Curadoria de informação sobre artes e espetáculos, por Carolina Braga

[PONTO DE VISTA] Duas reflexões sobre o tempo a partir de ‘Gata em telhado de zinco quente’

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Elenco da montagem de Gata em telhado de zinco quente, do Grupo Tapa. Foto: divulgação
Elenco da montagem de Gata em telhado de zinco quente, do Grupo Tapa. Foto: divulgação

Desde que saí da sessão de Gata em telhado de zinco quente, montagem do Grupo Tapa em cartaz até 28 de novembro no Centro Cultural Banco do Brasil, reflito sobre o tempo. Em dois aspectos. Como continua sendo critério para a definição do que é clássico e como nossa relação com ele, o tempo, já mudou – e muito – desde que Tennessee Williams (1911-1983) ganhou o Pulitzer por sua escrita, em 1955.

Na sinopse oficial, a peça conta a história de uma família rica que discute a herança a ser deixada pelo patriarca (Zécarlos Machado). A abordagem do tema antes da morte de Paizão, revela a hipocrisia capitalista. Algo que existiu, existe e existirá.

A trama nos é revelada pelo casamento falido de Maggie (Bárbara Paz) e Brick (Augusto Zacchi), um dos herdeiros. Completamente indiferente à mulher desde a morte do melhor amigo, Brick não faz a menor questão de sustentar a falsa relação. Se não há amor, tampouco existe tesão. Ela, por sua vez, quer a todo custo engravidar.

Elenco da montagem de Gata em telhado de zinco quente, do Grupo Tapa. Foto: divulgação

A montagem dirigida por Eduardo Tolentino tem duas horas de duração. Esse é o primeiro choque que tenho em relação ao tempo. É teatro clássico e talvez por isso, muito dilatado em relação às montagens de textos contemporâneos. A duração provocou incômodo. Me perguntei o porquê disso.

Se no primeiro ato o humor irônico transborda e revela como as questões abordadas por Tennessee continuam atuais, no decorrer da peça, elas ficam repetitivas e, assim, redundantes. A força do texto se diluí. Claro que esse é o ponto de vista de alguém que vive em 2016, um tempo marcado por velocidade e overdose de informações.

Vale lembrar que Gata em telhado de zinco quente foi escrito na década de 1950. Era, realmente, outro tempo até para compreender as coisas. Na mesma época, em 1958, ganhou badalada adaptação pra o cinema, com Elizabeth Taylor e Paul Newman.

A forma como o autor fala sobre hipocrisia familiar é tão atual assim como a maneira que aborda a “depressão” do personagem Brick. Por meio dele, Tennessee Williams fala sobre o auto preconceito, algo tão ou mais difícil de lidar do que o julgamento exterior. Ainda mais quando envolve sexualidade.

A conversa íntima entre Brick (Augusto Zacchi) e Paizão (Zécarlos Machado) é um dos momentos dramáticos mais interessantes da montagem. De maneira contida, tal como são os personagens, os atores conseguem demonstrar que onde existe amor também há lugar para compreensão.

Isso, no entanto, não esconde o desequilíbrio do elenco. Se Bárbara Paz, Noemi Marinho (como Mãezona) e Zécarlos Machado compreendem bem seus respectivos personagens e oferecem nuances em suas composições o restante do grupo não contribui tanto.

A montagem do Grupo Tapa ressalta a superficialidade das relações familiares e os interesses disfarçados por cada um. Em um primeiro momento certa “displicência” na forma como os personagens se tratam gera riso. É humor tenso. Aquela coisa, ‘estou rindo mas na verdade sei que a situação é deprimente’.

Como é uma família de amor artificial, o cenário de Ana Mara Abreu e Alexandre Toro; a iluminação de Nelson Ferreira e o desenho de som de Marcelo Pellegrini reforçam essa atmosfera. Se a interpretação é realista (assim como os figurinos de Glória Kalil) os demais elementos (principalmente o cenário) naturalistas provocam o contraste. Sugerem também o espelhamento com as relações contemporâneas.

Aqui entra a outra observação sobre o tempo. Como ainda funciona como “termômetro” eficaz quando vamos definir se uma peça é ou não um clássico. Nesse aspecto, a montagem do Grupo Tapa é muito elegante e sutil ao reforçar a atemporalidade do texto de Tennessee.

Gata em telhado de zinco quente
Até 28 de novembro de 2016. Centro Cultural Banco do Brasil BH(Praça da Liberdade, 450 – Funcionários, (31) 3431-9400). R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada) – Clientes BB tem 50% de desconto em até 02 ingressos.

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