia a explorar, a dançar, a interagir com os artistas e outros espectadores, criando uma sensação única de comunidade e descoberta.
Essa abordagem não convencional pode ser um divisor de águas para alguns espectadores, mas é precisamente o que torna “Bagunça” tão marcante.
Autenticidade
Em montagens com grande elenco, equilibrar a presença de todos os integrantes pode ser um desafio, mas “Bagunça” transforma esse desafio em uma oportunidade. Ao incorporar elementos de dança, performance e música em uma intervenção urbana, a produção permite que cada artista brilhe à própria maneira.
Outra característica que se destaca no elenco é a alegria expressa em cada rosto, que cria uma sensação de unidade entre os artistas. A coesão que emerge da diversidade é uma força poderosa. Essa união e coletividade, ou seja, um sentido de grupo, é um grande acerto, especialmente considerando as raízes do Grupo Galpão e, por extensão, do Galpão Cine Horto, que celebra 25 anos. O Oficinão, como projeto, tem a missão de fomentar o trabalho em grupo, e “Bagunça” é uma demonstração viva dessa missão cumprida.
Simbolismo
Além disso, a relação simbólica com a rua é outro aspecto fascinante que “Bagunça” recupera. Essa conexão com o ambiente urbano confere à peça uma dimensão adicional e também uma reverência à história do Galpão.
O espetáculo é uma prova viva de que quando diferentes vozes se unem em um coletivo, o resultado é uma obra de arte poderosa, que ecoa a alegria, a cultura e a diversidade do Brasil. É uma celebração não apenas do teatro, mas também da capacidade que todos nós temos de contribuir para algo maior quando abraçamos nossas diferenças.